Os amigos do MST nos Estados Unidos iniciaram uma campanha de arrecadação de fundos para o 6º Congresso do MST. O objetivo da campanha é conseguir pelo menos U$ 10,000 para auxiliar o movimento nas despesas do Congresso. Para ajudar a campanha, a artista brasileira-estadunidense Aliene de Souza Howell doou nove quadros que pintou quando visitou assentados do movimento em São Paulo.
Imagens: reprodução/MST
A Página do MST conversou com Aliene para saber mais sobre seu trabalho, sua viagem ao Brasil, as impressões que ela teve dos assentamentos da Reforma Agrária, e como a arte pode ser uma forma de se fazer política. Confira a entrevista abaixo:
Página do MST: Para começar, fale um pouco sobre você. Quantos anos e onde mora?
Aliene de Souza Howell:Tenho 32 anos, moro na divisa entre o Brooklyn e Queens, em Nova Iorque. Nasci e fui criada em Nashville, no Tenesse, e vivi algum tempo na Carolina do Norte, Massachusetts, e Filadélfia, além de breves períodos fora do país. Menciono isso porque aprendi algo diferente sobre as pessoas e sobre mim, o que impactou meu trabalho, em cada lugar que vivi.
Como você se tornou uma artista?
Como me tornei uma artista? Que pergunta difícil! Acho que não lembro de nunca estar fazendo arte durante minha vida. Me iludi pensando que queria ser outra coisa por curtos intervalos de tempo, como uma advogada, uma astronauta, ou, quando era muito pequena, um caminhão de bombeiros, mas eu sempre voltei para a arte.
Eu costumava roubar as folhas da impressora do meu pai e desenhar enquanto ele estava trabalhando, e o meu “poder especial” como uma criança era que eu tinha uma caneta mágica que podia dar vida aos desenhos.
Como você conheceu o MST?
A minha tese de graduação foi uma série de pinturas sobre o Massacre de Greensboro (massacre ocorrido em 1979 no qual cinco ativistas foram assassinados por membros da Klu Klux Klan e do Partido Nazista Americano). Estava estudando na Universidade Guilford, em Greensboro, e o tempo coincidiu com a Comissão da Verdade para apurar os tiroteios do massacre.
Essa foi a primeira vez que minha arte e meus princípios humanitários se alinharam. Mudei para Northampton, para trabalhar no Fundo de Justiça para Greensboro. Através do Fundo fui para uma conferência de direitos humanos em Kentucky, onde encontrei um representante do MST. Dois anos depois fui ao Brasil visitar minha família e entrei em contato com ele.
Que assentamentos você visitou?
Visitei três assentamentos, todos no estado de São Paulo, e a Escola Nacional Florestan Fernandes. Fiquei na casa de uma família que era extremamente gentil. Duas das crianças dormiram na mesma cama para que eu pudesse ficar em uma, e também passei outras noites em uma igreja.
Eu já conhecia o MST por ser parte brasileira, mas fui atraída por ele por representar soluções inovadoras aos problemas da fome e pobreza.
Quais foram as suas impressões ao visitar os assentamentos?
No meu curto tempo lá, colhi milho em um acampamento, me banhei num rio junto com as crianças e tentei entender o dia a dia das pessoas conversando com elas. Mesmo o meu português sendo limitado, participei de uma reunião e me impressionei com a comunidade e o aspecto organizacional do MST.
As pessoas pareciam ter funções que davam a elas um senso de alegria e dever, tanto dentro do assentamento como na organização maior. Mas o aspecto mais envolvente da minha visita foi simplesmente falar com as pessoas, sobre qualquer tema: a forma de fazer a melhor pimenta, exportação de grãos de café, até o racismo nos Estados Unidos.
Por que você decidiu pintar pessoas no seus quadros, ao invés de, por exemplo, o assentamento em si, as casas, a natureza...?
Os quadros são uma combinação de pessoas que conheci e fotos que me deram quando mencionava meu projeto. Apesar de preferir pintar as pessoas que tinha conhecido, estava muito focada no que daria um bom quadro, e para algumas combinei imagens das duas.
Pintei as pessoas por um aspecto narrativo, porque pensei que elas contam uma história do MST e do meu tempo lá de uma maneira mais intensa. Gosto de ver as pinturas como uma representação dessas pessoas, das lutas de lá, mas também do humor e alegria incríveis que presenciei.
Tinha um homem que usava um boné escrito “procura-se um bumbum” que me matava de rir. Foi ele que me ensinou o segredo para fazer a pimenta perfeita.
Como a arte pode contribuir para a luta política?
Fico muito contente de você ter perguntado isso, porque passei um longo tempo dividida entre questões humanitárias, vegetarianismo, fazer arte, como eu poderia fazer uma diferença com a vida que eu tenho etc.
Mas eu acho que estava tão divida que não estava sendo eficaz em nenhum desses aspectos da minha vida. Então decidi seguir minha própria alegria e tentar atingir as pessoas dessa forma.
Existe uma tristeza profunda no mundo, responsável por muitos dos nossos problemas. Há uma falta que sentimos nas nossas relações familiares, com outras pessoas, com o lugar onde vivemos, e as pessoas tentam buscar coisas onde poderia existir alegria e interação.
Tem uma ótima frase do Howard Thurman que diz, “Não pergunte o que o mundo precisa. Pergunte o que te faz viva, e vá fazer isso. Porque o que o mundo precisa são de pessoas que se tornaram vivas”.
É uma esperança humilde que através do meu trabalho eu possa atingir as pessoas e ajudá-las a refletir sobre as suas próprias necessidades e alegrias, e quem sabe encorajá-las a fazer algo que atinja outras pessoas e assim por diante. Acho que a melhor política é essa.
Isso é também parte do motivo de eu ter doado meu trabalho para ajudar a financiar o Congresso do MST. Depois de ficar com eles no meu estúdio por anos, sem querer me separar deles, pensei que teriam uma função melhor se ajudassem as pessoas que inspiraram eles.
Você pode mandar uma mensagem aos camponeses do Brasil que lutam pela Reforma Agrária?
A melhor mensagem que posso dar é: nunca desistam. Acho que tentamos lutar muito contra a escuridão, que se manifesta de diversas formas, mas ao invés disso devemos nos preocupar em trazer a nossa luz e dos outros para fora.
Fonte: Página do MST
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