quarta-feira, 9 de março de 2016

O machismo incrustado na classe média

Nos últimos tempos, tenho me dedicado a uma pesquisa especial. Sondar, sutilmente, como são (ou eram) as relações pessoais em casamentos de mulheres bem-sucedidas.


Por Luis Nassif

Uma amiga antiga já tinha me falado do pequeno inferno diuturno em casa. Ambos trabalhando, ambos atarefados, a mulher começa a voar. A reação do marido é criar o pequeno inferno doméstico, usando o álibi dos pecadilhos diários, ridículos – um esquecimento, um móvel fora do lugar, um compromisso não agendado – para exercer o mando.

Não acontecera apenas com ela, mas praticamente com todo o universo de amigas, igualmente bem-sucedidas.

Extrapolei a pesquisa para mulheres de outros campos profissionais. Uma delas profissional liberal, viúva há 4 anos, de um casamento feliz. O marido era IBM. Descrevi de imediato o dia-a-dia caseiro: ele se incomodava com qualquer detalhe fora do lugar para encontrar motivo para implicar.

Ela arregalou os olhos e indagou surpresa:

- Como você sabe?

Pedi desculpas pela intromissão, afinal estava ali apenas para um tratamento ortodôntico, de um maxilar travado pelas tensões da Lava Jato.

Desde cedo tentei passar para minhas meninas os riscos dessa armadilha, de mulheres brilhantes sendo boicotadas em casa por esses pequenos e traiçoeiros movimentos de poder.

Minha homenagem à doce feminista formada por esse trabalho de três gerações familiares em defesa da igualdade para as mulheres, a Dora.

Dia desses, fui surpreendido entrando no seu Facebook e me deparando com um manifesto dela, em favor dos shortinhos do seu colégio. Não pelo tema em si, mas pela clareza dos argumentos, pela maneira como deslindou uma dessas armadilhas culturais do dia-a-dia, que muitas vezes passam despercebidas.

O manifesto recebeu mil assinaturas, o movimento teve a adesão de 220 colegas. Aparentemente tornou-se vitorioso.

Liberdade aos shortinhos

Destinatário: Direção do Colégio

Nós, alunas do Colégio ..., viemos por meio desse abaixo-assinado reivindicar nossos direitos de liberdade de escolha e expressão, para enfim conseguirmos acabar com as restrições direcionadas somente às mulheres dessa escola, em relação as suas vestimentas. Enquanto os meninos têm a liberdade de usar o que querem, nós somos retiradas da sala de aula para levar sermão, e sermos obrigadas a comprar uma calça, a qual nem todas têm condições de pagar, e sofrer em silêncio com o calor do verão. A justificativa da direção pra isso, é que eles se preocupam com nós e, esses shorts atraem olhares masculinos. É claro que, para eles, é bem mais sensato nos fazer passar calor, do que culpar os meninos que não querem controlar seus hormônios, nem quando estamos usando calças. Porque convenhamos, não é por causa do shorts que eles não nos respeitam, a mesma coisa aconteceria usando calças. Então, alunas, pais e ex-alunas, pedimos o apoio de vocês para acabar com as regras injustas impostas sobre nós.


PS - Perdão aos colegas do G1. O sobrenome não entrou a pedido da mãe.

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