sábado, 30 de julho de 2011

ATRITOS (Roberto Crema)


Ninguém muda ninguém;
ninguém muda sozinho;
nós mudamos nos encontros.

Simples, mas profundo, preciso.
É nos relacionamentos que nos transformamos.
Somos transformados a partir dos encontros,
desde que estejamos abertos e livres
para sermos impactados
pela idéia e sentimento do outro.

Você já viu a diferença que há entre as pedras
que estão na nascente de um rio,
e as pedras que estão em sua foz?

As pedras na nascente são toscas,
pontiagudas, cheias de arestas.

À medida que elas vão sendo carregadas
pelo rio sofrendo a ação da água
e se atritando com as outras pedras,
ao longo de muitos anos,
elas vão sendo polidas, desbastadas.

Assim também agem nossos contatos humanos.
Sem eles, a vida seria monótona, árida.
A observação mais importante é constatar
que não existem sentimentos, bons ou ruins,
sem a existência do outro, sem o seu contato.
Passar pela vida sem se permitir
um relacionamento próximo com o outro,
é não crescer, não evoluir, não se transformar.

É começar e terminar a existência
com uma forma tosca, pontiaguda, amorfa.
Quando olho para trás,
vejo que hoje carrego em meu ser
várias marcas de pessoas
extremamente importantes.

Pessoas que, no contato com elas,
me permitiram ir dando forma ao que sou,
eliminando arestas,
transformando-me em alguém melhor,
mais suave, mais harmônico, mais integrado.
Outras, sem dúvidas,
com suas ações e palavras
me criaram novas arestas,
que precisaram ser desbastadas

Já viu o tamanho do diamante polido, lapidado?
Sabemos quanto se tira
de excesso para chegar ao seu âmago.

Para chegarmos a esse âmago,
temos que nos permitir,
através dos relacionamentos,
ir desbastando todos os excessos
que nos impedem de usá-lo,
de fazê-lo brilhar

Por muito tempo em minha vida acreditei
que amar significava evitar sentimentos ruins.
Não entendia que ferir e ser ferido,
ter e provocar raiva,
ignorar e ser ignorado
faz parte da construção do aprendizado do amor.

Não compreendia que se aprende a amar
sentindo todos esses sentimentos contraditórios e...
os superando.
Ora, esse sentimentos simplesmente
não ocorrem se não houver envolvimento...

E envolvimento gera atrito.
Minha palavra final: ATRITE-SE!

Não existe outra forma de descobrir o amor.
E sem ele a vida não tem significado.


Sobre o autor: Psicólogo e antropólogo do Colégio Internacional dos Terapeutas (CIT), formação em diversas abordagens humanísticas e transpessoais, criador do enfoque da síntese transacional (quinta força em terapia), consultor em abordagem transdisciplinar holística e ecologia do Ser. Foi o coordenador geral do I Congresso Holístico Internacional (1987) e implementador da Formação Holística de Base, no Brasil (1989). Membro honorário da Associação Luso-Brasileira de Psicologia Transpessoal (ALUBRAT), Fellowship da Findhorn Foundation (Escócia), coordenador do CIT-Brasil e reitor da Rede UNIPAZ.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

É o Fim do Orkut?

Vocês se lembram quando tudo começou? o orkut tinha esse Formato:

Febre nacional a partir de 2004, o site de relacionamento que contagiou o Brasil está sofrendo uma queda brusca de popularidade. O rival facebook contemporâneo a ele, finalmente começa a deslanchar em 2011 e ganha a atenção dos internautas em todo o país. Contrário a isso, o orkut, luta para não se tornar obsoleto, atualmente o site nem de longe se compara com a popularidade que obteve principalmente em 2005, ano de seu apogeu, quando o canal orkutiano viabilizou na rede o encontro virtual de pessoas, gostos e idéias.
Estará o orkut fadado ao esquecimento?  Neste mundo onde tudo é efêmero, o orkut pode morrer, mas com certeza entrará para a história como o pioneiro de sites neste gênero. 
Não está longe o tempo em que o seguinte bordão será freqüente entre as pessoas quando elas quiserem se referir ao passado. “Você é do tempo do Orkut?”

