Por Octavio Paz (1914-1998)
(…)
Para o habitante de Nova York, Paris ou Londres, a morte é a
palavra que jamais se pronuncia porque queima os lábios. O mexicano, ao
contrário, a frequenta, burla-se dela, a acaricia, dorme com ela, a festeja, é
um de seus brinquedos favoritos e seu amor mais permanente. Claro, em sua
atitude há quiçá tanto medo como na dos outros; mas pelo menos não se esconde
nem a esconde; a contempla cara a cara com impaciência, desdém ou ironia: “se
vão me matar amanhã, que me matem de uma vez”
A indiferença do mexicano diante da morte se nutre de sua
indiferença diante da vida. O mexicano não só pretende a intranscendência* do
morrer como também a do viver. Nossas canções, ditados, festas e reflexões
populares manifestam de uma maneira inequívoca que a morte não nos assusta
porque “a vida nos curou de espantos”. Morrer é natural e até desejável; o
quanto antes, melhor.
Nossa indiferença diante da morte é a outra cara de nossa
indiferença diante da vida. Matamos porque a vida, a nossa e a alheia, carece
de valor. E é natural que assim ocorra: vida e morte são inseparáveis e toda
vez que a primeira perde o significado, a segunda se torna intranscendente*. A
morte mexicana é o espelho da vida dos mexicanos. Diante de ambas o mexicano se
fecha, as ignora.
(O escritor mexicano Octavio Paz,
Nobel de Literatura de
1990, aos 23 anos)
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Quando explodimos, ademais, tocamos
o ponto mais alto da tensão, roçamos o vértice vibrante da vida. E ali, na
altura do frenesi, sentimos a vertigem: a morte nos atrai.
Por outro lado, a morte nos vinga da vida, a desnuda de
todas as suas vaidades e pretensões e a converte no que é: meros ossos e uma
careta assustadora. Em um mundo fechado e sem saída, onde tudo é morte, a única
coisa valiosa é a morte. Mas afirmamos algo negativo.
Caveiras de açúcar ou de papel de seda, esqueletos coloridos de fogos de artifício, nossas representações populares são sempre uma zombaria da vida, uma afirmação do nada e da insignificância da humana existência. Adornamos nossas casas com crânios, comemos, no dia dos defuntos, pães que fingem ser ossos e nos divertem canções e anedotas nos quais a morte careca dá risada, mas toda essa familiaridade fanfarrona não nos dispensa da pergunta que todos nos fazemos: o que é a morte? Não inventamos uma nova resposta. E cada vez que nos fazemos esta pergunta, encolhemos os ombros: que me importa a morte, se não me importa a vida?
Caveiras de açúcar ou de papel de seda, esqueletos coloridos de fogos de artifício, nossas representações populares são sempre uma zombaria da vida, uma afirmação do nada e da insignificância da humana existência. Adornamos nossas casas com crânios, comemos, no dia dos defuntos, pães que fingem ser ossos e nos divertem canções e anedotas nos quais a morte careca dá risada, mas toda essa familiaridade fanfarrona não nos dispensa da pergunta que todos nos fazemos: o que é a morte? Não inventamos uma nova resposta. E cada vez que nos fazemos esta pergunta, encolhemos os ombros: que me importa a morte, se não me importa a vida?
(Trecho de Todos Santos, Día de Muertos, do livro El
Laberinto de la Soledad. Fondo de Cultura Económica, México, 1994. Tradução
minha para este post)
Via - Socialista Morena
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