sexta-feira, 28 de junho de 2019

Por que a Rússia enviou mais um avião militar para a Venezuela?

Especialista militar e assessor do Conselho de Defesa da Presidência da Venezuela explica a parceria entre os países.

Governo russo confirma presença de avião e militares na Venezuela / Foto: Hispantv
Fania Rodrigues
Brasil de Fato

Um avião da Força Aérea da Rússia pousou no aeroporto internacional Simón Bolívar, em Maiquetía, na grande Caracas, na última segunda-feira (24). O Ministério de Relações Exteriores da Rússia confirmou a informação, na terça-feira (25), por meio de um comunicado do vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergey Ryabkov. À bordo do avião estava um grupo de técnicos para a manutenção de equipamentos militares fornecidos anteriormente ao país.

Segundo Ryabkov, os especialistas "continuarão trabalhando na manutenção dos equipamentos fornecidos à Venezuela no marco dos contratos de cooperação técnico-militar". Ele enfatizou ainda que a cooperação entre a Venezuela e a Rússia é transparente e não representa uma ameaça à segurança regional.

Essa é a segunda vez que um avião russo pousa em território venezuelano neste ano. Em março, dois aviões chegaram à Venezuela com equipamentos de alta tecnologia e cerca de 100 militares especializados, para cumprir com os acordos de cooperação técnico-militares entre os dois países.

O convênio entre a Rússia e a Venezuela é extenso e inclui assistência técnica, fornecimento de armas, equipamentos e tecnologia militar de última geração, explica o assessor do Conselho de Defesa da Presidência da República da Venezuela, Juan Eduardo Romero, cientista político e doutor em História. Segundo ele, a chegada do avião russo à Venezuela faz parte da rotina de assistência técnica prevista por esse convênio. “Faz parte de uma relação que vem avançando", diz.

“A parceria russo-venezuelana, em termos estratégicos e militares, abarca um conjunto de tecnologias militares. Entre os equipamentos fornecidos pela Rússia estão os fuzis Kalashnikov (AK47), aviões-caça Sukhoi, sistemas de radares S-300, os laçadores de mísseis terra-ar", afirma.

O convênio, iniciado por Hugo Chávez, em 2003, visava fortalecer a proteção contra as ameaças do Plano Colômbia, levado adiante pelos EUA, que implicou no aumento do armamento no país vizinho.

Conflito de interesses

A aproximação entre a Rússia e a Venezuela nos últimos meses têm gerado incômodos ao governo dos Estados Unidos. O secretário de Estado Mike Pompeo e o presidente Donald Trump já criticaram publicamente a presença dos russos. Recentemente o senador Rick Scott, do estado da Florida, classificou o envio desse último avião russo como uma “má decisão” e acrescentou: “A Rússia deve prestar atenção às nossas advertências”.

Segundo o assessor do Conselho de Defesa da Venezuela, o convênio entre a Venezuela e a Rússia incomoda aos Estados Unidos muito mais que os convênios com outros países não-alinhados. E explica: “A disputa histórica dos EUA tem sido mais com a Rússia do que com a China, Turquia e Irã. No caso particular desse acordo com a Rússia, ele é centrado na área militar, setor em que a competição entre as duas potências é muito maior”.

Além disso, a tecnologia utilizada pela Rússia tem se mostrado superior em alguns aspectos, afirma o especialista militar. “A tecnologia russa em relação aos aviões de quinta geração tem maior capacidade de combate. Os aviões Sukhoi que a Venezuela possui tem um teto superior a 24 mil pés (7.300m), muito acima dos aviões F-15 e F-16, que os EUA utilizam como principal frota de combate. Adicionalmente a isso, o sistema de radar russo mostrou eficiência contra os voos de drones que os EUA estão utilizando. E no combate corpo a corpo, os fuzis AK-47 demonstraram sua versatilidade e maior resistência que os fuzis utilizados pelos estadunidenses. Tudo isso é uma preocupação para os EUA”, analisa Romero.

Por essas razões, os EUA enxergam o convênio entre a Venezuela e a Rússia com maus-olhos. “Isso tem a ver com a preocupação do Departamento de Estado do país norte-americano, de que os acordos entre a Rússia e a Venezuela escalem a um nível que resulte em exercícios militares conjuntos. Isso para os EUA é uma ameaça a seus interesses estratégicos na região, muito mais que Cuba”, diz.

Ele também ressalta que a tecnologia russa fornecida à Venezuela elevou a capacidade de dissuasão da Força Armada Nacional Bolivariana em relação aos países vizinhos, especialmente com a Colômbia e as ilhas caribenhas, que possuem tecnologia dos Estados Unidos.

O assessor do Conselho de Defesa venezuelano afirma ainda que a tendência é que a parceria entre a Rússia e a Venezuela seja ampliada, caso as ameaças dos EUA de intervenção militar contra a Venezuela continuem.

Intervenção militar

O responsável pelos assuntos da Venezuela no governo Trump, Elliott Abrams deu uma entrevista coletiva na sede do Departamento de Estado dos Estados Unidos, nesta terça-feira (25), e falou sobre o apoio da Rússia à Venezuela.

"Chegou um novo avião da Rússia na Venezuela. Segundo eles, é para reparar o sistema de armamento vendido anteriormente. O que sabemos, com certeza, é que esse avião não levava ajuda humanitária. Enquanto isso o Usns Comfort (navio médico militar dos EUA) está viajando pelo Mar do Caribe levando ajuda para os venezuelanos e a Rússia continua levando mais técnicos-militares", apontou.

Encarregado dos EUA para a Venezuela critica presença de avião militar russo | Foto: AFP
Abrams disse que os Estados Unidos “continuarão apoiando o líder opositor Juan Guaidó”, mas que ele deve deixar de pedir intervenção militar dos Estados Unidos, pois essa decisão não depende de um pedido da oposição venezuelana.

"[Uma intervenção militar] não depende de estrangeiros ou de um congresso de nações fora dos EUA. Essa é uma decisão [de entrar na guerra] tomada apenas pelo presidente dos Estados Unidos, quando ele decide que nossa segurança nacional está em risco", reforçou Abrams, que disse acreditar em solução pacífica para a Venezuela.

Edição: Pedro Ribeiro Nogueira


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