Às vezes imagino como seria ser um judeu na Alemanha dos
anos vinte e trinta do século passado, pressentindo que alguma coisa que
ameaçava sua paz e sua vida estava se formando mas sem saber exatamente o quê.
Este judeu hipotético teria experimentado preconceito e discriminação na sua
vida, mas não mais do que era comum na história dos judeus. Podia se sentir
como um cidadão alemão, seguro dos seus direitos, e nem imaginar que em breve
perderia seus direitos e eventualmente sua vida só por ser judeu.
Em que ponto, para ele, o inimaginável se tornaria
imaginável? E a pregação nacionalista e as primeiras manifestações fascistas
deixariam de ser um distúrbio passageiro na paisagem política do que era,
afinal, uma sociedade em crise mas com uma forte tradição liberal, e se
tornaria uma ameaça real? O ponto de reconhecimento da ameaça não era evidente
(…). Muitos não o reconheceram e morreram pela sua desatenção à barbárie que
chegava.
A preocupação em reconhecer o ponto pode levar a paralelos
exagerados, até beirando o ridículo. Mas há algo difuso e ominoso se
aproximando nos céus do Brasil, à espera que alguém se dê conta e diga “Epa”
para detê-lo? Precisamos urgentemente de um “Epa” para acabar com esse clima.
Pessoas trocando insultos nas redes sociais, autoridades e ex-autoridades sendo
ofendidas em lugares públicos, uma pregação francamente golpista envolvendo
gente que você nunca esperaria, uma discussão aberta dentro do sistema jurídico
do país sobre limites constitucionais do poder dos juízes… Epa, pessoal.
Se está faltando algo para nos avisar quando chegamos ao
ponto de reconhecimento irreversível, proponho um: o momento da posse do
Eduardo Cunha na presidência da nação, depois do afastamento da Dilma e do
Temer.
Via – Luis Müller Blog
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