Pois é gente, nesta vida tudo passa, nem mesmo o velho orkut escapa do esquecimento.

Mateus Brandão de Souza, graduado em história pela FAFIPA.

Lançamento: Cinderela em Cordel, de Cacá Lopes


Cinderela é o conto popular mais difundido no mundo. Em Portugal, o personagem é chamado A Gata Borralheira. No Brasil, há muitas variantes da estória Maria Borralheira. A presente adaptação em cordel, escrita por Cacá Lopes, é baseada na versão de Charles Perrault (1628-1703), recolhida na França, onde a heroína é chamada Cendrillon. O filme Cinderela, dos estúdios de Walt Disney (1950), baseia-se nesta versão francesa. O cordel dá um toque nordestino a esse conto universal, que, há séculos, diverte e emociona crianças e adultos. 
Abaixo, um trecho do livro:

Vou recontar em Cordel
Uma história de primeira,
Falando de Cinderela
Uma menina faceira,
Também muito conhecida
Como Gata Borralheira.

Filha de um homem honrado,
Que, entrando em viuvez,
Quis fugir da solidão,
Casando mais uma vez,
Sem sequer imaginar
A tolice que ele fez.

A mulher com quem casou
Era a preguiça em pessoa.
No início, pra enganar,
Ela fez papel de boa,
Mas logo demonstrou ser
A megera mais à-toa.

(...)

Cacá Lopes é cantor, compositor, cordelista e violonista. Nasceu em Araripina (PE), na região encantada da Chapada do Araripe.  Foi apresentado ao mundo da arte pelo pai, Mestre Elpídio, fazedor de berimbaus. Radicado em São Paulo, com uma carreira consolidada como cantor e instrumentista, Cacá já cantou para aproximadamente um milhão de alunos da Rede Pública Municipal e Estadual de São Paulo, através do Projeto Cordel nas Escolas (ao lado de Costa Senna). Já se apresentou em dezenas de programas de televisão.

Créditos ao blog  Cordel Atemporal 

quarta-feira, 27 de julho de 2011

O cordão dos Puxa-sacos.

Esta postagem é em homenagem aos infindáveis puxa-sacos de Nova Londrina, do Brasil e do mundo.


Lá vem
O Cordão dos puxa-sacos
Dando vivas aos seus maiorais
Quem está na frente é passado pra trás
E o Cordão dos puxa-sacos
Cada vez aumenta mais...
Vossa Excelência...
Vossa Eminência...
Quanta reverência nos cordões eleitorais
Mas se o doutor cai do galho e vai ao chão
A turma logo evolui de opinião
E o Cordão dos puxa-sacos
Cada vez aumenta mais.

(Roberto Martins / Eratóstenes Frazão)

terça-feira, 26 de julho de 2011

A frase de Oscar Wilde.


Longe de mim a pretensão de me julgar inteligente, sou um mortal aprendiz de pouquíssimo conhecimento, além do mais como diria Raul, sou humano, ridículo e limitado. Porém, hoje mantive contato com uma pessoa cuja pouca inteligência atinge o absurdo e causa imensa admiração, é conhecidíssimo por muitos o tamanho vácuo do cérebro ao qual estou me referindo, a extensa área de lacunas vazias do mesmo onde pelo que aparenta, conhecimento algum nunca preencherá por completo. Meditando nesta admirável anomalia que anda por aí julgando-se o pai da razão, recordei-me da célebre frase de Oscar Wilde e após o contato que mantive com tal incomparável criatura, tornou-se impossível não lembrar e transcrever a frase deste  ilustre pensador irlandes.
"Há dois tipos de pessoas realmente fascinantes: os que sabem tudo e os que tudo ignoram". (Oscar Wilde).

