Muitos brasileiros comemoraram o carnaval e o desfile da
Beija-Flor com entusiasmo e alegria, porém sem ter conhecimento de que a
maioria do povo da Guiné Equatorial sobrevive com menos de 1 dólar por dia
Beija-Flor de Nilópolis recebe doação do atual presidente da Guiné Equatorial (Imagem: Pragmatismo Político) |
Por Lucien de Campos*
A Beija-Flor desfilou na ultima segunda-feira financiada
pelo ditador considerado o mais sanguinário do mundo.
Fui acometido de um péssimo sentimento ao saber que Teodoro
Obiang, o ditador mais cruel da África, doou R$ 10 milhões para a escola de
samba Beija-Flor de Nilópolis. Frequentadores do carnaval carioca, Obiang e seu
filho decidiram patrocinar o enredo da escola. É o maior patrocínio à uma escola
de samba em toda a historia do carnaval carioca. Segundo a revista Forbes,
Obiang é o oitavo governante mais rico do mundo, ao mesmo tempo em que seu povo
vive na miséria.
A Guiné Equatorial presencia há mais de 30 anos uma das mais
cruéis ditaduras do mundo, sendo um dos países mais pobres do continente
africano. Obiang faz o que quer e governa por decreto. Ano passado, aqui mesmo,
já escrevi sobre Obiang e a entrada de Guiné Equatorial à Comunidade dos Países
de Língua Portuguesa (CPLP).
Na ocasião destaquei os motivos que fizeram com que um país
onde não há democracia, fora aceito numa comunidade onde seu estatuto consta
que seus respectivos membros devem exercer a democracia e a boa-governação.
Porém, Obiang e sua família detém a terceira maior produção de petróleo em
África. Foi, de fato, praticada a “Diplomacia do Petróleo”, onde permitam-me
dizer que, como mestrando em diplomacia, considero uma “pratica diplomática”
muito suja que objetiva o dinheiro e os interesses privados, predominando
diante dos princípios democráticos.
Apesar de ser gaúcho, sou um apaixonado por samba. Considero
Neguinho da Beija-Flor o melhor intérprete da Sapucaí e até hoje me emociono
com o samba enredo de 2005, na qual a escola sagrou-se campeã ao fazer a
homenagem aos Sete Povos das Missões. Mas não posso deixar de enfatizar que a
própria Beija-Flor já exaltou em seus enredos dos anos 70 as realizações da
ditadura militar no Brasil. Neste ano exalta a tirania e o totalitarismo de Teodoro
Obiang.
Por mais que os carnavalescos da escola tentam explorar as
belezas e lendas africanas, em determinadas partes do samba enredo notam-se as
palavras “liberdade” e “igualdade“. São, de fato, palavras que não se encaixam
na realidade de Guiné Equatorial. Este pequeno país africano tem uma
considerável concentração de capital numa exígua parcela da sociedade, enquanto
a grande parte do povo vive na pobreza, sendo que este próprio povo é impedido
de expressar suas opiniões e exercer seus direitos.
Muitos brasileiros vão comemorar o carnaval e o desfile da
Beija-Flor com entusiasmo e alegria, porém sem ter conhecimento de que a
maioria do povo da Guiné Equatorial sobrevive com menos de 1 dólar por dia. O
luxo da Beija-Flor neste ano poderia ser investido em políticas sociais para
este povo sofredor. Simplesmente, como fazemos com muitas mazelas no próprio
Brasil, também fechamos os olhos para o que ocorre na África e aceitamos o
dinheiro proveniente de regimes ditatoriais e da indústria petrolífera.
*Lucien de Campos é mestrando em Diplomacia e Relações
Internacionais pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias de
Lisboa e colaborador em Pragmatismo Político.
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