Fiquei muitos meses sem escrever por aqui, por excesso de
trabalho e por achar que o debate político estava tão alterado que a atitude
mais sábia era o silêncio. Esperava que os derrotados das eleições fizessem o
mesmo, deixassem passar os primeiros meses do novo governo para cobrar
resultados. Meu volume de trabalho não diminuiu, na verdade cresceu, e os
derrotados não esperaram nem um dia para subir ainda mais o volume e a grosseria
das críticas, muitos pregam em voz alta, sem qualquer pudor, a volta da
ditadura militar ou qualquer outro golpe que lhes devolva o poder que perderam
nas urnas.
Volto a escrever sobre política porque o crescimento da
direita, da intolerância, do fascismo, da ignorância e da homofobia, transforma
os calados em cúmplices. A história ensina que os inimigos da democracia se
utilizam da frustração e dos anseios legítimos da sociedade, das pessoas de boa
fé, para chegar ao poder, e então passam a exercê-lo com tirania, perseguindo
minorias, promovendo a intolerância e a violência. E aí é tarde demais para
combatê-los pacificamente.
Não é possível ficar quieto quando o congresso é dominados
pelo que há de pior na sociedade brasileira, bandidos e falsos pastores,
achacadores em nome de Cristo, picaretas envolvidos em todo tipo de falactrua,
legislando em causa própria, manobrando votações, chantageando empresários para
garantir seu butim, promovendo cultos religiosos no plenário, fomentando a
homofobia e a ignorância. O atual congresso brasileiro, comandado por Renan
Calheiros e Eduardo Cunha, ambos investigados por uma dúzia de crimes e toda
sorte de imoralidades, é uma vergonha para o país.
Não é possível aceitar calado que o ministro Gilmar Mendes,
uma única pessoa sem um único voto, por uma manobra rasteira, mantenha
engavetado, por mais de um ano, um projeto de mudança da legislação eleitoral
já aprovado pela maioria dos juízes, projeto este que, se não impede, dificulta
em muito a roubalheira nas eleições e na política. A quase totalidade dos
escândalos que entravam a vida nacional e sangram os cofres públicos está
relacionada com a doação de empresas aos políticos, que retribuem o favor
legislando contra o interesse da maioria da população e superfaturando obras,
ambulâncias, remédios. Sem o fim da doação de empresas para políticos a
roubalheira nas eleições será eternizada.
Não é possível silenciar quando a presidente Dilma, eleita
legitimamente pela maioria da população brasileira para manter e aprofundar os
avanços dos governos populares, concede a tal ponto em nome de uma suposta
governabilidade que entrega a economia aos banqueiros, a agricultura aos
latifundiários do agronegócio e a política aos sanguessugas do PMDB, um partido
que é eternamente governo porque sua única convicção é ser eternamente governo.
Se eu imaginasse que e Katia Abreu, Levy e Eliseu Padilha poderiam ser
ministros de Dilma teria votado em Luciana Genro.
Infelizmente, quem deveria fiscalizar o governo, o
legislativo e o judiciário é a imprensa, que tornou-se irrelevante quando abriu
mão de fazer jornalismo para fazer oposição partidária. A imprensa brasileira,
que sempre foi ferozmente governista, descobriu sua vocação oposicionista
quando a Casa Grande perdeu um pouco o seu poder. É constrangedor ver
jornalistas ou similares pensando exatamente como seus patrões mandam. Talvez
pela profunda crise que o setor atravessa, com jornais e audiências minguando,
velhos jornalistas e jovens sedentos de poder e fama se agarrem aos seus empregos
com unhas e dentes, repetindo bobagens até a náusea. A verdade não agrada o
patrão? Esqueça! O bandido disse que também deu dinheiro aos tucanos? Ignore! O
patrão esconde dinheiro na Suíça e sonega fiscais para não pagar impostos? Não
é comigo! O mensalão foi criado para eleger o presidente do PSDB? Concentre-se
no plágio petista! A acusação contra um petista não faz sentido? O que importa?
A antiga imprensa, que já estava seriamente ameaçada por conta da revolução
digital, acelerou seu caminho para o fim abrindo mão do princípio básico do
jornalismo: a defesa da verdade factual. Quando a história da antiga imprensa
brasileira for contada descobriremos que ela não morreu, suicidou-se.
Você pode achar esta conversa de política uma chatice, e é
mesmo. O problema é que os que não gostam de política são governados por
aqueles que gostam. Ontem, pela segunda vez, imbecis agrediram o ex-ministro
Mantega num restaurante. Outro dia foi num avião, um jornalista - sozinho - que
lia uma revista, foi atacado por um punhado de trogloditas. Jô Soares foi
ameaçado de morte por entrevistar a presidente da república, eleita
democraticamente. Os sinais de intolerância crescem, tornam-se mais frequentes
e mais violentos, é de se esperar que a ignorância dos mal informados covardes
que andam em bando logo produza vítimas. Silenciar é ser cúmplice deste
fascismo crescente.
Votei no Lula e na Dilma na esperança de promover a inserção
social, a melhor distribuição de renda, para garantir a geração de empregos, o
acesso dos filhos dos trabalhadores às universidades, na esperança de melhorar
a vida dos mais pobres, para ver a corrupção ser investigada e punida. Tudo
isso aconteceu, menos do que eu esperava, porém mais do que nunca. 40 milhões
de pessoas passaram a ter uma vida mais digna, a fome foi praticamente
erradicada, os níveis de emprego se mantêm altos, milhares de jovens passaram a
ter acesso ao ensino superior, a mortalidade infantil no Brasil caiu pela
metade.
O combate à corrupção também avançou muito. Uma lei promulgada
por Dilma permite que hoje os corruptores também sejam punidos. A Polícia
Federal investiga, o Procurador Geral da República não engaveta as denúncias e
vemos, pela primeira vez, empresários, políticos e banqueiros graúdos serem
investigados e presos. É bom lembrar (já que ninguém lembra) que Renan
Calheiros, que hoje é investigado pela Polícia Federal, no governo de Fernando
Henrique era o Ministro da Justiça e, portanto, chefe da Polícia Federal! E foi
neste momento (segundo o Ministério Público e segundo vários bandidos
delatores), no final do primeiro mandado de FHC, que a quadrilha de Youssef
começou a roubar a Petrobrás. Mas também é fato que a continuidade no poder
atraiu toda espécie de picaretas que, somados aos picaretas já existentes no PT,
sugam os recursos públicos que faltam para os hospitais, para a escolas, para a
segurança pública. E os avanços do governo popular começam a ser comprometidos.
Felizmente - talvez pela cretinice evidente dos seus
apoiadores na mídia - a direita brasileira tem perdido eleições com agradável
regularidade, foram quatro, em dois turnos, nos últimos 13 anos. Oito vezes o
povo brasileiro foi às urnas dizer não à intolerância, ao egoísmo e a
hipocrisia. Espero que eles percam outra vez em 2018, mas se até lá o PT não se
livrar desta direita truculenta, homofóbica, picareta e ignorante, pode até
ganhar as eleições, mas não terá mais o meu voto.
Afinal, até quando vamos aceitar calados as agressões dos
derrotados nas urnas, uma elite iletrada, egoísta, ignorante e preconceituosa,
que ficou 500 anos no poder e transformou o Brasil no país mais desigual do
planeta?
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