domingo, 24 de julho de 2011

O laço de fita - (Castro Alves)


Não sabes crianças? 'Stou louco de amores...
Prendi meus afetos, formosa Pepita.
Mas onde? No templo, no espaço, nas névoas?!
Não rias, prendi-me
Num laço de fita.
Na selva sombria de tuas madeixas,
Nos negros cabelos da moça bonita,
Fingindo a serpente qu'enlaça a folhagem,
Formoso enroscava-se
O laço de fita.
Meu ser, que voava nas luzes da festa,
Qual pássaro bravo, que os ares agita,
Eu vi de repente cativo, submisso
Rolar prisioneiro
Num laço de fita.
E agora enleada na tênue cadeia
Debalde minh'alma se embate, se irrita...
O braço, que rompe cadeias de ferro,
Não quebra teus elos,
Ó laço de fita!
Meu Deus! As falenas têm asas de opala,
Os astros se libram na plaga infinita.
Os anjos repousam nas penas brilhantes...
Mas tu... tens por asas
Um laço de fita.
Há pouco voavas na célere valsa,
Na valsa que anseia, que estua e palpita.
Por que é que tremeste? Não eram meus lábios...
Beijava-te apenas...
Teu laço de fita.
Mas ai! findo o baile, despindo os adornos
N'alcova onde a vela ciosa... crepita,
Talvez da cadeia libertes as tranças
Mas eu... fico preso
No laço de fita.
Pois bem! Quando um dia na sombra do vale
Abrirem-me a cova... formosa Pepita!
Ao menos arranca meus louros da fronte,
E dá-me por c'roa...
Teu laço de fita.
Fonte: www.dominiopublico.gov.br

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Pensamentos de um idiota as 11 da noite

Texto de Marcos Valnei.


Estava pensando do alto dos meus 45 anos que se Deus for generoso, terei pela frente outros 20 ou quem sabe 25 anos. Pouco, se levarmos em conta que são mais 5 ou no máximo 6 copas do mundo. Isto passa voando. Então, conversando com as dores nos joelhos e nas juntas, que passam a fazer parte do quotidiano de quem chega a minha idade com uma vida sedentária, concluí que não existe mais tempo a perder.
Preciso virar o jogo, ganhar, antes que a partida vá para a prorrogação e eu possa perder nos pênaltis. Resolvi escalar o que tenho de melhor.

Minha experiência de vida, meu inconformismo, minha humildade, minha arte de fazer e manter amigos... Meu amor pela natureza e pelo simples...

Decidi retardar o envelhecimento. Vou deixar o carro na garagem e pelo menos andar a pé até o serviço. Vou tentar diminuir o cigarro e depois abandoná-lo de vez... Vou brindar com água mineral ou de coco e só de vez em quando me permitir um wisky, afinal, um porre faz parte desta vida e não creio que terei outra oportunidade no céu ou no inferno, se é que eles existem.

Vou amar quem me rodeia e a quem já me rodeou. Afinal, essa gente compôs minha vida. Vou respeitar e exigir respeito. E me refiro aos poderosos. Governo, polícia e aqueles que se intitulam autoridades.

Não me arrependo de minhas escolhas. Num determinado momento, decidi não ter religião, nem partido e nem time de futebol. Entendo-me com Deus e a gente se basta. Não posso ser patriota de um país que me explora com impostos cruéis. Não posso morrer pela pátria mãe que me atraiçoa como inimigo na trincheira. Sei que o país em sua essência, não tem culpa, mas, não posso amar a mãe que se deixou prostituir por padrastos que me violam. É assim que me sinto em relação aos políticos que me cobram deveres e me negam direitos.

Não posso me orgulhar de uma universidade que recebe incentivos dos governos municipal, estadual e federal e me cobra o olho da cara a mensalidade do meu filho. Quem me incentiva? Quem se orgulha de mim?

