segunda-feira, 29 de junho de 2015

O dia seguinte à redução da maioridade


Por Leonardo Sakamoto, em seu blog:

O que vai acontecer tão logo o Congresso Nacional aprove a redução da maioridade penal para 16 anos?

Vamos nos enrolar em nosso cobertor de ignorância e hipocrisia e sair quentinho pelas ruas achando que estamos seguros.

Problemas estruturais precisam de soluções estruturais e não medidas pontuais. Não é simplesmente punindo o jovem em desacordo com a lei, mas também criando condições para que ele não caia nas graças da criminalidade.

Caso contrário, o problema se reorganiza após a mudança da lei. Por exemplo, trazendo jovens de 15 anos para fazerem parte de roubos e serem culpados pelos crimes. E, assim, sobrevive.

Quem ganha com isso? Políticos, comunicadores e falsos profetas que oferecem gratuitamente o discurso do medo, viciando a sociedade, que depois ficará ansiosa para comprar as soluções simplistas que prometem paz e tranquilidade.

Soluções vendidas, aliás, por esses mesmos atores sociais, ao custo de “votem em mim'', “assistam ao meu programa'', “venham à minha igreja''.

Desse ponto de vista, qual a diferença entre alguns dos membros dessa Santíssima Trindade do Medo e aqueles que usam jovens para cometer crimes, uma vez que ambos os grupos lucram horrores com a exploração da violência?

Há jovens que não têm nada a perder porque nada tiveram. E os que podem perder muito mas, sinceramente, não se importam, porque nós não nos importamos como eles quando deveríamos.

E há, é claro, os casos patológicos, cuja prevenção é difícil ou mesmo impossível. Ou alguém acha que um maluco que abre fogo contra uma igreja em nome da supremacia branca, como aconteceu nos Estados Unidos, ou alguém massacra crianças de uma escola, como ocorreu em Realengo, no Rio de Janeiro, pensa na punição que vai sofrer?

Tenho medo de indivíduos que assaltam, roubam e matam, mas também tenho medo de uma sociedade maníaca que não fala, apenas rosna diante do desconhecido. Pois essa sociedade cisma em não se diferenciar de seus ancestrais que tacavam pedras no escuro porque temiam a noite.

Em momentos de emoção extrema, buscamos soluções simples para diminuir a perplexidade, saídas para preencher a falta de sentido e tapar o buraco deixado pela perda individual ou coletiva.

O problema é que elas não são úteis para resolver problemas estruturais, nem mesmo para contribuir com os processos simbólicos de luto e cura. Ajudam, contudo, naquela sede de vingança que carregamos desde sempre.

Por que não elevar a pena para quem se associa a jovens com menos de 18 anos para cometer crimes? Porque precisamos de sangue desses jovens.

São nos momentos de emoção extrema que nossa racionalidade é colocada à prova. Ou seja, que somos chamados a provar que deixamos de ser uma horda tresloucada que segue um único instinto, o medo.

A sensação de insegurança pode levar à raiva, à vingança e à mais violência.

Ou a uma reflexão que gere mudanças estruturais possíveis, mas difíceis, como garantir uma vida melhor para a juventude no Brasil, evitando assim o problema antes dele acontecer.


O que escolheremos? O que veremos no espelho no dia seguinte?

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