Antonio Prata Folha de S. Paulo
Com o intuito de facilitar um pouco nossa passagem pela Terra, fiz uma pequena lista com alguns estorvos
Se os princípios da seleção natural valessem para os objetos criados pelo homem, estariam extintos há muito tempo o chuveiro elétrico, o repelente em espiral e o sachê de ketchup. É curioso: enquanto a natureza, esse monstro acéfalo, paga regiamente seu tributo à perfeição, mandando pro beleléu tudo o que não se adapta (alô, Neandertal!), nós toleramos uma quantidade absurda de inutensílios, como se suas existências fossem incontornáveis feito a morte, os impostos e a trilha sonora do vizinho. Não são! Com o intuito de facilitar um pouquinho nossa tão atribulada passagem pela Terra, fiz uma pequena lista com alguns desses estorvos.
Sachê de ketchup. A pior realização da humanidade, depois da versão orquestrada de Ilariê. Nas lanchonetes sempre nos dão logo cinco saquinhos, pois sabem que não conseguiremos abrir os quatro primeiros, mesmo que nos atraquemos com unhas e dentes àqueles sarcásticos dizeres: "Rasgue aqui".
Chuveiro elétrico. A segunda pior realização da humanidade, depois do sachê de ketchup e da versão orquestrada de Ilariê. A água só esquenta de verdade se não abrirmos quase nada a torneira: sob o fiozinho escaldante que escorre da ducha (sic), é como se você estivesse com o cocuruto no Saara, a barriga no Ártico, a bunda na Patagônia e os pés -bem, não se preocupe com os pés, pois após cinco minutos eles terão congelado e perdido toda a sensibilidade.
Repelente em espiral. Tem um cheiro gostoso, remete-me à infância e é bonito de ver queimando no escuro; mas, enquanto me deleito em meio ao torpor hippie-praiano, pernilongos e borrachudos deleitam-se com meu sangue. Repelente em espiral só repele os mosquitos de si próprio. E olhe lá...
Rede. Rede é lindo, rede é Brasil, é um objeto maravilhoso -mas não para se deitar. Quando você encontra a posição das pernas, perde a da cabeça, quando ajeita a cabeça, desarruma as pernas... Acho que as redes deveriam ser penduradas abertas na parede, como um quadro, uma peça de tapeçaria.
Secador de mãos a ar. Funciona muito bem -se você não tiver mais nada a fazer pelo resto da tarde, além de ficar virando as mãos de um lado pro outro, dentro de um banheiro público, só para que o dono do estabelecimento economize R$ 0,05 em folhas de papel. E não me fale em ecologia, pois o secador é elétrico, somos todos adultos e sabemos que a eletricidade não vem da cegonha: por mais limpa que seja, é sempre fruto de alguma sacanagem com o ambiente.
Embalagens de plástico duro. Estou há uma semana tentando tirar meu mouse novo de uma dessas armaduras plásticas. Ontem, fui comprar uma tesoura e -inferno!- ela vinha com a mesma inviolável carapaça.
Quando nossa civilização acabar e só restarem ruínas, essas embalagens resistirão, incólumes. Sobre nós, dirão os homens do futuro: "Eram ignorantes, crédulos e autodestrutivos, mas, caramba, que embalagens produziam!".
A lista das coisas que não funcionam é longa, caro leitor, mas a coluna é curta, de modo que devo parar por aqui. Prometo retomar o assunto noutra oportunidade e abordar uma variação muito importante do tema: as ideias que não funcionam. Adianto aqui algumas delas: pintar a própria casa, camping e relação a três. Até breve.
Do blog: O Esquerdopata
Do blog: O Esquerdopata
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