Para 57% dos brasileiros, uma mulher que pratica aborto
deveria ir para a cadeia. A maconha deveria continuar proibida na opinião de 66%.
Quase seis entre dez brasileiros acreditam que o país deveria adotar a pena de
morte e oito de cada dez declaram que a maioridade penal deveria ser rebaixada
para 16 anos. E há ainda 42% que creem que a posse de arma de fogo deveria ser
legalizada no país.
Estes são os resultados de uma pesquisa Datafolha sobre
temas polêmicos realizada no final de novembro passado e divulgada na íntegra
nesta semana. Se, por um lado, ela mostra que o apoio a temas conservadores é
grande no país, quando olhada mais de perto revela que nem todos os temas
apelam aos mesmos perfis. Os conservadores brasileiros não são todos iguais. E
esta ponderação é importante em um ano eleitoral.
A pesquisa mostra que temas conservadores relacionados aos
costumes apelam mais a uma população mais pobre, menos escolarizada e mais
velha. E muito menos aos estratos opostos. Quando os entrevistados foram
questionados se, independentemente da situação, a mulher que interrompe a
gravidez deveria ser processada e ir para a cadeia, tema bastante em voga no
Congresso brasileiro, 57% declararam que sim. O apoio à criminalização do
aborto é ainda maior entre os que estudaram apenas até o ensino fundamental
(71%), têm renda familiar de até dois salários mínimos (67%) e entre 45 e 59
anos (61%). E é muito menor entre os que estudaram até o ensino superior (34%)
e ganham mais de dez salários mínimos (26%).
Vê-se uma tendência similar quando o tema é a legalização do
consumo de maconha. Se os dados globais mostram que 66% dos brasileiros
acreditam que a droga deveria continuar proibida, os que estudaram até o
fundamental são mais apoiadores disso (74%), assim como os que ganham até dois
salários (71%) e os que têm mais de 60 anos (73%). Cai consideravelmente entre
os que fizeram ensino superior (55%), os que ganham mais de dez salários
mínimos (45%) e os que têm entre 16 e 24 anos (57%). "A população mais
pobre é mais exposta a um conjunto maior de vulnerabilidades. O efeito das
drogas é visto de forma mais negativa por elas, já que costumam viver mais perto
do tráfico, por exemplo. Por isso, há uma diferença na maneira como as classes
percebem essas questões", afirma Carlos Savio Gomes Teixeira, chefe do
Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense.
Este abismo entre classes já não é visto de forma tão
acentuada quando os temas conservadores se relacionam com a violência. Enquanto
57% das pessoas afirmaram que se houvesse uma consulta à população votariam
favoravelmente à pena de morte, a taxa, a maior dos últimos anos, cresce um pouco
entre os que cursaram ensino médio (60%) e entre os que ganham até dois
salários (58%) ou de dois a cinco salários (58%). Ainda que seja menor entre os
que cursaram o superior (50%) e os que ganham mais de dez salários (42%), a
diferença entre os dois estratos sociais não é tão latente como nos temas
relacionados aos costumes. Quando se trata de reduzir a maioridade penal para
16 anos, há um consenso mais bem distribuído. Para 84% da população, isso
deveria acontecer. E aumenta mais entre os que têm ensino médio (88%) e os que
ganham entre 2 e 5 salários mínimos (87%) —ainda que caia, mas não bruscamente,
entre os de nível superior (79%) e entre os que ganham mais de 10 salários
(73%).
E quando se questionou se possuir uma arma de fogo
legalizada deveria ser um direito do cidadão para se defender, 42% concordam,
mas a taxa aumenta justamente entre os mais escolarizados (43%, entre os que
têm ensino médio e superior) e ricos (47%), algo que faz sentido por ser uma
questão bastante interligada a posses patrimoniais.
Mas como esses posicionamentos influenciam as eleições? Para
Teixeira, eles causam menos impacto nas campanhas majoritárias, como a de
presidente da República, do que nas proporcionais, como a de deputados.
"Na eleição majoritária, primeiro o eleitor faz um cálculo de se vale a
pena participar. Se considera que sim, ativa muitas variáveis, como seus
próprios interesses e valores, mas também o momento pelo qual passa o país.
Neste ano, por exemplo, os componentes desta escolha devem girar especialmente
em torno de dois grandes temas: a economia e a moral, por conta da
corrupção", aponta. "Já um voto de deputado é mais personalista. O
cálculo é: quero eleger alguém que me represente e que dê atenção prioritária a
temas que me parecem importantes. Se acho que violência é o que me afeta muito,
voto no que fala de violência", completa. E isso se reflete no grau de
conservadorismo do Congresso. "Basta ver a Bancada da Bala, que a cada
eleição cresce no Congresso Nacional".
Para o professor, os dados da pesquisa também são
importantes para que os candidatos reflitam sobre seus posicionamentos em
relação à temática da violência. "Esse tema não pode ficar nas mãos da
direita brucutu, que traz respostas simples, como armar as pessoas. É uma
grande oportunidade para se tematizar isso. A esquerda precisa complementar a
defesa dos direitos humanos com uma agenda prática que responda a essa
ansiedade que boa parte da população brasileira tem com o tema da
criminalidade, da violência, que é real."
Via - Portal Vermelho
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