As chuvas estão cada vez mais intensas. Os temporais se
avolumam, felizmente sem muito vento. Faz até um tempo mais fresco e agradável.
No interior de Goiás, quando esse tempo começava, o pessoal dizia, com o acento
característico: “invernô baum”.
O solo ainda não está encharcado, e as frutas “da água”
começam a dar suas flores: nosso pé de acerola já começou a dar umas florzinhas
tímidas e azuladas. Os passarinhos felizes saem a procurar alimento. Pardais
vasculham a grama a procura de minhocas.
Os insetos zunem felizes com o calor e a umidade. Ficamos
preocupados com os mosquitos: já houve um caso de chukungunha no bairro. Potes,
vasos e utensílios domésticos devem ser virados pra baixo, pra não deixar a
agua acumular.
De todos os animais do jardim, os mais felizes, entretanto,
são os vermes da composteira. Cada vez que vou jogar alguma coisa por lá eu vejo
que eles aumentaram em quantidade. Eles vivem numa superabundância. O calor, a
umidade e a oferta contínua de alimento fazem vermes gordos e felizes. Restos
de mangas e coisas moles e doces são as primeiras coisas a serem atacadas. É
uma comilança feliz.
Estes dias, ao voltar da composteira, pensei nos projetos do
governo golpista. O paralelo é claro. Estamos num momento em que tudo é feito
com a maior desfaçatez. Milhões são aprovados em renúncias fiscais, em
liberação de verbas parlamentares, em distribuição de cargos. Tudo em
superabundância, como os vermes da composteira.
Nós, do outro lado, estamos em contenção de despesas,
contingenciamento, penúria e escassez. Sem falar dos milhões de desempregados.
A chuva e o calor ainda não chegaram.
Os vermes felizes e protegidos. Semana passada, ao tomar
posse, o superintendente da Policia Federal fez um discurso obsceno sobre malas
e provas. Mas ninguém prestou atenção. No máximo, umas figurinhas de “grr” no
facebook.
Índios e pequenos posseiros continuam ameaçados por
grileiros e capangas dos fazendeiros. Não há mais proteção, não há mais pudor.
O sangue escorre dos grotões.
Nas cidades, pipocam aqui e ali os projetos da grife “Escola
sem partido”. Com o discurso da moralidade, a censura ameaça as escolas e os professores.
Só falta começar abertamente a caça às bruxas.
Faz calor, o mormaço se instala. O ar fica mais “pesado”, os
insetos se agitam. O céu escurece. Vai chover. Os vermes, felizes, prosseguem
sua faina de comer e comer e comer.
Parece que nada detém os vermes. As pessoas que diziam
combater a corrupção estão felizes. O governo popular que os incomodava está
por ora afastado. Os deputados e o presidente golpista estão perto de cercear a
Policia Federal: uma mala cheia de dinheiro não prova nada.
Os tais dos meninos liberais estão assumindo sua cara de
ogro e provando que o liberalismo brasileiro não é tão liberal assim. Os
liberais de 64 aplaudiram a deposição de João Goulart, assim como os liberais
da República Velha eram coronéis mandões e os do império não se opuseram a
principio contra a escravidão. A perseguição moralista e censuradora que os
jovens liberais fazem aos artistas e à liberdade artística está de acordo com
as ideias autoritárias dos que querem a volta do autoritarismo militar. Tudo certo.
Os vermes continuam. A “suruba” dos vermes não para.
A primavera se desmancha em calor e umidade. Nuvens negras
passeiam livremente pelo céu. Céu roxo, cinza chumbo, como diria o poeta. O
pais assiste mudo à catástrofe que se aproxima.
Vamos permitir?
Os vermes – e só os vermes – estão felizes.
Via - Urublues
Nenhum comentário:
Postar um comentário