Estou cagando e andando para qual time foi campeão... Quem bateu recorde, quem é o primeiro do ranking...

Já me iludi com estas coisas...

Um dia deixei de acreditar em Papai Noel...

Em outro, deixei de acreditar em mentiras que contam para os adultos...

Hoje eu sou mais eu...

Com todas minhas imperfeições, fracassos, descrenças e convicções...

Pelo menos eu sou autêntico comigo mesmo... E em mim ainda consigo acreditar...

Marcos Valnei

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Hackers atacam página no Facebook do presidente da Colômbia

BOGOTÁ, Colômbia — O presidente colombiano, Juan Manuel Santos, lamentou nesta quarta-feira em sua conta do Twitter o ataque de hackers do Anonymous a sua conta no Facebook, em meio às comemorações dos 201 anos da independência da Colômbia.
"Lamento a interferência na conta do Facebook que está em meu nome e as mensagens publicadas ali", disse o presidente no Twitter.
Na página pessoal de Santos está uma mensagem: "somos Anonymous, somos uma legião, não esquecemos, não perdoamos, aqui estamos", como o link de um vídeo do Youtube intitulado "Falsa Independência".
O videoclip diz que em "20 de julho, a Colômbia não deveria comemorar, deveria exigir seus direitos e suas liberdade em todos os âmbitos", em referência à comemoração na Colômbia de seus 201 anos de independência da coroa espanhola.
Em seguida, a organização internacional de ciberativistas questiona que atualmente persiste no país sul-americano a violência, o desemprego, "os recursos naturais ainda são saqueados, a possibilidade de trabalhar e ganhar bem é mínima, os bancos controlam o monopólio do dinheiro", entre outras críticas.
O mesmo videoclip foi publicado na conta do Twitter do ex-presidente Álvaro Uribe, que qualificou de "grave" o dano à sua conta nessa rede social e pediu ajuda para recuperá-la. "Que grave dano criminal na nossa conta", escreveu. "Me ajudem a recuperar a conta que foi hackeada por criminosos", completou.
Além disso, o Anonymous invadiu as páginas da internet do Ministério da Defesa da Colômbia e do Conselho para o Bicentenário.
Em abril passado, a organização internacional de ciberativistas iniciou ataques contra a página do Ministério do Interior e da Justiça da Colômbia, em protesto contra um projeto de lei que pretende regular a internet e seus conteúdos, os direitos de autor e de propriedade intelectual.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

E as torcedoras paraguaias?


Tudo começou durante o mundial da África do Sul em 2010, quando em um estádio em Assucion, assistindo aos jogos do Paraguai por um telão, a morena Larissa Riquelme, despertou o libido do mundo ao exibir parte de seus belos seios em um decote atraente e tentador. Os dois pães de açúcar da paraguaia abrigavam ainda seu aparelho de telefone celular.
Pois bem, a exibição virou moda no Paraguai, agora quando há jogos da seleção daquele país, uma leva de beldades paraguaias vão aos estádios exibirem sem constrangimento toda a sua beleza feminina, beleza esta encontrada apenas nas mulheres da América Latina.

Segue fotos de outras belas mulheres paraguaias que seguiram os passos de la hermossa Larissa:







BORA PRO PARAGUAI?

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Sobre a loucura - Edward Bond

Nós não podemos falar nada sobre nós e a nossa época, sem começarmos por definir a loucura.

Como é que se explica que nós sejamos seres dotados de razão, enquanto a nossa sociedade é tão ligada à loucura?

Como as pessoas que tem toda a sua razão podem agir como se estivessem loucas e acreditar nas idéias loucas que a sociedade lhe impõe?

Nós podemos encontrar uma resposta com aqueles que perderam a razão.

O que é que os deixou loucos?

As pessoas ficam assim quando não chegam a criar uma relação funcional e prática com a sociedade e com a realidade.

