A seleção senegalesa tem sido tema de notícias e discussões
nesta Copa do Mundo. Mas em vez de tática, vigor físico, gols de placa ou
caneladas, o que chamou a atenção no escrete africano foi a presença do técnico
Aliou Cissé, o único negro entre os 32 participantes no torneio.
Aliou Cissé, técnico do Senegal na Copa da Rússia. Foto: Wikimedia Common |
Por *Marcos Sacramento
No DCM
O predomínio de treinadores brancos à frente dos times de
futebol, inclusive de seleções da África negra, é um fato concreto. Dos 20
clubes que disputam a primeira divisão do campeonato brasileiro de futebol
deste ano, apenas Roger Machado, do Palmeiras, e Jair Ventura, no comando do
Santos, são negros.
Isso leva ao seguinte questionamento: por que há poucos
técnicos negros em um esporte em que eles têm presença expressiva entre os
atletas?
As razões não são muito explícitas. Uma matéria do The
Guardian abordou o assunto em 2014, e se não chegou a uma conclusão, pelo menos
jogou alguma luz em busca de respostas para a pergunta.
De acordo com o Guardian, naquele ano havia somente quatro
técnicos negros ou representantes de minorias étnicas entre os 92 clubes da
Premier League e da Football League, que englobam as quatro primeiras divisões
do futebol inglês. O número significa menos de 5% do total. Por outro lado,
entre os jogadores a presença de negros fica na casa dos 25%.
A matéria cita um estudo do pesquisador Steven Bradbury, que
se debruçou sobre o tema. Uma das hipóteses que ele levanta é que o filtro
racial começa ainda dentro dos campos, pelo menos nos casos dos técnicos que
foram ex-jogadores. Dentre os treinadores que começaram a carreira como
atletas, um bom número deles ostentou a braçadeira de capitão, posto de
liderança e interlocução com a comissão técnica.
E este status, segundo Bradbury, é dado com mais frequência
aos jogadores brancos, reproduzindo o estereótipo de que estes seriam mais
cerebrais, em oposição aos negros, cujo destaque seria o vigor físico.
Por aqui, um dos exemplos mais emblemáticos deste fenômeno é
Andrade, único técnico negro a conquistar o campeonato brasileiro de futebol,
em 2009, pelo Flamengo. Mesmo com o título e o histórico no clube – volante
clássico, com passes elegantes e precisos, é um dos heróis do clube rubro-negro
– foi demitido no ano seguinte à conquista do título, apesar do índice de 76%
de aproveitamento.
Seguiu treinando times de menor expressão, como Brasiliense
e Paysandu, até decidir dar um tempo na profissão de técnico. Junto com
Cristóvão Borges, ex-jogador e técnico com passagens por Fluminense e Vasco, e
Lula Pereira, que treinou o Flamengo, engrossa a galeria de técnicos negros
atualmente sem emprego.
Pode ser que futuramente eles voltem a atuar, e somados à
entrada de novos nomes no mercado, como Roger Machado e Jair Ventura,
contribuam para que as estatísticas raciais referentes aos treinadores se
aproximem da realidade de dentro dos gramados.
Mas considerando que o futebol é gerenciado por homens
brancos e que o posto de técnico, embora instável, seja um espaço privilegiado
de poder, não dá para ter esperança de mudanças radicais neste cenário.
Caso existam, os avanços virão de forma lenta, gradual e
segura, bem ao gosto dos atuais donos do poder.
*Marcos Sacramento, capixaba de Vitória, é jornalista.
Goleiro mediano no tempo da faculdade, só piorou desde então. Orgulha-se de não
saber bater pandeiro nem palmas para programas de TV ruins.
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