domingo, 14 de junho de 2015

Povo curdo. A guerra libertária de uma nação sem país

Fotógrafo brasileiro acompanha cotidiano de guerrilheiros curdos na resistência ao Estado Islâmico. A busca de uma sociedade igualitária no norte da Síria


Cidadãos curdos e combatentes das milícias YPG e YPJ comemoram o Newroz dançando em 
volta de fogueiras

Se estivesse organizado em um território, o Curdistão seria um dos 50 países mais ­populosos do mundo, com 26 milhões de habitantes. Mas os curdos vivem em uma ­região do Oriente Médio, com 500 mil ­metros ­quadrados, espalhados por vários países – Turquia, Iraque, Síria, ­Armênia e Azerbaijão. Durante 80 dias, entre ­fevereiro e maio, o fotógraf­o brasileiro Alexandro Auler ­percorreu a planície da antiga Mesopotâmia, na fronteira da Turquia com a Síria, entre os rios Tigre e Eufrates, que correm pela região e pela história da humanidade. 

São dele as imagens desta e das próximas ­páginas, que retratam os conflitos que ­envolvem o povo curdo – a maior etnia sem estado no mundo, lembra.

“Antes da guerra civil, a cidade de Kobani contava com aproximadamente 400 mil habitantes. Após o início do conflito, em 2011, estima-se que apenas 12 mil permaneceram no local”, relata Alexandro. Ele conta que naquele lugar, 100 anos atrás, havia dois vilarejos que, após vários desentendimentos, se uniram – Kon-Bani quer dizer “viver em grupo” ou “reconciliação”. É uma das explicações para o nome da cidade, cujo significado, hoje, ainda parece uma realidade distante, na luta pela independência curda.

Em guerra com a Síria desde 2011, a cidade teve 80% de seu território controlado pelo Isis (Estado Islâmico do Iraque e Síria) em 2014. Kobani também foi arrasada por bombardeios da coalizão internacional, liderada  pelos Estados Unidos, que deixaram pelo menos 2 mil mortos. Em janeiro, após meses de combates, milícias do YPG (soldados homens), aliadas a soldados estrangeiros, chamados de “Internacional”, mais o exército Peshmarga (iraniano), ajudaram a libertar a cidade do domínio do Isis. Esse movimento de resistência é de inspiração socialista.

“Mesmo com o fim dos confrontos, no centro da cidade é muito comum ouvir o eco das explosões e dos disparos que acontecem nas linhas de frente, principalmente durante a noite. Kobani não possui fornecimento de energia elétrica ou água tratada há mais de três anos. Recentemente, pequenos mercados, farmácias, barbearias e pontos de venda de celulares e diesel começaram a funcionar”, conta Alexandro, lembrando das características da região. “Lá é Síria, mas eles são curdos, então se consideram Curdistão.”


Impressionou o fotógrafo – gaúcho de origem que já morou em várias cidades brasileiras – a banalidade da morte. Suas fotografias mostram jovens, meninos e ­meninas. Muitos posam sorridentes com suas ­armas, sinal de conquista. As jovens guerreiras (YPJ) carregam bombas em seus corpos. São suicidas. Seguem o exemplo de Arin Mirkan, guerreira que no ano passado preferiu se matar a se entregar ao inimigo. “Lá é uma honra ser mártir”, diz Alexandro, repetindo uma frase comum: Sherid no Mirin (“Somente os ­mártires têm vida eterna”).

Amara, 25 anos, comandante da YPJ, exército guerrilheiro que ajudou a retomar Kobani

Três semanas após a reconquista de Kobani, as famílias começam a voltar
 para suas casas e reconstruir suas vidas

Combates contra o exército do Estado Islâmico continuam nos vilarejos localizados num raio de 20 a 25 km de Kobani

As tropas YPG, formadas por jovens, lutam para defender seu território dos radicais Islâmicos

Kobani também foi arrasada por bombardeios da coalizão internacional, liderada pelos EUA, 
que deixaram pelo menos 2 mil mortos

Cerca de mil pessoas participaram do Dia Internacional da Mulher em Kobani, caminhando 
quase 5 km

Funerais acontecem quase que diariamente

As mulheres de Kobani participam ativamente da luta por uma 
sociedade livre

Guerrilheiros YPJ e YPG no front leste da cidade

Banalidade da morte em Kobani impressionou o 
fotógrafo Alexandro Auler


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