domingo, 13 de dezembro de 2015

Luciana Genro desagrada até o PSOL


Por Altamiro Borges

Nesta sexta-feira (11), milhares de gaúchos foram às ruas contra o golpismo. No período da manhã, cerca de 700 lideranças sociais participaram do lançamento da Frente Brasil Popular, no auditório da Federação dos Trabalhadores na Agricultura. Na sequência, um ato em frente à estátua do ex-governador Leonel Brizola, ao lado do Palácio Piratini, reuniu dirigentes do PT, PDT, PCdoB, PSOL e Rede e lutadores sociais para fundar o “Movimento pela Legalidade e a Democracia”. Houve ainda a 20ª Marcha dos Sem, movimento já tradicional no Rio Grande do Sul, organizado por entidades sindicais e populares. Foi um dia histórico para os gaúchos, que relembra a heroica resistência ao golpe militar de 1964. Luciana Genro, candidata do PSOL nas eleições do ano passado, esteve presente aos eventos da tarde e discursou contra o impeachment, o ajuste fiscal e pelo “Fora Cunha”.

Na mesma semana, porém, ela apresentou uma proposta que gerou fortes críticas de organizações de esquerda e desagradou seu próprio partido. Em artigo intitulado “Contra Cunha e Temer, por eleições gerais em 2016”, Luciana Genro defendeu o encurtamento do mandato da presidenta Dilma. “Através de novas eleições o povo poderá expressar o seu descontentamento de forma direta, sem a intermediação de políticos e partidos golpistas, que se aproveitam da indignação popular para impor seus interesses. Esta mudança no calendário eleitoral é absolutamente necessária diante da gravidade da situação, e nestes momentos de grave crise, mais do que nunca, é o povo quem deve ter a palavra final, e não as castas políticas em seus conluios escusos”, argumentou.

A proposta caiu como um raio em céu azul. Dias antes o próprio PSOL havia realizado reunião da sua direção nacional em que a ideia da antecipação das eleições nem sequer foi apresentada. A sua resolução final, conforme explicação enviada ao blog Diário do Centro Mundo, “convoca a militância a mobilizar, junto com os movimentos sociais na Frente Povo Sem Medo, contra o ajuste fiscal do governo e pelo ‘Fora Cunha’. Ao mesmo tempo, se coloca diretamente contrário ao processo de impeachment em curso - sem, contudo, defender o governo. O partido manterá a sua atuação como oposição à esquerda”. O texto ainda reproduz a resolução do 5º Congresso Nacional da sigla, que é taxativa: “Destituir Dilma, cujo governo antipopular nos opomos, para colocar em seu lugar Michel Temer (PMDB), significaria aprofundar ‘uma ponte para o futuro’ que é mera continuidade do presente, pavimentada pelos materiais do privatismo puro e duro... O PSOL não participará de manifestações que tenham como finalidade defesa do governo ou de defesa do impeachment”.

Com base nestas “resoluções unificadas”, importantes lideranças do partido correram para manifestar sua discordância com a principal referência da sigla. O deputado federal Jean Wyllys foi um dos primeiros a discordar de maneira cordial e civilizada. Em sua página no Facebook, ele postou na quinta-feira (10): “Eu respeito muito a Luciana, é minha companheira e amiga e fez uma belíssima e corajosa campanha nas eleições presidenciais de 2014 como candidata do PSOL. Contudo, dessa vez, discordo dela. Aliás, a proposta que ela divulgou não é a posição do PSOL. Em seu congresso nacional, realizado no último final de semana, o partido ratificou sua posição contra o impeachment e sua decisão de não participar de nenhuma manifestação em defesa do impedimento da Presidenta ou em defesa do governo... Minha posição é que tanto a Presidenta quanto o resto dos representantes eleitos pelo povo devem cumprir os seus mandatos como ordena a Constituição. No Brasil não existe a revogação de mandatos”.

No mesmo rumo, o jornalista e cartunista Gilberto Maringoni, que disputou o governo de São Paulo em 2014, também criticou a proposta – “problemática no método e no mérito”. Em seu perfil no Facebook, ele polemizou: “Tenho imensa consideração e mantenho boa relação pessoal com Luciana Genro. Ela fez, em 2014, uma campanha valente e heroica. Todo o PSOL e os quase dois milhões de eleitores que escolheram seu nome reconhecem isso... Por tais motivos, vou, respeitosamente, me contrapor ao que ela afirma. A proposta de Luciana é problemática no método e no mérito... No método porque o PSOL acaba de sair de um Congresso, realizado em Brasília entre os dias 4 e 6 últimos. Lamentavelmente Luciana somente pode participar da abertura, no primeiro dia. O encontro debateu e deliberou sobre o tema. Colocou-se contra o impeachment e contra o ajuste fiscal... Foi a resolução que mais recebeu votos em apoio: cerca de 95% dos delegados. Os companheiros da corrente de Luciana votaram na posição aprovada, não fizeram objeções e nem apresentaram sugestão diversa”.

Já no que se refere ao mérito, Gilberto Maringoni afirma que a proposta é equivocada. “Só faz sentido apontar para novas eleições se houver alguma perspectiva de que a esquerda e os setores democráticos cresçam. Ou seja, quando a tensão por mudança puder resultar em nova correlação de forças, sacramentada por eleições, assembleias constituintes, referendos etc. O método não cria novas condições. Ele expressa novas condições. Era justo nos anos 1980 propor Diretas Já e Constituinte porque as mobilizações sociais da época já não cabiam no estreito figurino da ditadura. Propor eleições em 2016, além de apontar para algo extemporâneo, que pode desviar o esforço a ser concentrado contra o golpismo e contra a política econômica, embute o perigo de resultar em vitória da direita, mesmo sem os recursos do financiamento empresarial. (Digo isto sabendo que Luciana é contra o impeachment)”. E o autor complementa:

“Há ainda um problema legal. Dilma não tem a prerrogativa de ‘propor que as eleições municipais de 2016 se transformem em eleições gerais’. A única forma de a presidente fazer isso é renunciar ao seu mandato antes de dois anos de exercício do cargo. Mesmo assim, o que se garante é nova eleição presidencial. Na vida concreta, a medida demanda a aprovação de emenda constitucional antes do fim de 2015, algo absolutamente inviável e que dispersa esforços que devem ser voltados para as questões centrais. Do ponto de vista dos democratas, a solução agora deve ser colocar as diversas facções do conservadorismo – PSDB/PT/PMDB e agregados – na parede, com os seguintes propósitos: 1. Impedir o golpe; 2. Mudar a política econômica em favor de uma senda desenvolvimentista. Não há atalhos. A esquerda é tremendamente minoritária na sociedade. É preciso seguir adiante nas pressões e mobilizações até que se abram novas oportunidades para o avanço da democracia. Como dizia o ilustre filósofo bauruense, ‘O impossível a gente faz. Milagre demora um pouquinho mais’”.

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