Há um componente novo no cenário das mídias de oposição: a
emergência de uma rede de produção de conteúdo em mídias radicais, montada
pelas organizações sociais de jovens afrodescendentes, nas periferias das
grandes cidades.
Por *Juarez Xavier
A apropriação criativa dos dispositivos tecnológicos pela
juventude da periferia, para a produção de uma contra narrativa, fragilizou e,
em alguns momentos, paralisou a violência midiática –simbólica e física- das
grandes corporações.
Esse arranjo articulado no território criativo –digital e
analógico- desequilibrou dois fenômenos que caracterizam o sistema de
comunicação brasileiro: a concentração dos veículos de comunicação em poucas
mãos –algumas famílias e uma seita evangélica- e a propriedade cruzada de
plataformas de comunicação - uma mesma empresa tem numa mesma praça meios
impressos [jornais e revistas], eletrônicos [rádio e televisão] e digitais
[portal de internet].
O desenho desse sistema forma uma “rede de factibilidade”,
que faz com que a mesma versão do mesmo fato seja repetida diversas vezes, em
diversas plataformas e horários, para diversos públicos, até formar uma versão
unidimensional da realidade social: até formar um simulacro da realidade.
O resultado é a criminalização do contraditório e a
segregação das visões de oposição, com a alienação no debate político de
parcelas significativas da população.
Temas fundamentais que afetam a sociedade não são
reportados, como o sistemático assassinato de jovens negros, pobres, das
periferias de grandes e médias cidades, mortos com características de execução
- tiros no peito e na cabeça-, como evidenciam os mapas da violência 2013/2014.
O fenômeno não é novo. Desde os anos de 1980, organizações
sociais e políticas denunciam o fato, sem que haja mudanças substantivas.
A imprensa corporativa cala-se ante essa violência.
A emergência dos arranjos de produção de conteúdo de jovens
da periferia fraturou o muro da “conspiração do silêncio”.
Lastreada nas políticas públicas de universalização do
acesso à rede mundial de computadores, como os pontos de cultura, essa rede
lançou mão da capilaridade e disseminação em massa dos dispositivos digitais e
móveis, e superou o entrave da produção e distribuição de informação.
Com inventividade e inovação, criou-se uma “tapeçaria
midiática” composta pelas múltiplas linguagens artísticas, para a produção de
conteúdo de oposição: grafite, música, dança, vestuário, fanzine, audiovisual e
informações transmídia, distribuídas pelas redes sociais.
No campo de batalha pelas narrativas sociais, ao lado da
esfera pública hegemônica [burguesa, machista, xenófoba, racista], articula-se
uma esfera pública precária, alternativa e radical, que se ocupa das raízes dos
problemas sociais.
Narrativas de oposição grafitadas nos muros das cidades,
fruídas nos versos e rimas das periferias, experimentadas nos arranjos
produtivos locais intensos de cultura afrodescendente e articuladas nos ateliês
criativos de linguagens artísticas.
É esse esqueleto tecnológico –infraestrutura digital de
veiculação de conteúdo- que estimula a campanha contra o genocídio da juventude
negra, pobre e moradora da periferia, e reivindica políticas públicas
reversivas, para frear essa “matança” ignorada pelas mídias corporativas.
*Juarez Xavier é professor do Departamento de Comunicação
Social da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Unesp (Bauru) e
coordenador do Núcleo Negro da Unesp para Pesquisa e Extensão.
Via- Portal Vermelho
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