- "Ah, ele já tá criando Penugem!"
João de Sousa Lima, Cadinho Machado e José Santana - Arcevo de João de Sousa Lima |
Tantas histórias e personagens
encontramos todos os dias em nossas pesquisas sobre o cangaço...
Há ainda tantas figuras e fatos
que tiveram ligações diretas com a vida conturbada dos cangaceiros.
Em recente visita com o
amigo Josué Santana ao senhor Cláudio
Alves Fontes, conhecido por Cadinho Machado, podemos ouvir e registrar suas
histórias.
Ainda garoto, com a idade de oito
anos, Cadinho conheceu alguns cangaceiros. (Cadinho nasceu no dia 07 de
setembro de 1920). Depois desse encontro, durante muitos anos, foi encarregado
de levar algumas coisas para os cangaceiros.
José Alves Fontes e Maria Alves Fontes, pais de Cadinho, residiam na fazenda Beleza em Pão de Açúcar, Alagoas.
Cadinho ficou muito tempo levando
leite para Corisco e Dadá alimentarem sua filha no coito Poço Salgado (Esse
coito depois ficou conhecido como a Pia de Corisco). Essa fazenda hoje pertence
a Mané Cajé e na época do cangaço pertencia a Neco Brito.
Cadinho também ficou abastecendo
o grupo de Lampião com leite e água e sempre tinha seus serviços pagos pelos
cangaceiros, dinheiro esse que juntava e sempre andava nos bolsos de suas
calças.
Em uma dessas idas ao coito
“Pocinhos” (também de Neco Brito), presentes nesse dia os grupos de Lampião e
Corisco, Cadinho sentou-se na beira de
um riacho e ficou conversando com o cangaceiro Cacheado que o escutava
encostado no mosquetão. Em frente a Cadinho, o cangaceiro Passarinho limpava
sua arma; De repente ouviu-se um disparo, os cangaceiros procuraram abrigo e se
prepararam para lutar; Cadinho correu achando que era a polícia e quando chegou
ao barranco do riacho e se escorou,
sentiu o sangue jorrando de suas nádegas e banhando as pernas. O meninote se
assustou com a quantidade de sangue. Os cangaceiros se recompuseram do susto.
Maria Bonita, Dadá e Maria de Pancada viram
Cadinho molhado de sangue, pegaram o
menino e Maria Bonita avisou Lampião:
- Oh Lampião, o carregador de
água tá baleado!
As mulheres baixaram a calça de
Cadinho e ele disse que estava com vergonha. Maria Bonita mandou ele se calar e
depois observou:
- Ah, ele já tá criando Penugem!
Lampião perguntou de onde tinha
partido o tiro. O cangaceiro Cacheado entregou:
- Foi Passarinho! Olha ele lá
embaixo da quixabeira!
No bolso da calça do garoto tinha um
dinheiro todo ensopado de sangue e Lampião pegou o dinheiro e colocou farinha
encima pra secar o liquido. Lampião pediu o dinheiro emprestado (era 220 mil
réis); Cadinho emprestou.
Do coito Lampião veio pro Caboclo
(local onde reside hoje o senhor Cadinho). O cangaceiro veio pra matar Neco
Cavalcante, inimigo ainda da época de Pernambuco.
Cadinho ficou sendo cuidado por
Juriti. Uma semana depois Lampião retornou e pagou o dinheiro do jovem.
Depois Lampião prometeu duas
novilhas de presente para Cadinho e foi quando aconteceu a morte do cangaceiro,
no dia 28 de julho de 1938. Cadinho até hoje lamenta ter perdido o prêmio.
Aos 95 anos de idade, Cadinho é
ainda homem lúcido, bom de prosa, sorridente, alegre... Ri sempre que lembra de
um tiro que varou suas nádegas e da vergonha que teve em ter suas vestes
arrancadas deixando suas “VERGONHAS” à mostra de mulheres encaliçadas na lida
diária com a presença do sangue que banhou tantas vezes as áridas veredas das
Caatingas nordestinas.
Por JOÃO DE SOUSA LIMA - Historiador e escritor. Membro da ALPA –
Academia de Letras de Paulo Afonso.
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