Os fetiches em geral não são novidades de nossa época e estiveram
sempre presentes no comportamento humano.
Pés de Tamires Monção Berger |
Até mesmo na bíblia encontramos a fascinação por estas extremidades dos corpos femininos, em cânticos dos cânticos 7 – 1 num culto à beleza feminina, lemos: “Ó filha de um príncipe, como são bonitos os seus pés calçados de sandálias”!....
Tamanho fascínio esteve também presente nos contos de fada, a história da Cinderela é na verdade um exemplo de lascívia que pés ou mãos femininas causavam em homens de diferentes tempos.
Este fetichismo explicitou-se com maior intensidade no século XIX, apesar
do clima de sexualidade austera e reprimida que os manuais de comportamento
ditavam em especial para as mulheres da época. Naquele mundo de corpos
cobertos, mãos e pés assumiam um papel afrodisíaco. Para melhor explicar essa
situação naquele século, nos embasamos em um trecho do livro “Histórias de Amor
no Brasil, de autoria de Mary Del Priore – Uma historiadora bastante indicada
para os que estudam o Brasil oitocentista”. Vamos ao trecho:
“Se quase todos procuravam melhorar ou se enfeitar para
casar, não faltavam na época critérios de beleza. Partes do corpo, sexualmente
atrativas, designavam, entre tantas jovens casadoiras, as mais desejadas. Esses
verdadeiros lugares de desejo, para não dizer de obsessão dos leões, gaviões ou
gamenhos, atualmente não fazem o menor sucesso.
Do corpo inteiramente coberto da mulher o que sobrava eram
as extremidades. Mãos e pés eram os que mais atraíam olhares e atenções
masculinas. Grandes romances do século XIX, como A Pata da Gazela ou A Mão e a
Luva revelam, em metáforas, o caráter erótico dessas partes do corpo. Mãos
tinham de ser longas e possuidoras de dedos finos acabando em unhas
arredondadas e transparentes.
Vejamos José de Alencar descrevendo uma de suas personagens,
a Emília: “Na contradança as pontas de seus dedos afilados, sempre calçados nas
luvas, apenas roçavam a palma do cavalheiro; o mesmo era quando aceitava o
braço de alguém.” Não apenas os dedos eram alvo de interesse, mas seu toque ou
os gestos daí derivados revelavam a pudicícia de uma mulher. O ideal é que
estivessem, sempre, no limite do nojo ou da repugnância por qualquer contato
físico.
Pequenos, os pés tinham de ser finos, terminando em ponta; a
ponta era a linha de mais alta tensão sensual. Faire petit pied era uma
exigência nos salões franceses; as carnes e os ossos dobrados e amoldados às
dimensões do sapato deviam revelar a pertença a um determinado grupo social,
grupo no interior do qual as mulheres pouco saíam, pouco caminhavam e,
portanto, pouco tinham em comum com as escravas ou trabalhadoras do campo ou da
cidade, donas de pés grandes e largos.
Os pés pequenos, finos e de boa curvatura, modelados pela
vida de ócio, eram emblemas de “uma raça”, expressão anatômica do sangue puro,
sem manda de raça infecta, como se dizia no século XVIII. Circunscrita,
cuidadosamente embrulhada no tecido do sapato, essa região significou, muitas
vezes, o primeiro passo na conquista amorosa. Enquanto o príncipe do conto de
fadas europeu curvava-se ao sapatinho de cristal da Borralheira, entre nós os
namoros começavam por uma “pisadela”, forma de pressionar ou de deixar marcas
em em lugar tão ambicionado pelos homens.
Tirar gentilmente o chinelo ou descalçar a mule era o início de um
ritual no qual o sedutor podia ter uma vista do longo percurso a conquistar.
Conquista que tinha seu ponto alto na “bolina dos pés”, afagos que se trocavam
nessa zona altamente sensível”.
DEL PRIORE, Mary. História do Amor no Brasil. São Paulo:
Contexto, 2006. p 153-154.
Estes pés são lindos
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