1. Os direitos fundamentais, percebidos como obstáculos à
eficiência repressiva do Estado, são negados de norte a sul do país.
2. Para punir quem viola a lei, o Estado brasileiro também
viola a lei (grampos ilegais, gravações clandestinas, “delitos de ensaio”
travestidos de legítimos, prisões ilegais e desproporcionais, etc.).
3. As ilegalidades praticadas pelo Estado no combate ao
crime são naturalizadas pela população (que, em razão da tradição autoritária
em que está inserida, identifica “justiça” com “punição”, “liberdade” com
“impunidade” e goza sadicamente com o sofrimento de pessoas) e ignoradas ou
desconsideradas pelo Poder Judiciário, em especial nas grandes operações que
ganham (pelos mais variados motivos, nem todos legítimos) a simpatia dos meios
de comunicação de massa.
4. Na fundamentação das decisões judiciais, as teorias
penais e processuais penais, bem como o compromisso com os valores “verdade” e
“liberdade”, foram substituídas por discursos de cunho político recheados de
senso comum e/ou moralismos rasteiros.
5. Desconsidera-se a secularização, com os atores jurídicos
a reintroduzir no sistema de justiça criminal a confusão entre direito e moral,
crime e pecado, Estado e Igreja.
6. Atores Jurídicos passam a adotar posturas messiânicas,
com discursos salvacionistas, e a demonizar, não só a política (que deveria ser
um espaço criativo e comum), como também todos aqueles que não comungam de seus
pontos de vista.
7. Prisões são decretadas em contrariedade à legislação
brasileira, inclusive em violação aos limites semânticos contidos no texto da
própria Constituição da República (a recente prisão de um parlamentar brasileiro
é apenas mais um dentre tantos casos).
8. Como no período pré-kantiano, o imputado (indiciado ou
acusado) voltou a ser tratado como objeto, instrumentalizado para alcançar fins
atribuídos ao Estado, o que acontece, por exemplo, nas hipóteses de prisões
cautelares ou restrições de direitos com o objetivo de obter confissões ou
delações.
9. Pessoas que se afirmam “defensores dos direitos humanos”
estão a aplaudir a violação de direitos e garantias fundamentais daqueles que
identificam como inimigos de classe ou de projeto político, bem como, o que é
ainda pior, na medida em que não há a desculpa da cegueira ideológica, para
ficar bem aos olhos da opinião pública fascistizada (que glorifica a
ignorância, tem medo da liberdade e aposta em medidas de força).
10. Um juiz brasileiro passou a ser criticado por cumprir a
Constituição da República e a Lei de Execução Penal, porque assim – pelo
simples, e pouco comum, fato de tratar os presos com dignidade – teria se
tornado “o queridinho” de criminosos. Essas críticas, feitas pelos mesmos meios
de comunicação de massa que reforçam concepções autoritárias e naturalizam
crimes praticados por agentes estatais, não mencionam, por ignorância ou má-fé,
que as chamadas “grandes organizações criminosas” (pense-se no Comando Vermelho
e no PCC) nasceram em contextos de violação aos direitos dos criminosos presos.
Em nome do que representa o Estado Democrático de Direito
(um projeto político de contenção do poder, de limite às diversas formas de
opressão, em que a liberdade concreta de cada um não precisa ser trocada por
promessas abstratas de segurança), peço muita reflexão ou... UM MINUTO DE SILÊNCIO.
*Rubens Casara é Doutor em Direito, Mestre em
Ciências Penais, Juiz de Direito do TJ/RJ, Coordenador de Processo Penal da
EMERJ e escreve a Coluna ContraCorrentes, aos sábados, com Giane Alvares,
Marcelo Semer, Marcio Sotelo Felippe e Patrick Mariano
Via - O Irnitorrinco
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