Mais de duas semanas depois do crime, seguimos à míngua de
qualquer informação oficial sobre a mecânica do assassinato da vereadora
Marielle Franco.
Na edição de hoje de O Globo, porém, tem-se o depoimento de
duas pessoas que assistiram ao atentado – e que não foram ouvidas pela Polícia
– que confirmam o que todo mundo sabia, embora os extremistas de direita
procurassem colocar em dúvida: a vereadora foi vítima de um homicidio
premeditado, planejado e realizado por gente com características de “profissional”
em operações armadas.
O relógio digital da esquina das ruas Joaquim Palhares e
João Paulo I, no Estácio, local de iluminação precária, marcava 21h14m, do
último dia 14, quando um Cobalt prata fechou um carro branco, que quase subiu o
meio-fio. A violência com que o motorista do primeiro veículo abordou o
segundo, numa curva em direção à Tijuca, chamou a atenção de duas pessoas que
estavam a cerca de 15 metros da cena. Uma delas aguardava o sinal fechar para
atravessar o cruzamento. Ambas contam que o motorista do veículo branco, um
Agile, reduziu a velocidade, na tentativa de não subir a calçada. O susto viria
em seguida: o passageiro sentado no banco traseiro do Cobalt abriu a janela,
cujo vidro tinha uma película escura, sacou uma pistola de cano alongado e
atirou. O som da rajada soou abafado. Numa manobra arriscada, o veículo do
agressor deu uma guinada e fugiu pela Joaquim Palhares, cantando pneus.
Uma das testemunhas acha que havia um silenciador, acessório
inimaginável para algum tipo de assalto, como de resto toda a mecânica do
crime.
É, pelo menos, constrangedor que uma repórter ache não uma,
mas duas testemunhas oculares e que a Polícia, em 15 dias, não as tenha ouvido.
Ao menos, com as testemunhas, fecha-se a porta para algum arranjo que encubra
os responsáveis com uma versão de “assalto”.
O significado político da execução de Marielle e do
motorista Anderson Gomes só vai ser exatamente compreendido quando se chegar a
seus autores, não com a compreensível indignação com idiotas que procuram
forjar ligações da vereadora com o crime ou com palermas vaidosas como a
desembargadora boquirrota das redes.
Os grupos de extermínio e as promiscuidades da polícia com o
crime não são novidade. Novidade, a cada dia menos provável, é que sejam
responsabilizados.
Fernando Brito
No Tijolaço
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