Igreja Matriz São Sebastião Paranavaí 1950 |
Por David Arioch - Jornalismo Cultural
No início dos anos 1950, Paranavaí ficou conhecida em todo o Paraná como a “Capital do Crime”. À época, acontecia pelo menos um homicídio por dia na cidade. Muitos assassinatos eram motivados por brigas envolvendo posse de terras.
No início dos anos 1950, Paranavaí ficou conhecida em todo o Paraná como a “Capital do Crime”. À época, acontecia pelo menos um homicídio por dia na cidade. Muitos assassinatos eram motivados por brigas envolvendo posse de terras.
Em Paranavaí, não há registros sobre centenas de crimes que
aconteceram nos anos 1940 e princípio da década de 1950. Não são poucos os que
foram enterrados como indigentes.
Às vezes, a família do falecido nem recebia o registro de
óbito. Em muitos casos, a única informação discriminada no obituário era “causa
mortis desconhecida”, deixando patente o desinteresse das autoridades em
investigar muitos crimes.
No entanto, restaram os pioneiros que, falando ou
escrevendo, trazem à tona alguns dos fatos mais obscuros da história local.
O CEIFADOR DE VIDAS
Um dos personagens mais controversos da história de Paranavaí
e região, quando todo o Extremo-Norte do Paraná pertencia a Paranavaí, é o
migrante paulista João Pires que atuou como jagunço em toda a colônia,
principalmente em áreas que hoje pertencem a Loanda e Santa Isabel do Ivaí.
Pires se tornou proprietário de uma fazenda conhecida como
Derrubada Grande que mais tarde receberia o nome de Guaritá e depois Nova
Aliança do Ivaí.
Frei Ulrico/Via David Arioch |
Pioneiros contam que Pires era um ceifador de vidas,
carregava “nas costas” dezenas de mortes, todas motivadas por posses de terras.
O padre alemão Ulrico Goevert creditava todas as riquezas do
migrante ao sangue que ele derramava por onde passava, e sem qualquer remorso.
“Durante anos, pensei em silêncio: espera um pouco, ‘Seu
Pires’, e chegará o teu dia de cair liquidado no chão!”, revelou o frei no
livro “Histórias e Memórias de Paranavaí”. João Pires era famoso pelo requinte
de crueldade com o qual tratava suas vítimas.
Ao migrante paulista não interessava se eram jovens, velhos
ou mulheres que viviam nas propriedades que era encarregado de grilar. Se a
pessoa resistisse em desocupar a área, Pires “passava fogo” em toda a família,
sem deixar sobreviventes.
O migrante conquistou fortuna ao prestar serviços para
fazendeiros. Naquele tempo, os “quebradores de milho”, como eram chamados os
jagunços, ganhavam muito dinheiro com a grilagem de terras. O pagamento era
proporcional a área que conseguiam desocupar. “Num determinado dia, Pires
encontrou seu justiceiro”, contou o frei alemão.
O migrante paulista caiu em uma emboscada e foi alvejado com
inúmeros tiros. Mesmo com tantos ferimentos, conseguiu ajuda e foi trazido a
Paranavaí na carroceria de um caminhão. Internado no Hospital do Estado,
resistiu ao máximo. Porém, cientes da gravidade do estado de saúde de João
Pires, os médicos chamaram frei Ulrico para ministrar os últimos sacramentos.
“Fiz a minha obrigação sacerdotal. Algumas horas mais tarde,
ele se levantou e chamou o médico, pediu que o curasse só até o ponto de estar
em condições de se vingar do inimigo. Afirmou que o mataria a tiros”, lembrou o
padre que reprovou a atitude do homem. Logo em seguida, João Pires arregalou os
olhos e deu um grito exasperado: “Ali vem o diabo para me buscar!”. Depois
disso, o homem caiu morto na cama.
