segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Cogumelos alucinógenos 'reiniciam' cérebro de pacientes com depressão

Pesquisadores da Imperial College London usaram a substância para tratar um pequeno número de pacientes que não respondiam aos métodos convencionais, e os resultados surpreenderam.

Reportagem de O Globo

Composto alucinógeno presente em cogumelos pode ajudar no tratamento da depressão Foto: PIXABAY

A psilocibina, composto psicoativo presente naturalmente nos cogumelos alucinógenos, pode auxiliar no tratamento da depressão, sugere um estudo publicado nesta sexta-feira na revista “Scientific Reports”. Pesquisadores da Imperial College London usaram a substância para tratar um pequeno número de pacientes que não respondiam aos métodos convencionais, e os resultados surpreenderam: os benefícios duraram até cinco semanas, aparentemente porque o composto “reiniciou” a atividade de circuitos cerebrais relacionados com a doença.

Comparações das imagens cerebrais dos pacientes antes e um dia após o tratamento com o alucinógeno revelaram mudanças na atividade cerebral associadas com reduções marcantes dos sintomas depressivos. Carhart-Harris ressalta que os resultados são iniciais, limitados a um pequeno grupo de pacientes que não responderam a outros tratamentos, e não há um modelo de controle. Mesmo assim, os resultados da terapia experimental são surpreendentes.

— Nós demonstramos pela primeira vez mudanças claras na atividade cerebral de pessoas com depressão tratadas com psilocibina — explicou o líder da pesquisa, Robin Carhart-Harris. — Muitos dos nossos pacientes disseram se sentir “resetados” após o tratamento, usando analogias dos computadores. Por exemplo, um disse sentir como se o cérebro tivesse sido “desfragmentado” como um disco rígido, e outro disse se sentir “reinicializado”. A psilocibina talvez esteja dando a esses indivíduos o pontapé inicial que precisam para se livrarem do estado depressivo.

Ao longo das últimas décadas, vários testes clínicos foram conduzidos para determinação da segurança e efetividade dos psicodélicos em pacientes com problemas psicológicos. O estudo da Imperial College London é o primeiro a tentar tratar a depressão com o princípio ativo dos cogumelos alucinógenos, conhecidos popularmente como cogumelos mágicos.

Os 20 pacientes que não demonstraram evoluções com tratamentos convencionais receberam duas doses de psilocibina, sendo a primeira de 10 miligramas e a segunda mais forte, com 25 miligramas. O intervalo entre as doses foi de uma semana. 19 dos participantes realizaram exames de imagem no cérebro antes de receberem o composto e um dia após a segunda dose. Os pesquisadores mediram alterações no fluxo sanguíneo e na comunicação entre diferentes regiões cerebrais. Questionários avaliaram os sintomas apresentados pelos pacientes.

Imediatamente após o início do tratamento, pacientes relataram uma redução nos sintomas depressivos, o que corresponde a relatos anedóticos sobre o “brilho”, efeito caracterizado por melhorias no humor e alívio no estresse. Mas os exames de imagem revelaram redução do fluxo de sangue em determinadas áreas do cérebro, incluindo as amídalas cerebelosas, conhecidas pela relação com as respostas emocionais, o estresse e o medo. Também foi observado o aumento da estabilidade em algumas redes cerebrais.

A descoberta fornece uma nova visão sobre o que acontece no cérebro das pessoas após elas “retornarem” de uma viagem psicodélica, com uma desintegração inicial das redes neurais durante o uso dos alucinógenos, seguida pela reintegração.

— Pode ser que os psicodélicos realmente “reiniciem” as redes cerebrais associadas com a depressão, permitindo efetivamente que os pacientes se libertem do estado depressivo — sugeriu Carhart-Harris.

Contudo, os pesquisadores alertam que os resultados não são conclusivos, e pacientes com depressão não devem tentar a automedicação, já que a equipe de pesquisas fornece um contexto terapêutico seguro à experiência psicodélica. Um novo experimento, comparando a psilocibina com medicamentos antidepressivos, será iniciado ano que vem.

— Estudos maiores são necessários para ver se esses efeitos positivos podem ser reproduzidos em mais pacientes — alertou David Nutt, coautor da pesquisa. — Mas os resultados iniciais são excitantes e fornecem um novo caminho terapêutico a ser explorado.

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