Não havia exagero nenhum quando dissemos que a reforma do
ensino médio do governo golpista de Michel Temer destruiria a formação dos
estudantes nesse nível de ensino. A pretexto de resolver os problemas do ensino
médio, a começar de sua falta de identidade para os estudantes (uma vez que não
forma adequadamente para a continuidade dos estudos e tampouco para o mundo do
trabalho), Temer optou por transformá-lo em mero estágio de formação de mão de
obra, esvaziando-o de todos os conteúdos necessários à formação integral de
nossos jovens para o pleno exercício da cidadania.
A reforma do ensino médio nega aos estudantes o direito de
acesso ao conhecimento historicamente acumulado, retirando do currículo a
obrigatoriedade da oferta de disciplinas como Sociologia, Filosofia e Artes e
tornando optativas Química, Física e Biologia. Ao mesmo tempo, a reforma
permite que 40% do currículo seja flexível, ou seja, que se componha de
conteúdos da chamada “parte diversificada”. O que defendemos, junto com outras
entidades e especialistas comprometidos com a educação de qualidade, é que a
parte diversificada seja de no, máximo, 30% do currículo.
Além desses absurdos, a propaganda do governo federal induz
a sociedade a acreditar que os estudantes poderão traçar seus próprios
itinerários formativos a partir do segundo ano, quando, na realidade, cursarão
as disciplinas que forem oferecidas pelas Secretarias de Educação em cada
unidade escolar. Como afirma reportagem publicada nesta terça-feira, 20 de
março, no jornal Folha de S. Paulo, mais da metade dos Municípios do país só
tem uma escola de ensino médio, dificultando a oferta de cinco opções para os
estudantes.
Agora, de acordo com a mesma reportagem, “Temer quer 40% do
ensino médio a distância”, o que significa dar um tiro mortal nesse nível de
ensino brasileiro, abrindo mão de qualquer perspectiva de qualidade e de
respeito aos direitos da juventude trabalhadora, que necessita da escola
pública, de ter um ensino à altura de suas necessidades, condenando-os a
permanecer na periferia da nossa sociedade, com grandes dificuldades para
almejar postos de comando, tendo em vista a precarização de sua formação escolar
básica.
De acordo com a reportagem da Folha, a mudança seria parte
de uma nova resolução do Conselho Nacional de Educação, modificando as
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, que já foi totalmente
desrespeitada na reforma promovida pelo ilegítimo comando do Ministério da
Educação, liderado pela ex-Secretária Estadual de Educação de São Paulo, Maria
Helena Guimarães de Castro, hoje Secretária Executiva do MEC, que, lembremos,
foi demitida da Secretaria de Educação de São Paulo após sucessivas investidas
contra as professoras e os professores da rede estadual de ensino.
O que está por trás desse projeto é, mais uma vez, a
inaceitável privatização do currículo da escola pública. O currículo é a
essência do processo ensino-aprendizagem, alma do projeto político-pedagógico
das escolas, definindo os conteúdos a serem trabalhados com os estudantes,
metodologia, didática. A adoção da educação a distância para 40% do currículo
do ensino médio vai permitir que empresas privadas vendam seus “pacotes” para
as redes públicas e isso não existe em educação.
O processo educativo é uma relação dialógica entre
professores e estudantes, uma troca que se dá na relação interpessoal, no
ambiente escolar. As tecnologias podem ser utilizadas como meio para que esse
processo ocorra e não como fim. No caso do projeto do governo Temer para o
ensino médio, a educação a distância é um fim, cujo objetivo é conduzir a
terceirização na educação pública, dinheiro público revertido para iniciativa
privada. Curiosamente, quando se trata de privatização, todo o processo
acontece com celeridade impressionante, o que ocorre quando se trata da
melhoria da qualidade da educação, valorização de seus profissionais e a
garantia dos direitos dos estudantes.
Não vamos aceitar mais esse ataque. Se reforma do ensino
médio já era desastrosa para o país, com essa possível alteração ela
significará um verdadeiro genocídio cultural de nossos jovens filhos e filhas
da classe trabalhadora.
O ensino a distância pode ser admitido como uma forma de
complementar as atividades desenvolvidas pelos professores com seus estudantes
em sala de aula ou, em casos muito excepcionais, como alternativa para o
processo ensino-aprendizagem em regiões remotas, de difícil acesso, como em
alguns locais da Amazônia. O que pretende o governo golpista de Temer, além da
óbvia desqualificação do ensino médio para a classe trabalhadora, é a redução
do número de professoras e professores da educação pública no país, visando o
enxugamento da máquina pública. Essa medida se combina com a
institucionalização do credenciamento de pessoas para o magistério por “notório
saber”, o que permitirá a desprofissionalização da docência e consequente
aviltamento dos salários e da carreira do magistério público.
Como professora, Presidenta da Apeoesp, cidadã brasileira e
ex-Conselheira do Conselho Nacional de Educação, que muito contribuiu para a
elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, não me
calarei. De imediato, buscarei a reafirmação da aliança entre professores,
estudantes, pais e movimentos sociais para construir uma mobilização capaz de
impedir que esse crime se concretize no estado de São Paulo, assim como atuarei
junto à Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Central Única
dos Trabalhadores (CUT) e demais entidades nacionais para que esse projeto de
Temer, assim como o conjunto da reforma do ensino médio, sejam definitivamente
derrotados.
* Maria Izabel Azevedo Noronha, Professora Bebel, é
presidenta da Apeoesp.
Via - Blog do Miro
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