Um amigo do migrante que também teve o mesmo destino foi
“Gustavo, o Grande Brigão”. Se qualquer desconhecido o olhasse, o homem já
arrumava confusão. Gustavo foi assassinado com tiros à queima-roupa pelo
próprio motorista. “No dia do sepultamento, fui ao quarto do falecido e
encontrei o cano de uma pistola no lugar de uma cruz”, relatou frei Ulrico.
O ABRAÇO DA MORTE
No início da década de 1950, havia dois homens muito amigos
que viviam às margens do Rio Paraná. Porém, a amizade foi abalada quando um
soube que diante de outras pessoas o outro o criticava.
Sentindo-se traído, o homem decidiu se vingar. Pegou o barco
e atravessou o rio para encontrar o amigo. Quando chegou lá, no momento em que
se cumprimentaram com um abraço, o homem traído cravou a peixeira nas costas do
“amigo”, atravessando o coração. O autor do homicídio deixou o homem caído,
agonizando até a morte, e voltou para casa.
Antes de chegar à margem, encontrou os dois filhos da vítima
e gritou: “Visitei o pai de vocês. Ele os tratará melhor no futuro”.
Sem entender, os rapazes seguiram para casa. Quando chegaram
em terra firme e viram o pai morto nem pensaram em se vingar. Segundo o frei
alemão Ulrico Goevert, os jovens ficaram gratos, pois o homem os maltratava
demais.
“Ficou que nem bicho morto que você arrasta e joga no mato”
O pioneiro paulista João da Silva nunca se esqueceu da morte
do capanga Macaúba. O jagunço que vivia em Paranavaí foi assassinado em Cidade
Gaúcha, também no Noroeste Paranaense, em uma tentativa frustrada de grilagem
de terras.
“Quando isso aconteceu, nem enterrado ele foi. Ficou que nem
um bicho morto que você arrasta e joga no mato. Ainda me recordo também de um
turco que foi morto no centro da cidade”, destacou João da Silva em entrevista
à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
O pioneiro José Francisco Siqueira, conhecido como Zé Peão,
se recorda da morte de dois japoneses e um mineiro.
“Um peão veio lá da região de Santa Cruz de Monte Castelo
buscar o pagamento em Paranavaí. Quando chegou aqui os japoneses falaram que
não iriam pagar”, contou. Durante a discussão, o rapaz sacou a arma e atirou
nos dois devedores. O motorista dos japoneses ainda tentou intervir, mas também
foi baleado e morreu.
“Outra morte que chamou muita atenção foi de um tal de
Canário, assassinado lá em Jurema [atual Amaporã]. Quem mandou matar foi um
fazendeiro de Jacarezinho [no Norte Pioneiro Paranaense]”, frisou Zé Peão em
antigo depoimento à prefeitura.
Em entrevista ao jornalista Saul Bogoni há algumas décadas,
o pioneiro catarinense Carlos Faber citou como inesquecível a morte de dois
brasileiros e um japonês em uma das ruas mais movimentadas de Paranavaí no
início de 1946. “O japonês tinha uma fazenda e o rolo era por causa de terras.
O que matou foi preso depois de alguns meses”, enfatizou.
Pessoas que os pioneiros apontaram como jagunços da Colônia
Paranavaí: João Pires, Frutuoso Joaquim de Salles, Gustavo Brigão, Pedro
Krüger, Laurentino, Narciso Barbudo, Napoleão, Chico Catingueiro, Pracídio,
Maneco Borges, Canjerana, Macaúba, Nocera e Guri.
Curiosidades
Durante a colonização de Paranavaí, poucos eram os
fazendeiros que se envolviam diretamente nos conflitos de terras. O costume era
contratar jagunços ou “quebradores de milho” para tratarem da situação. Para
isso, eram muito bem remunerados.
Era comum a fuga para o Mato Grosso quando a situação ficava
muito complicada para os envolvidos em atividades criminosas em Paranavaí.
Fonte: Diário do Noroeste
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