(Marcos Valnei – fevereiro de 2014)
Do alto da minha imperfeição humana e do cume da capacidade
de compreensão que me foi concedida, permiti-me um momento de contestação. Que
qualquer sintoma de heresia me seja perdoado por antecipação.
Não vivenciei a plenitude divina, portanto posso apenas me
comunicar de acordo com minhas limitações materiais. Então, decidi convidar
Deus para se despir de sua divindade e visitar a imperfeição da minha (in)
existência.
Se Deus fosse meu amigo, o convidaria para uma cerveja no
final do expediente. Confessaria a Ele minhas dores, sem a imposição de
qualquer sacramento. Perguntaria a Ele, o porquê da sua vontade prevalecer
sobre a minha... (Seja feita a sua vontade). Se eu sou passageiro, mortal e
findo, as minhas necessidades deveriam ser priorizadas diante de quem tem a
eternidade para alcançar suas metas. Um amigo entenderia isto sem me ameaçar
com o fogo eterno. Se Deus fosse meu amigo, sairíamos por aí, abraçados,
confessando desilusões e se eu tivesse poder sobre tudo, não deixaria um amigo
se desiludir.
Diria a Ele que joelhos esfolados e dores de um pai ou
preocupações de uma mãe não acrescentam nada a sua plenitude. Pediria ao meu
brother que livrasse nossa raça destas provações.
Enquanto enchesse seu copo com mais uma cerveja, perguntaria
a Ele porque sendo o dono de tudo, permitia que neste todo existisse o inferno
com suas chamas eternas.
Um amigo tem liberdade para questionamentos inconvenientes.
Então, Deus... Porque o Senhor que tudo pode, se compraz com
o que eu não posso?
Que interesse teria para o seu reino a desgraça dos últimos
que esperam outra vida para serem os primeiros?
Não posso me despir da minha condição humana. Mas a Ti, cabe
abdicar de tua condição divina e descer a este patamar em que me encontro.
Hoje, somos amigos... Amigos de gole...
Posso falar-te sem o medo das consequências...
Perdoa-me a limitação de minha compreensão. Mas, saiba que
não pedi para ser limitado... Esta imposição me foi imposta pelo poder da
criação. E já que chegamos a este ponto, porque me limitaste? Que danos poderia
causar a tua obra, o fato de eu poder compreender?
E se existem outras vidas, qual a razão de não sabermos?
Que interesse Tu terias em nossa ignorância?
É Deus... Sou um ser curioso... Não me contento com as
crenças de terceiros... Prefiro contestar tuas prioridades como um amigo
faria...
E mesmo sem compreender tuas razões, sigo sendo grato a Ti.
Pois sei que sem Teu consentimento, não acordaria amanhã.
Um brinde Deus, a vida que me concedestes...
Obrigado pelos filhos que me confiastes...
Tô precisando de uma carona... Acho que bebi demais.
Me leva pra casa?
E por favor... Vigia meu sono...
Afinal, pelo menos hoje, fomos amigos de gole...
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