A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia,
relatora da ação contra as medidas da Justiça Eleitoral em universidades do
país, afirmou durante sessão plenária nesta quarta-feira (31) que "a única
força legitimada a invadir uma universidade é a das ideias livres e
plurais".
AFP |
"Qualquer outra que ali ingresse sem causa jurídica
válida é tirana, e tirania é o exato contrário da democracia", reforçou a
ministra durante sessão que julga se mantém a sua decisão que suspendeu 'atos
de fiscalização' da Justiça Eleitoral que determinaram o ingresso de agentes
eleitorais e de policiais em universidades públicas e privadas de diferentes
estados.
As medidas foram determinadas por órgãos locais da Justiça
Eleitoral sob o argumento de combater suposta "propaganda eleitoral
irregular", mas críticos apontaram censura nas ações e disseram que muitos
dos atos nas universidades não citavam diretamente nenhum candidato.
Entre os atos de censura está a interferência da Justiça
Eleitoral em palestra realizada na UnB (Universidade de Brasília) sobre a
ascensão do fascismo. O evento, organizado pelo Centro Acadêmico de Filosofia e
pelo movimento Brigadas Populares, foi considerado propaganda eleitoral por
órgãos estaduais.
Ações de ingerência da Justiça Eleitoral em universidades
públicas e privadas ocorreram em todo o país, promovendo a retirada de faixas
"contra o fascismo", interromperam aulas e debates, interrogaram
professores e alunos, além de terem realizado buscas e apreensão de documentos.
A ministra endossou a crítica e em seu voto defendeu a
manutenção de sua decisão. "Não há direito democrático sem respeito às
liberdades, não há pluralismo na unanimidade, pelo que contrapor-se ao
diferente e à livre manifestação de todas as formas de pensar, de aprender,
apreender e manifestar uma compreensão do mundo é algemar liberdades, destruir
o direito e exterminar a democracia", disse.
"Impor-se a unanimidade universitária, impedindo ou
dificultando a manifestação plural de pensamento, é trancar a universidade,
silenciar estudantes e amordaçar professores", afirmou a ministra.
Cármen Lúcia afirmou que a "universidades são espaços
de liberdade e libertação social e política" e reforçou que "sem
manifestação garantida, o pensamento é ideia engaiolada".
"Liberdade de pensamento não é concessão do estado, é
direito fundamental do indivíduo -- que pode até se contrapor ao Estado",
diz a ministra, reforçando que a as medidas tomadas teriam ferido também a
autonomia das universidades e a liberdade de docentes e discentes, sendo um
"abuso não de quem se expressa, mas de quem limita a expressão".
"Sem liberdade de manifestação, a escolha seria
inexistente. O que é para ser opção, teria se transformado em simulacro de
alternativa. O processo eleitoral seria transformado num enquadramento
eleitoral -- o que é próprio das ditaduras, muito longe do quadro
brasileiro", defende Cármen Lúcia.
"Quando alguém acha que pode invadir qualquer espaço,
privado ou público, e, nesse caso, uma universidade, instituição plural em seu
nome, universitas, e mesmo assim alega estar a interpretar o direito, impõe-se
sinal de alerta para restabelecimento do Estado Democrático no Direito mais
justo", disse a ministra, salientando que não há meia democracia, e que
ela não deve valer apenas para um grupo. "Democracia não necessita de
justificativa porque o marco civilizatório atingido pela humanidade deveria ter
superado todas as formas ditatoriais, estatais e sociais", afirma a
ministra.
A ministra Cármen Lúcia, relembrando fala de Ulysses
Guimarães, disse que "traidor da Constituição é traidor da pátria", e
que "conhecemos o caminho maldito a que se conduz quando se trai a
Constituição".
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