Na hora do pódio, dois atletas negros dos EUA erguem o punho
cerrado, símbolo do movimento Black Power. Gesto audacioso lançou ambos no
ostracismo, e só aos poucos eles foram reconhecidos.
Tommie Smith e John Carlos fazem o gesto dos Panteras
Negras. Australiano Norman, à frente, os apoiou
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Tommie Smith ergue o braço direito, o punho cerrado. John
Carlos, atrás dele, levanta o esquerdo. Ambos vestem luvas negras e inclinam
levemente a cabeça para baixo. Apenas de meias pretas, os dois atletas dos
Estados Unidos ouvem em silêncio a execução do hino de seu país.
As imagens desse protesto silencioso durante os Jogos
Olímpicos de 1968, na Cidade do México, correram o mundo e viraram um escândalo
na terra dos dois atletas.
Na terça-feira (16), este momento histórico completa 50
anos. E o motivo do protesto dos dois atletas continua mais atual do que nunca.
"Em termos de direitos civis, uma lesma avançou mais do que nós nesses 50
anos", comenta John Carlos hoje.
Naquele 16 de outubro, Smith ganhou a medalha de ouro nos
200 metros e quebrou o recorde mundial com o tempo de 19,83 segundos – ele foi
o primeiro atleta a bater a marca dos 20 segundos. Carlos conquistou a medalha
de bronze. Mas os momentos de glória foram poucos, pois o auge da carreira de
ambos foi também o começo do fim.
Afinal, com seu gesto contra a discriminação e o preconceito
racial nos Estados Unidos, eles haviam quebrado uma regra fundamental do
movimento olímpico: a de que esporte e política – supostamente – não se
misturam.
Smith, então com 24 anos, e Carlos, um ano mais novo,
pagariam pelo resto de suas vidas pelo gesto. Eles haviam provocado uma
sociedade que, à época dos movimentos de direitos civis dos negros nos Estados
Unidos, estava com os ânimos exaltados.
Sob pressão do Comitê Olímpico Internacional (COI), ambos
foram excluídos da equipe americana, e Smith perdeu todas as verbas de
patrocínio. De uma hora para a outra eles se tornaram párias e receberam até
mesmo ameaças de morte.
"Não achávamos mais emprego. Não entrava mais dinheiro.
Muitas pessoas que eu considerava meus amigos se afastaram de mim. Nossos
filhos sofriam bulling na escola. Minha primeira mulher não suportou tudo
aquilo e se matou", recorda Carlos.
A encenação fora detalhadamente pensada: os punhos erguidos
eram o símbolo do movimento Black Power. As meias pretas simbolizavam a pobreza
da população negra. Além disso, Smith e Carlos usavam um broche branco no
peito, símbolo do movimento Projeto Olímpico pelos Direitos Humanos (OPHR, em
inglês), ao qual ambos pertenciam, assim como a terceira pessoa no pódio, o
australiano e medalhista de prata Peter Norman. Ele apoiou o gesto.
A OPHR lutava contra o racismo no esporte e havia até mesmo
defendido o boicote dos Jogos Olímpicos. O boicote nunca aconteceu, mas a ideia
de deixar uma marca ficou. "Tínhamos que fazer algo para poder
avançar" na luta pelos direitos dos negros, declarou Smith ao jornal Bild
am Sonntag. Por isso, ele e Carlos pensaram em usar um palco até então
inexistente – a transmissão pela televisão, para todo o mundo, dos Jogos
Olímpicos.
Depois de retornarem aos Estados Unidos, Smith e Carlos
tiveram que batalhar pela sobrevivência e só aos poucos conseguiram se
reerguer. Ambos jogaram, sem muito sucesso, na liga de futebol americano, a NFL,
e depois trabalharam como técnicos e professores.
Só muitos anos mais tarde obtiveram reconhecimento pelo seu
gesto audacioso. Desde 2005, uma estátua no campus da Universidade San José, na
Califórnia, homenageia o protesto. Em 2016, o então presidente Barack Obama
recebeu os dois na Casa Branca.
Mas a luta contra o racismo nos Estados Unidos continua, e
também no esporte. Em 2016, um dos astros da NFL, Colin Kaepernick, se envolveu
numa polêmica por se ajoelhar durante a execução do hino nacional, em protesto
contra a injustiça racial no país. Ele está atualmente sem clube.
Assista ao gesto dos atletas:
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