Meu primeiro dia de férias. Merecido! Acordei às 10h da
manhã, nem lembrava mais o que era acordar sem o despertador tocando ao lado do
ouvido. 2015 foi um ano intenso! Muita luta, muito estudo, e felizmente muitas
viagens. Conheci muitas pessoas especiais e de luta do Brasil todo que
compartilham do Poder Para o Povo Preto.
Hoje, eu acordei contente, tinha que ir na rua comprar os presentes
de natal de meus pais. O presente do meu pai, eu ainda não sabia o que dar, mas
o da minha mãe são as tranças que eu faço. Ela me disse que queria da cor
vermelha, como eu só tinha lã preta, resolvi ir ao centro comprar.
Nos dias que estava no Rio de Janeiro em um evento, fiquei
por dois dias namorando duas camisas, uma do Malcon X e outra do Zumbi do
Palmares. Estava receoso de comprar por causa do preço. Mas fiz a dívida de 3
meses para pagá-las porque tinha certeza do empoderamente que iriam me trazer
ao andar com o rostos desses dois heróis estampados na roupa. Hoje decidi usar
a do Malcon X, e fui as compras.
Peguei meu fusca e segui em direção ao centro. Fim de semana
antes do natal, as ruas lotadas, sem local para estacionar. Foi quando me
lembrei que a loja Murano possui estacionamentos para clientes e segui até ela.
Na loja, vi uma grande variedades de linhas, comecei a olhar
e comparar preços, quando percebi um olhar diferente do segurança (branco).
Comecei a prestar atenção, e onde eu ia, ele estava lá. Foram uma, duas, cinco
vezes, até que decidi ir até o caixa e reclamar.
No caixa, eu segurando uma lã vermelha perguntei a atendente
se não teria um vermelho mais escuro, ela respondeu que não sabia que eu teria
que procurar. Fui até outro atendente e fiz a mesma pergunta e um rapaz foi
pegar o produto para mim. Aproveitei o momento e disse para eles avisaram para
o segurança não me seguir mais para não termos nenhum tipo de problema, pois eu
estava muito incomodado com ele.
Segui para outro balcão para esperar a lã, quando o
segurança me aborda bravo perguntando do porque eu avia denunciado ele para a
gerencia. Começamos um bater boca um com o outro. Eu dizendo que a loja estava
cheia, mas ele escolheu me seguir e ele dizendo que só estava fazendo o seu
serviço.
Assim que chegou meus produtos, me dirigi a fila do caixa,
quando vem o dono da loja gritando comigo dizendo que eu estava arrumando
arruaça com o segurança. Revoltado, mandei ele enfiar a lã em sua
‘’prateleira’’. Virei as costas e fui sair da loja. Porém o dono tentou me
segurar, e aí começou a confusão. Quando me dei conta um dos seguranças me deu
uma gravata enquanto o dono e mais 3 funcionários (contei 5 pessoas que
participaram) me batiam com socos e ponta pés.
O segurança que me seguiu, aproveitou que eu estava
imobilizado e socou meu estomago olhando em meus olhos. Nesse meio, alguém me
atingiu com uma escada (dessas de metal, usadas para pegar objetos em
prateleiras de lojas).
A única coisa que consegui fazer foi falar: ‘’Bate mais,
bate mais que eu to de pé ainda, seu otário!’’
Eles me jogaram para fora da loja, no estacionamento. Fui
ligar para a polícia e o segurança veio pra cima dizendo que eu não iria fazer
isso. Por sorte, um casal de clientes testemunho e me acompanhou, não
permitindo que acontecesse mais nada. Sem nunca terem me visto, eles
permaneceram do meu lado até que chegasse ajuda.
Desesperado, lembrei da Aracy Adorno Reis e da Cleuza S.
Theodoro. Consegui falar com a Brechó, chorando, e pedi ajuda. Também consegui
avisar o coletivo Yalode-Badá, que chegaram rápido no local.
Porém, os primeiros a chegarem foram a PM. Começaram a fazer
o B.O. perguntando o que havia acontecido. Eu disse que houve injuria racial
seguido de agressão física, e a resposta que tive da boca do PM é que isso é
coisa da minha cabeça. Nesse momento fiquei sem chão e desabei em choro. Eu
tinha acabado de ser suspeito de roubo, apanhado por isso e a PM disse que era
coisa da minha cabeça.
Por fim, chegaram ao local a Aracy e filha, Margot Jung, e
me acalmaram. Em seguida o pessoal do coletivo chegou, e mais pessoas do
movimento negro. Nesse meio, eu contei uns 3 advogados que foram para ajudar.
Não lembro de todas as pessoas que estavam em meu apoio agora, pois eu não
estava bem. Depois, com calma, vou procurar cada um que prestou sua
solidariedade e forneceu ajuda nesse momento. A imprensa chegou ao local,
fizeram uma gravação. Mas eu não confio na globo.
No momento em que eu estava imobilizado e apanhando, eu só
lembrava do vídeo de um menino que apanhou dos manifestantes pro-impeachment
essa semana, e do jovem negro que foi amarrado e espancado até a morte por
suspeita de roubo. Aqui, eu era eles. Eu era mais um de milhares de jovens
negros que são vítimas de racismo, apanham e morrem todos os dias. Eu apanhei,
por ser negro, com a camisa do Malcon X.
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