O que eles fazem?

Eles criam uma sociedade que é uma realidade para eles.

Eles ficam loucos para não perder a sua razão.

A sua loucura é a explicação que eles dão para a loucura que eles encontram no mundo.

Edward Bond

A copa América de futebol 2011.

"Nunca antes na história do futebol"...

Os apreciadores do futebol entre seleções, com certeza estão atentos à esta copa América na Argentina. Ontem o Brasil proporcionou ao mundo um vexame pouco visto em jogos oficiais, fazendo todos os seus adversários deleitarem-se nos risos da zombaria sobre uma seleção penta-campeã mundial.

Numa tarde fatídica de decisão para uma vaga na semi-final do maior campeonato continental, o Brasil caiu frente ao Paraguai ao disputar nos penaltis o acesso que garantiria uma das duas seleções na próxima fase do torneio. O que assistimos por parte da seleção de Mano Menezes foi simplesmente vexatório, quatro cobranças efetuadas pelos brasileiros, nenhuma foi convertida, sendo que três delas sequer tomaram a direção do gol. Três dos chutes realizados pela nossa seleção, atingiram o olho dos eucalíptos plantados em derredor do estadio onde foi cenário da luta travada contra os paraguaios. Durante os noventa minutos, o Brasil até que tentou, porém, todas as tentativas esbarraram-se na muralha paraguaia chamada Villar, muralha esta que defendeu o único penalti brasileiro em direção ao gol.

Em suma, dois dos fortes candidatos ao título de campeão do continente, caíram por terra já nas quartas-de-final do campeonato, no sábado, a Argentina anfitriã, de Messi, saiu de cena, deixando felizes os uruguaios, numa partida onde os defensores da celeste olímpica recordaram-se do memorável maracanaço de 1950, quando no mundial de seleções daquele ano, o Uruguai enterrou o sonho de um Brasil também anfitrião.

Entre outras peculiaridades, a copa América 2011 tomou características antes inimagináveis, já não podemos dizer que seja impossível uma final de campeonato entre Peru e Venezuela, uma vez que ambas as seleções já estão nas semi-finais do torneio. No cruzamento entre Paraguai e Venezuela, os guaranis que não entrem de salto alto, pois a Venezuela, já provou que não veio em missão de paz ao eliminar o favorito Chile também na tarde de ontem.

Entre Uruguai e Peru, também não é diferente, os peruanos no sábado, derrubaram a empolgada Colombia que havia ficado em primeiro no grupo da dona da casa Argentina. Os uruguaios que esmerem-se, pois as seleções de menos tradição futibolística têm deixado claro que agora  "o buraco é mais embaixo".

No entanto, nós que apreciamos o futebol, que infelizmente a tempos está infectado pelo câncer capitalista, estamos mais perto do que nunca de vermos a emergente Venezuela levantar uma taça antes destinada apenas às principais seleções sul-americanas. 

Vamos ficar atentos, a atual copa América pode entrar para a história como "a copa dos extremos"...

"HASTA LUEGO BRASIL"

Mateus Brandão de Souza, graduado em história pela FAFIPA. 

sábado, 16 de julho de 2011

O guardador de rebanhos - Fernando Pessoa.

Fernando Pessoa
(Alberto Caeiro)


[213]
Num meio-dia de fim de primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.
Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu era tudo falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas…
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque não era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!
Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o sol
E desceu pelo primeiro raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.
A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as cousas.
Aponta-me todas as cousas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.
Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar no chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou —
«Se é que ele as criou, do que duvido» —
«Ele diz, por exemplo, que os seres cantam a sua glória
Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres.»
E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa.
Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural,
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.
E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é porque ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre,
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.
A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E a outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é o de saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.
A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.
Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.
Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo um universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.
Depois eu conto-lhe histórias das cousas só dos homens
E ele sorri, porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos-mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos os muros caiados.
Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.
Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate as palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.
Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.
Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam?