Mesmo fisiologismo que elegeu Cunha vai levar o atual
presidente da Câmara a perder a liderança
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Por Helena Sthephanowitz, na Rede Brasil Atual:
Se o PMDB estivesse com a bola toda para derrubar a
presidenta Dilma Rousseff, iria votar pautas bombas para inviabilizar um
hipotético governo do correligionário Michel Temer? Claro que não.
Se Aécio Neves tivesse expectativa de chegar ao poder em
breve, iria tocar fogo com pautas bombas que explodiriam no seu colo? Também
não.
Então até o cimento da Praça dos Três Poderes sabe que, na
conjuntura atual, não existe a menor viabilidade de dar o golpe "paraguaio"
do impeachment.
A mídia oligopólica conspira. Políticos da oposição e alguns
insatisfeitos da base governista conspiram. Tem sim parlamentares que
desejariam o golpe para pegar o poder, mas sabem que não têm cacife para tanto.
Porque a situação é igual à das potências nucleares na Guerra Fria: apontavam
os mísseis mas não podiam disparar, porque não sobreviveriam à inevitável
retaliação.
Ameaçar com o impeachment serve para "sangrar" o
governo Dilma (como expressou o senador tucano Aloysio Nunes, tempos atrás),
para enfraquecê-lo Serve para chantagear politicamente, para o poder econômico
passar patifarias contra os trabalhadores e contra a cidadania no Congresso.
Mas o golpe em sim é apenas uma ameaça porque, ao se deflagrar um processo de
impeachment, a retaliação será fatal para as forças políticas golpistas.
Não tem como rolar a cabeça de uma presidenta cuja
honestidade fica comprovada em todas as investigações, sem rolar antes a cabeça
de dezenas, talvez centenas de parlamentares investigados ou denunciados por
corrupção. Grande parte deles, justamente os golpistas. Além disso, a
deflagração de uma muito provável fúria popular se alastraria contra
governadores, prefeitos, vices – alguns na situação de investigados em diversas
operações e apurações pelo país.
Enquanto os golpistas blefam sem limites, a presidenta é
obrigada a ser comedida como devem ser chefes de Estado, e tocar o governo em
frente. Porém, se vier a ser iniciado um processo de impeachment, reagir ao
golpe e abrir fogo cerrado – politicamente falando – passa a ser até mesmo uma
obrigação para a presidenta, na defesa da própria integridade democrática do
país.
Além disso, hipoteticamente falando, como imaginar a
aceitação popular de qualquer sucessor vindo dos meios políticos suspeitos,
carregando todos os vícios do sistema, e ainda mais sem ter sido eleito pelo
voto popular. Até para quem não gosta da presidenta, seria trocar o ruim pelo
pior.
Também não passa de desejo irrealizável a tese do senador
tucano Aécio Neves de pedir novas eleições antecipadas. Primeiro porque salta
aos olhos tratar-se de capricho pessoal por ter sido derrotado nas urnas e de
que é ambição por cálculo político momentâneo. Não vivemos no parlamentarismo
mas, se vivêssemos, teríamos presidente e primeiro-ministro. Em casos de crises
políticas, o parlamento poderia trocar o primeiro-ministro, mas quem teria
poderes para convocar novas eleições seria justamente o presidente – e para
eleger um novo Congresso.
Se a crise política fosse tão grave a ponto de haver um
esgotamento institucional na governança do país – e não é esse o caso – o
correto seria convocar uma Assembleia Nacional Constituinte para fazer pelo
menos as reformas política e administrativa e convocar novas eleições gerais.
Não é trocando presidente, mantendo todo o entorno intacto ou pior, que
saciaria a fome de mudança do povo.
A tese de novas eleições em caso de crise só interessaria ao
povo se fossem eleições gerais, para eleger também outro Congresso Nacional, e
com outras regras, para que seja representativo dos anseios populares.
O ritmo frenético do presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), ao colocar em votação e aprovar as chamadas pautas bombas –
verdadeiros "cheques sem fundos" que não cabem no Orçamento da União
– revela mais desespero de quem está atirando porque está caindo, do que força
para dar um golpe e destituir a presidência da República.
Cunha foi eleito por seus pares pela expectativa de poder
que ele representava. Com uma Câmara mais fisiológica eleita em 2014, o estilo
de ser e atuar de Cunha, na base de fazer pressão por cargos e verbas e em
troca votar projetos de interesse dos seus círculos, seduziu a maioria
parlamentar.
Porém, desde que o presidente da Câmara apareceu envolvido
nas investigações da operação Lava Jato, ele tem misturado suas encrencas pessoais
com o cargo que ocupa, obstruindo negociações políticas legítimas. Chegou ao
ponto de se declarar na oposição ao poder Executivo como retaliação por ter
sido delatado no poder Judiciário. É como se ele quisesse que o poder Executivo
garantisse uma impossível impunidade em outro poder independente.
Para piorar, tem arrastado seus correligionários para suas
encrencas. A contratação da empresa de investigação Kroll pela CPI da Petrobras
já está virando um escândalo em si, a ponto de oficialmente só dois membros
saberem quem e o que a Kroll investiga. Nem se trata de ter acesso ao resultado
final da investigação. Nem sequer o pedido do que investigar está sob sigilo.
O deputado Paulinho da Força, aliado de Cunha, requereu na
CPI a quebra do sigilo telefônico do Procurador Geral da República Rodrigo
Janot, a quem o presidente da Câmara hostilizou por ser investigado. Janot
acabou fortalecido por sua classe vencendo a eleição para ser indicado para
continuar no cargo por mais dois anos. Paulinho ficou com o desgaste e tem
submergido publicamente, conspirando pelo impeachment em cafés da manhã e
jantares de "golpistas clandestinos" (aqueles que negam estarem
conspirando).
Outro desgaste ruim para os parlamentares é que as pautas
bombas e a agenda denuncista de CPIs estão desagradando empresários que
financiaram campanhas destes deputados. E a mesma crise que afeta a economia do
governo federal atinge também governadores e prefeitos aliados dos
parlamentares e empresas. Não dá para sustentar fogo amigo por muito tempo
contra quem dá suporte às suas eleições.
Com isso, a liderança de Cunha está com prazo de validade
vencendo. Mesmo que ele consiga sobreviver no cargo, será enquadrado por seus
seguidores. A bancada fisiológica que o elegeu não quer saber de ficar ao lado
da oposição. Quer participar do governo em cargos e conseguir verbas para suas
bases eleitorais. O blefe do impeachment é útil a Cunha porque transparece
expectativa de poder. Tanto passa a ideia de que o PMDB ficaria com a
presidência da República se Dilma caísse, como passa a ideia de que Dilma
estaria na mão dele para ficar. Nenhuma das duas coisas é propriamente verdade
pela conjuntura desfavorável ao impeachment.
Assim esse blefe está se esgotando. A bancada hoje cunhista
não vai esperar para as escaramuças de Cunha com o governo sem resultado, e a
ficha está caindo de que o impeachment é inviável. Isto faz os parlamentares
passarem a buscar outros canais de interlocução com ministérios para voltar à
paz com o governo para ver suas demandas atendidas.
A crise política na base governista, hoje, parece com a
parábola da carroça de abóboras. Um cocheiro dirigia a carroça por uma estrada
de terra esburacada e a cada solavanco parava para ajeitar as abóboras que
saiam do lugar. Até que viu outra carroça passando e outro cocheiro mais
experiente seguia em frente e nem olhava para trás. As abóboras que estavam
desarrumadas organizavam-se sozinhas no próximo solavanco.
Os solavancos políticos que vêm por aí não resultarão em
impeachment, que se mostra cada vez mais ser inviável. Um deles, talvez o
maior, é a operação Lava Jato avançando em direção a caciques do PMDB e de
outros partidos, inclusive da oposição. Fala-se em um terço ou um quarto do
Congresso cair nas investigações da Lava Jato. É bem possível que deflagre até
um rearranjo partidário com rachas, fusões, trocas de nomes e de legenda.
Outro solavanco que acomodará as coisas será a presidenta
Dilma trocar o ministério, pois o atual não está cumprindo o compromisso de uma
coalizão.
Via – Altamiro Borges
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