quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Câmara aprova proposta para dificultar aborto às vítimas de estupro

Uma mulher estuprada deve ser submetida a exame de corpo de delito.

O objetivo do projeto, que modifica a Lei de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual, é dificultar o aborto às mulheres que sofreram estupro
Por Márcia Xavier

O anúncio de meios ou métodos abortivos se torna crime, com agravamento de pena para profissionais de saúde, que podem chegar a ser detidos por um a três anos. É o que determina o projeto de lei do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) aprovado, por 37 votos a favor e 14 contra, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, nesta quarta-feira (21).

O objetivo do projeto, que modifica a Lei de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual, é dificultar o aborto às mulheres que sofreram estupro.

“Nós viemos aqui para defender a vida; punir quem de forma covarde faz anúncio ou induz alguém a fazer aborto é uma medida justa para coibir esse crime”, disse o relator da proposta, deputado Evandro Gussi (PV-SP), sobre o direito garantido por lei à mulher que for estuprada de fazer o aborto.

As declarações do deputado provocaram grande polêmica entre os parlamentares. Eles discutiram, por exemplo, se o profissional de saúde deve ou não dar informações à vítima sobre seu direito ao aborto.

A CCJ decidiu manter o direito à informação, mas introduziu a obrigatoriedade de registro de ocorrência e fazer um exame de corpo de delito, além de tornar crime o que hoje é uma contravenção, ou seja pune como crime quem induz, instiga ou auxilia em um aborto.

A líder do PCdoB na Câmara, deputada Jandira Feghali (RJ), avalia que “há um conceito moralista e religioso nessa proibição. O direito legal ao aborto é garantido desde a década de 1940 e retroceder para antes disso é um absurdo diante de todos os avanços dados na saúde mundial”, destacando que “o projeto caminha na criminalização de muitos atendimentos de saúde previstos em lei”.

Resistência

Gussi mudou o relatório para diminuir a resistência ao texto, mas ainda houve bastante polêmica. Ele voltou atrás e deixou na lei a expressão de que as mulheres devem conhecer seus direitos ao serem atendidas no serviço de saúde.

Ele argumentava que o direito à informação não precisa estar em nenhuma lei, pois já é garantido, mas a bancada feminina contestou essa tese e disse que é importante que as vítimas saibam sobre seu direito à pílula do dia seguinte e ao aborto caso o estupro resulte em gravidez.

O relator também introduziu um artigo estabelecendo que nenhum profissional de saúde ou instituição pode ser obrigado a administrar procedimento ou medicamento que considere abortivo.

Após a aprovação do texto, três destaques tentaram modificar a proposta. A maior preocupação é em colocar entre as obrigações do serviço de saúde o encaminhamento obrigatório das vítimas a uma delegacia e ao exame de corpo de delito.

Para a deputada Maria do Rosário (PT-RS), o problema é que toda a proposta está escrita de forma que não é possível saber as reais consequências do texto. “Eu gostaria de ter certeza de que a mulher vai ser atendida pelo serviço de saúde, e não numa delegacia, porque é isso que preconizam todos os especialistas. Devemos votar essa proposta pensando nas vítimas”, enfatizou.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) lembrou que a proposta também modifica o entendimento do que é violência sexual e estupro, para os efeitos da lei de atendimento às vítimas. Na lei, está expresso que violência é qualquer ato não consentido, mas a proposta delimita esse conceito ao que está definido no Código Penal, que é “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal”.

“Isso quer dizer que o entendimento hoje é de que a palavra da mulher vale, e é importante dizer que o atendimento deve acolher essas mulheres, e não desconfiar delas”, defendeu a parlamentar.

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