Um projeto em tramitação no Congresso Nacional, de autoria
do senador José Serra (PSDB/SP), com apoio do governo interino, prevê a
possibilidade de ampliação da presença de empresas estrangeiras na exploração
do petróleo do Pré-Sal. Os depósitos de óleo ali existentes, pelo que já se
conhece, coloca o Brasil entre os três maiores produtores mundiais.
O senador, pré-candidato à Presidência da República nas
próximas eleições, ocupa o cargo de ministro das Relações Exteriores no governo
interino de Michel Temer. No comando do Itamaraty, participa de fóruns
internacionais que tratam dessa questão.
Voltamos, assim, a uma situação parecida com aquela que
antecedeu a criação da Petrobrás, em 1953. Dizia-se, então, que nosso subsolo
não tinha petróleo, por isso não haveria por que criar uma empresa estatal com
a finalidade de tratar dessa riqueza natural. Mas o tempo provou o contrário.
A empresa cresceu e desenvolveu tecnologia própria, a ponto
de se tornar um exemplo ao mundo todo. Encontrou petróleo em vários tipos de
terrenos mais superficiais, como no Oriente Médio, e em águas profundas, como
no Mar do Norte, as grandes reservas inglesas. E agora foi além, em terra firme
de novo, só que muito abaixo do próprio oceano.
Em todas essas fases, boa parte das elites e a grande mídia
tupiniquim se alinharam às empresas petrolíferas estrangeiras que detêm o
controle do setor em nível global. Juravam de pés juntos que buscar petróleo
abaixo da camada de sal, 7km abaixo do fundo do mar, seria uma aventura de
sonhadores, fadada ao fracasso.
Durante os governos de FHC, essas pressões forçaram grande
redução nos investimentos em pesquisas por parte da Petrobrás. Entretanto, a
partir de 2003, já no primeiro governo do antão presidente Lula, o dinheiro
reapareceu, as prospecções da empresa foram retomadas e deram no que se previa,
pois lá estão as enormes reservas do Pré-Sal. Um grande desafio enfrentado e
vencido pela engenharia nacional.
No atual momento histórico, ocorre uma acentuada queda nos
preços internacionais do petróleo, o que reduz a rentabilidade de projetos como
este brasileiro, que requerem grandes investimentos, e afeta a economia de
países que dependem das exportações do ouro negro, como a Venezuela.
Contudo, essa queda nos preços é apontada por especialistas
nesse mercado como manobra de grandes empresas do ramo e alguns países
produtores, em especial o maior deles, a Arábia Saudita. Em 2008, o preço do
barril no mercado internacional ultrapassou os US$ 140. Hoje, está em torno de
US$ 50.
No caso brasileiro, esta seria mais uma faceta da implacável
campanha que se faz contra a Petrobrás, a ponto de parte da mídia propagar a
visão de que ela esteja em situação pré-falimentar. As ações já movidas contra
a empresa, inclusive com paralização de atividades, têm provocado número
elevado de demissões, o que reforça essa imagem, mas as dispensas não paralisam
suas atividades essenciais.
Lava Jato
É inegável que denúncias levantadas pela operação Lava Jato
envolvem de fato alguns funcionários da Petrobrás. São, contudo, ações de
corruptos que existem em praticamente todas as empresas e entidades públicas e
mesmo privadas. O que sobressai neste caso é o impressionante destaque que se
dá a uma empresa específica, a Petrobrás, justamente num momento histórico em que
ela dá o gigantesco salto da descoberta do Pré-Sal.
Mais do que encontrar o precioso líquido em tamanha
profundidade, a própria estatal e um grande número de indústrias nacionais
comprovaram ter capacidade de prospectar e explorar essa riqueza, num processo
que envolve tecnologia de ponta. Fica visível ao mais leigo olhar que, a
pretexto de combater a corrupção, há uma nova articulação pra retirar de mãos
brasileiras o petróleo que é do Brasil. Uma ação recorrente, com cerca de um
século de existência.
A política de exploração e produção de hidrocarbonetos
(petróleo, gás, nafta etc.) no Brasil, compete à União. Esta, pela legislação
em vigor, segue as orientações do Conselho Nacional de Política Energética
(CNPE). O Ministério das Minas e Energia participa das decisões tomadas e as
executa, tendo a Agência Nacional de Petróleo (CNP) como órgão que elabora e
supervisiona os contratos de partilha.
A Lei 12.351, conhecida como Lei da Partilha, aprovada pelo
Congresso e sancionada por Lula em 22 de dezembro de 2010, define que a
Petrobrás será contratada diretamente, sem licitação, para exploração. E pode,
também, participar de licitações de parcelas do Pré-sal passíveis de exploração
por sócios estrangeiros nos blocos de perfuração.
Uma mesma empresa estrangeira não pode participar da
licitação de mais de um poço por bloco. E assume compromisso de constituir
empresa segundo as leis brasileiras, com sede e administração no Brasil, caso
seja vencedora da licitação.
Em cada poço perfurado, segundo esta lei, a Petrobrás tem
uma participação mínima de 30%, norma que está prestes a ser mudada, adotando
um sistema que vem sendo classificado de “flexibilização” da presença
estrangeira em cada empreendimento.
As evidentes intenções das mudanças que se pretende fazer
são alvos de matérias na mídia do mundo inteiro e de críticas de governos, em
especial dos parceiros no BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul),
entidade que defende a autonomia dos estados nacionais, em contraponto à
dominação das grandes potências.
A proposta de Serra, já aprovada no Senado e em tramitação
na Câmara Federal, em verdade quebra o controle brasileiro do setor. Prevê alterações
inclusive na parte da lei que se refere à participação dos estados e municípios
na distribuição dos royalties referentes à exploração de hidrocarbonetos
fluídos, em especial o petróleo.
O site sueco Wikileaks revelou que Serra prometera essas mudanças
em encontro com dirigentes da Chevron, dos estados Unidos, uma das maiores
petroleiras do mundo. Em discurso em plenário, o senador Roberto Requião
(PMDB/PR) denunciou o fato, afirmando que seu colega havia feito igual promessa
a várias outras multinacionais do petróleo, ainda durante a campanha eleitoral
de 2010.
Na prática, a lei em vias de ser aprovada deflagra a
privatização definitiva da Petrobrás, iniciada durante a onda de privatizações
desencadeada por Fernando Collor, quando presidente da República, mas colocadas
em prática desmedidamente nos governos de FHC.
Como é de amplo conhecimento, o processo de venda da empresa
a grupos privados, que incluía a mudança de seu nome, chegou a ser iniciado,
mas foi contido por poderosa reação popular.
Contudo, o processo não foi eliminado por completo. A
estratégia usada então foi a de tentar picotar a Petrobrás, transformando seus
diferentes projetos e propriedades em “unidades de negócio”. Assim, tornou
possível a venda isolada de parcelas de cada empreendimento, como áreas de
exploração e refinarias.
Ao mesmo tempo, foi desativado o Serviço de Engenharia
(Segen), responsável pelo desenvolvimento tecnológico e acúmulo de conhecimento
da empresa. Deste modo, em poucos anos cerca de 40% do seu capital foram cair
em mãos estrangeiras, tendência em parte revertida na última década.
O enfraquecimento da Petrobrás no projeto Pré-Sal significa,
em verdade, um vigoroso retrocesso nas políticas que visam a autossuficiência
brasileira no setor. Uma volta ao passado que se contrapõe aos interesses
nacionais.
Via - Blog do Miro
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