quinta-feira, 23 de abril de 2020

Há 10 anos, Zé Maria do Tomé era assassinado no Ceará por luta contra agrotóxicos

O agricultor, que lutou contra a pulverização aérea na Chapada do Apodi, inspira luta contra envenenamento no estado.

Cruzeiro marca o local do assassinato de Zé Maria - Camila Garcia
Francisco Barbosa
Brasil de Fato | Fortaleza (CE)

No dia 21 de abril de 2020, completaram 10 anos da morte de José Maria Filho, mais conhecido como Zé Maria do Tomé, assassinado com mais de 20 tiros a queima-roupa. O crime ocorreu próximo a casa dele, na comunidade de Tomé, em Limoeiro do Norte, no Ceará.

Zé Maria destacou-se na luta contra a pulverização aérea de agrotóxicos na Chapada do Apodi, no Ceará. Ele fez denúncias sobre as consequências do uso de agrotóxicos, promovendo debates com foco na saúde das comunidades que vivem na chapada e enfrentando diretamente grandes empresas do agronegócio.

No dia 20 de novembro de 2009, a Câmara Municipal de Limoeiro do Norte promulgou a Lei 1.278 que proibia a pulverização aérea no município, resultado da luta das comunidades, juntamente com organizações, pesquisadores, movimentos populares e apoiadores. Um mês após o assassinato de Zé Maria, no entanto, no dia 20 de maio de 2010, a lei foi revogada.

De acordo com Renato Pessoa, acampado e membro da direção estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Ceará, a importância da luta de Zé Maria é o fato de ele ter se tornado uma referência que une as lutas gerais dos movimentos sociais locais, regionais e estaduais.

“Hoje, a comunidade do Tomé faz um consumo cuidadoso da água potável. Há união de movimentos e apoiadores que seguem sua luta com as mais diversas pautas, seja a terra, água e alimentação saudável. O estado do Ceará também vê a importância dele com a aprovação da Semana Zé Maria do Tomé, que entrou no calendário do estado, e a lei contra a pulverização aérea que repercute além das fronteiras”.

Para Pessoa, o legado deixado por Zé Maria é “a luta contra a pulverização aérea, contra o veneno em contato com a população, o cuidado com a água consumida, os impactos com a saúde humana, a defesa da terra para pequenos agricultores e do associativismo”.

Ele lembra com orgulho das diversas homenagens ao agricultor. “A importância de termos uma Escola Família Agrícola (EFA), que leva o nome de Zé Maria do Tomé, em Tabuleiro do Norte; as turmas de cursos formais e informais que homenagearam o Zé Maria; o M21, movimento regional; e a nossa comunidade de resistência, o Acampamento Zé Maria do Tomé, do MST.”

Homenagem

Para lembrar a data do assassinato, anualmente, movimentos do campo, movimento sindical e defensores do direito à terra e à água organizam a Semana Zé Maria do Tomé. Este ano, em razão dos casos de coronavírus no Brasil e, principalmente, no estado, a realização da 10ª Semana Zé Maria do Tomé foi adiada, seguindo as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS).

Outro resultado dessa luta foi a publicação, no Ceará, em 9 de janeiro de 2019, da Lei Estadual nº 16.820/2019, chamada de “Lei Zé Maria do Tomé”, de autoria do deputado estadual Renato Roseno (PSOL/CE), a qual proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos no estado.

Continuidade da luta

Em 2014, foi criado o acampamento Zé Maria do Tomé, em Limoeiro do Norte, na Chapada do Apodi. A área está dentro do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi, que foi implantado no final dos anos 1980. De acordo com o MST, para a formação do perímetro, “ocorreu a expropriação, expulsão e desmantelamento da produção de cerca de 6 mil famílias da região, que antes produziam alimentos e mantinham relações de identidade com o território”.

Após vários anos de luta por terra para produzir e garantir o sustento das famílias, os agricultores ocuparam o local e reivindicam a área explorada por empresas que faziam uso abusivo de agrotóxicos.

De forma recorrente, as famílias do acampamento sofrem ameaças de reintegração de posse da área. Em 2018, por exemplo, elas foram cercadas pela Polícia Militar que estava no local para cumprir uma ordem judicial de despejo. Na ocasião, houve negociação entre lideranças do assentamento e os policiais e foi acertada a suspensão da ação.

Renato Pessoa afirma que há um processo de reintegração de posse "adormecido" sujeito a despertar e trazer mais repressão na tentativa de expulsar as famílias. “Nosso acampamento tem se mantido de pé graças à resistência e à força política do MST. A região tem grande apoio das igrejas, professores e movimentos e se destaca o Movimento 21 criado em homenagem ao Zé Maria.”

Fonte: BdF Ceará
Edição: Camila Maciel e Monyse Ravena

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