sexta-feira, 24 de março de 2023

Esticando a Baladeira

 


Eu já senti todos os medos, eu já gozei de todo jeito, eu já morri no fim da história, eu já furei corações com salto fino, eu já toquei todos os corpos, eu já sangrei por todos os cortes, eu já conheço todos os gostos, eu já bebi todos os venenos. Eu já beijei todas as bocas. Eu vi o filme da Binoche. Eu sobrevivi.

Ela não disse nada disso, claro, esticou o braço, ofereceu a mão, um lado do rosto, roçou com os lábios o rosto dele, muito prazer.

Eu já joguei tudo fora e tomei banho esfregando a pele com lixa pra apagar qualquer memória. Eu já tranquei a porta, saí da cidade, chamei a polícia, pra não ser mais uma história. Eu já teci mantas para filhos que nunca gestei e abortei cada palavra gentil que pensei dizer.

Sentou na cadeira que ele puxou, tragou o cigarro que ele acendeu, bebeu a cerveja que ele serviu. Sorriu.

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