Ninguém jamais terá a desculpa de dizer que não viu o
monstro crescer.
Ocupantes de uma Saveiro preta jogaram os papeis. Havia
policiais de plantão. Antes do ataque, o carro passou três vezes pelo local,
afirmam testemunhas. Ainda assim, a PM afirma que não viu nada. Ok.
Um protesto também aconteceu ali. Um sujeito chamado
Cipriano de Oliveira, aposentado de 60 anos, resumiu o espírito de porco ao
Estadão: “Qualquer momento é momento de mandar um bandido embora. Até no
enterro da minha mãe eu faria isso”.
Submetida a uma dieta de ressentimento, desinformação e
indignação seletiva, essa escumalha passou a considerar aceitável socialmente
conspurcar um enterro e humilhar os familiares e amigos do morto.
Eles são “gente do bem”, segundo a definição imortal do
líder dos Revoltados On Line, Marcello Reis, um mussolini para os nossos tempos.
Isso não os choca porque eles estão acima do bem e do mal.
Não é força de expressão: uma pesquisa da empresa britânica YouGov com 1,646
homens e mulheres constatou que direitistas se acham moralmente superiores.
De acordo com o estudo, 47 daqueles que se descrevem como
sendo de direita se declaram seres humanos melhores do que o cidadão médio
(contra 39% de sedizentes esquerdistas). O levantamento também revelou que são
mais propensos a acreditar que certas pessoas “nascem más”.
Os depravados que atacaram uma cerimônia fúnebre têm um
nome: fascistas. Como lidar com eles?
Para começar, não é com “republicanismo”. Aquilo não faz
parte do “debate político”. O filósofo Karl Popper escreveu o seguinte:
“A tolerância ilimitada leva ao desaparecimento da
tolerância. Se estendermos a tolerância ilimitada mesmo para aqueles que são
intolerantes, e se não estivermos preparados para defender uma sociedade
tolerante contra o ataque dos intolerantes, então os tolerantes serão
destruídos e a tolerância com eles.
Esta formulação não implica que devamos sempre suprimir as
filosofias intolerantes, contanto que possamos combatê-las com argumentos
racionais e mantê-las sob controle da opinião pública.
Mas devemos reivindicar o direito de suprimi-las, se
necessário até mesmo pela força, e isso pode facilmente acontecer se elas não
estiverem preparadas para debater no nível de argumentação racional, ao começar
por criticar todos os argumentos e proibindo seus seguidores de ouvir
argumentos racionais, pois ela é uma filosofia enganosa, ensinando-os a
responder a argumentos com uso de punhos ou pistolas.
Devemos, portanto, reivindicar, em nome da tolerância, o
direito de não tolerar os intolerantes. Devemos enfatizar que qualquer
movimento que pregue a intolerância deva ser colocado fora da lei, e devemos
considerar a incitação à intolerância como criminosa, da mesma forma como
devemos considerar a incitação ao assassinato, ou seqüestro, ou a revitalização
do comércio de escravos como criminosa”.
*Sobre o Autor
Diretor-adjunto do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e
músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São
Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.
Via -DCM
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