Prezado Cláudio Pracownik, li com bastante curiosidade a sua
resposta às críticas feitas através das redes sociais da presença da babá de
seus filhos ao seu lado e de sua esposa na manifestação de hoje (13/03), cujo
principal tema não é o combate à corrupção, mas o impedimento da Presidenta
Dilma e a criminalização, mesmo sem provas, do ex-presidente Lula.
Li com curiosidade porque, na verdade, eu queria saber o que
um legítimo filho da elite escravocrata tinha a dizer sobre o episódio. A arte
de piorar o ruim pareceu ser um dos seus talentos. Explico as razões. Em
primeiro lugar porque você não entendeu nada, Cláudio. Nada. E as suas palavras
de bom empregador e aquele que supostamente presta um grande serviço ao país
são prova cabal disso.
As críticas a você e sua esposa são críticas a toda a elite
escravocrata brasileira. Sou filho de empregada doméstica, trabalhadora rural,
minhas irmãs já foram empregadas e babás. As críticas a você e sua esposa são
as críticas a um país escravocrata cuja história sempre produziu bastante
fetichismo dos trabalhadores mais pobres, de modo que não basta terem
escravizado negros e dizimado índios durante séculos, é preciso se
desresponsabilizar das coisas básicas da vida doméstica e usar o trabalhador
como símbolo de inferioridade numa sociedade de classes e apresentá-los como
prêmio de uma suposta vida meritocrática.
Sim, Cláudio, o repertório de vocês
não passa de uma justificativa escravocrata de se dizerem merecedores da
atitude de poder explorar um trabalhador mais pobre para coisas que vocês
próprios podiam fazer. Prezado Cláudio, você faz parte de uma elite
escravocrata herdeira das capitanias hereditárias. Os seus ancestrais receberam
terras que foram passadas de pai para filho, trouxeram negros durante séculos
do continente africano para serem escravizados no Brasil por quase 4 séculos e
dizimaram milhares de comunidades tradicionais. Muito provavelmente você não se
acha culpado por esse processo histórico, mas até hoje você recebe o privilégio
por nossas desgraças. Você é culpado, como agente do sistema econômico, social
e político, por cada uma das crianças de rua abandonadas de norte a sul do
Brasil. E por mais que não se ache culpado, tudo que sua família lhe deixou por
herança é produto da exploração dos mais pobres, dos negros e dos índios.
Além de ser herdeiro da Casa Grande, prezado Cláudio, você é
banqueiro. Em nosso país você serve e tem servido como agente de
desestabilização econômica e, em meio à crise que passamos, o seu setor é o que
não tem o que reclamar. O exemplo disso é que os bancos privados lucraram,
neste momento difícil que passamos, como nunca. Não se iluda, Cláudio, você não
presta um grande serviço para o país. Ao contrário, por ser resultado desse
processo histórico e herdeiro da Casa Grande, você e os seus devem muito mais
ao nosso país do que empregar 4 trabalhadores em sua casa. Os direitos trabalhistas
reservados a esses trabalhadores foram aprovados com forte oposição da sua
classe social e lobistas representantes do seu extrato socioeconômico dia após
dia fazem campanha e compra de votos para que a legislação trabalhista seja
flexibilizada, o trabalho escravo ressignificado, permitindo menos punição aos
latifundiários escravocratas, também herdeiros como você, a idade penal e a
idade de trabalho reduzidas, levando ao crescimento da exploração do trabalho
infantil e à criminalização da juventude.
Ter levado sua babá para uma manifestação tem um peso
simbólico, querido Cláudio. Primeiro porque demonstra quem está querendo o
impeachment da Presidenta Dilma. Tendo sido ex-presidente da Brasif, empresa
acusada de intermediar envio de dinheiro para amante do ex-presidente FHC no
exterior, você sabe como nunca que não está se manifestando contra a corrupção.
Você está se manifestando por não aceitar que os pobres melhorem de vida, que
as trabalhadoras domésticas tenham direitos historicamente negados, que os
negros adentrem os muros das universidades e que os trabalhadores pobres
brasileiros de fato tenham o voto de minerva nas decisões políticas, podendo
eleger presidentes da República mais próximos do seu projeto.
Admita, Cláudio,
você não estava marchando contra a corrupção. Até porque você deve saber tanto
quanto eu que a corrupção não emana da esfera pública, mas da privada. Deve
saber ainda, e, se não sabe, deveria saber, que sempre houve muita corrupção no
Brasil e os seus antepassados assistiram nas últimas décadas, até a
redemocratização, militares jogando debaixo do tapete todo tipo de malfeito.
Vocês se calaram diante da privataria tucana, do mensalão tucano e do
Banestado.
Essa indignação toda é muito seletiva e simplesmente por um incômodo
ideológico. Vocês nunca protestaram contra essa corrupção apenas por um motivo:
aqueles governos só olhavam para o umbigo de vocês. Admita, caro Cláudio, você
faz parte de uma elite que, ao só pensar no próprio umbigo, é fascista e
colonizada e presta grande serviço de papagaio dos Estados Unidos e da Europa.
Diante desses fatos todos, eu só tenho a lamentar pela exposição de uma
trabalhadora a fim de expor o poderio e o lugar comum de partida de vocês,
escravocratas. A esse tipo de atitude vamos sempre resistir.
*Gabriel Nascimento é doutorando em Letras na USP, mestre em
Linguística Aplicada pela UnB e filiado à União da Juventude Socialista.
Via Brasil 247
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