O presidente da Câmara é acusado de ameaçar delatores e usar dinheiro público para investigar quem o denuncia.
Da revista CartaCapital:
A trama envolvendo o presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), continua se engrossando à medida que fica mais próximo o fim do
mandato de Rodrigo Janot à frente da Procuradoria-Geral da República. A
expectativa é de que Janot denuncie Cunha em breve, antes de entrar em seu
período final à frente da PGR – que se encerra em 18 de setembro e cuja
renovação depende de votação entre promotores, da escolha da presidenta Dilma
Rousseff e da aprovação pelo Senado.
Cunha não deixa dúvidas de que batalhará para não cair. Há
duas semanas, rompeu com o governo, a quem acusa de conluio com Janot para
enquadrá-lo, e disse esperar a denúncia do PGR com tranquilidade, por acreditar
ter no STF, responsável por torná-lo ou não réu, um fórum mais justo.
Enquanto diz confiar nas instituições, Cunha é acusado de
usar métodos bem menos republicanos para minar quem o acusa.
Intimidações
Na quinta-feira 30, a advogada Beatriz Catta Preta, que
abandonou há algumas semanas a defesa de nove dos delatores da Operação Lava
Jato, insinuou que Cunha estaria por trás de intimidações sofridas por ela e
sua família. Ao Jornal Nacional, Catta Preta disse ter recebido ameaças
“veladas” e “cifradas” que se intensificaram depois de Julio Camargo, seu
cliente, afirmar em depoimento que pagou propina de 5 milhões de dólares a
Eduardo Cunha para que um contrato com navios-sonda da Petrobras fosse
viabilizado.
Ex-consultor da Toyo Setal, Camargo inicialmente não citou
Cunha, mas modificou seu depoimento. De acordo com Catta Preta, Camargo teve
“medo de chegar ao presidente da Câmara”, mas decidiu denunciar o peemedebista
porque o acordo de delação premiada prevê a perda de todos os benefícios caso o
colaborador minta para as autoridades.
Nas alegações finais apresentadas à Justiça Federal na
quinta-feira 30, a defesa de Camargo, já sem Catta Preta, apresentou a mesma
versão: disse que as contradições são fruto do “temor em relação ao deputado
federal Eduardo Cunha” e acusou o presidente da Câmara de adotar uma “lógica de
gangue” ao tentar intimidar os delatores.
Catta Preta e Camargo não são os únicos que relatam se
sentir ameaçados pelo presidente da Câmara dos Deputados. Em 16 de julho,
também em depoimento à Justiça Federal, odoleiro Alberto Yousseff, cuja delação
serviu para embasar a abertura de inquérito contra Cunha, disse ter sido
ameaçado. “Como réu colaborador, quero deixar claro que estou sendo intimidado
pela CPI da Petrobras por um deputado pau mandado do senhor Eduardo Cunha”,
disse Yousseff ao juiz Sergio Moro. “Eu venho sofrendo intimidação perante as
minhas filhas e a minha ex-esposa por uma CPI coordenada por alguns
políticos", afirmou.
A Kroll e a CPI da Petrobras
Tanto Beatriz Catta Preta quanto os familiares de Yousseff
foram convocados pela CPI da Petrobras graças a requerimentos do deputado Celso
Pansera (PMDB-RJ), um firme aliado de Eduardo Cunha.
Na quinta-feira 30, o presidente do Supremo Tribunal
Federal, Ricardo Lewandowski, concedeu habeas corpus a Catta Preta
desobrigando-a de comparecer à CPI, mas a convocação fez com que ela desistisse
não apenas do caso como da carreira. Segundo disse à tevê Globo, Catta Preta
fechou seu escritório em São Paulo e decidiu se aposentar. No caso das
familiares de Yousseff, que foram convocadas duas vezes pela CPI, também o STF
derrubou os pedidos.
Além disso, Cunha é acusado de usar o orçamento da Câmara
para acuar seus delatores.
No início da CPI da Petrobras, a Câmara contratou a
famigerada Kroll para auxiliar as investigações sobre a Lava Jato por 1,18
milhão de reais. Na quinta-feira 30, o jornal O Estado de S.Paulo afirmou que o
contrato, mantido em sigilo por decisão de Cunha até 2020, previa investigações
sobre 15 pessoas, mas a lista foi reduzida a apenas quatro “prioridades” pelo
presidente da CPI, Hugo Motta (PMDB-PB), e por um dos sub-relatores, André
Moura (PSC-SE), ambos aliados de Cunha. Entre os alvos selecionados estaria
Julio Camargo, que delatou Cunha. O objetivo seria, de acordo com o jornal,
“desqualificar a delação do lobista”.
Cunha negou as acusações de manipulação na CPI. “Não
participei, não participo, nem participarei de qualquer decisão sobre
investigações da CPI, que tem a sua autonomia”, afirmou o deputado em nota à
imprensa. Nesta sexta-feira 31, no entanto, o jornal O Globopublicou reportagem
também afirmando que Motta e Moura de fato teriam selecionado quatro alvos e
que, além de Julio Camargo, estaria na lista Alberto Yousseff, outro que
incriminou Cunha.
As acusações de que Cunha e seus aliados usam seus cargos
contra desafetos não se tratam de uma novidade. A suspeita original contra ele,
investigada pela Procuradoria-Geral, é de que Youssef e o ex-diretor da
Petrobras Paulo Roberto Costa firmaram contratos de aluguel de sondas
submarinas com as companhias Samsung e Mitsui e que parte do dinheiro pago por
elas seria propina a Cunha. O suborno seria intermediado por Julio Camargo, que
teria sido ameaçado por Cunha quando decidiu parar de pagar a propina.
A pressão teria sido feita por meio de requerimento
apresentado na Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara, em 2011, pela
então deputada Solange Almeida (PMDB-RJ). Conforme noticiou a Folha de S.Paulo
em abril, o requerimento apresentado por Almeida teria sido feito em um
computador de Cunha. Na época, o presidente da Câmara disse que o caso
tratava-se de uma “armação” contra ele.
Recentemente, Cunha sofreu uma nova acusação de intimidação,
feita pelo empresário Milton Schahin. Segundo o jornal O Globo, o dono do grupo
Schahin tem uma disputa empresarial com Lucio Bolonha Funaro, citado nos
escândalos do “mensalão” e da Operação Satiagraha, e vem sendo pressionado na
Câmara por meio de requerimentos apresentados por aliados de Cunha.
Desde 2008, afirma o jornal, foram apresentados 30 pedidos
de investigação contra o Grupo Schahin. Para o empresário, isso só pode ser
explicado pela união entre Funaro e Cunha. “Vejo como pura sacanagem do Funaro.
Agora você me pergunta: como o Funaro pode ter tanta força? Porque o Eduardo
Cunha está por trás. Temos uma pendência muito grande com Funaro, e a ligação
de Cunha com ele é muito conhecida”, afirmou ao Globo.
Na volta do recesso da Câmara, Cunha articula um outro tipo
de ofensiva, agora contra o governo. Deve ordenar a abertura de quatro CPIs e
entregar seus comandos a parlamentares de PSDB, DEM e PMDB; promover a análise
das contas dos ex-presidentes da República Fernando Collor, Fernando Henrique
Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, para abrir caminho para a análise das
contas de Dilma; e manejar as votações de forma a atrapalhar o ajuste fiscal.
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