Desde os anos 1990, o Outubro Rosa vem chamando a atenção
para a necessidade de maior atenção à saúde da mulher. O mês foi associado a
essa cor para reforçar o controle do câncer da mama, o segundo de maior
incidência sobre as mulheres no Brasil e no mundo, só atrás do câncer de pele
não melanoma.
“Todas as conquistas dos últimos anos”, afirma Elgiane Lago,
secretária de Saúde da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil
(CTB), “estão indo por água abaixo com os cortes promovidos pelo governo de
Jair Bolsonaro”. Segundo Elgiane, os retrocessos na saúde pioraram com o golpe
de 2016 e ganham ênfase no atual governo. “O Ministério da Saúde tem projetos
para passar o dinheiro público para empresas privadas de saúde e isso pode
acabar com o SUS (Sistema Único de Saúde), o que liquida com a medicina
preventiva e com os programas de atendimento à população”.
A começar pelo “teto de gastos” – a Emenda Constitucional 95
–, que congela os investimentos públicos por 20 anos. “Temos assistido à queda
de participação federal na Saúde, como proporção na receita corrente líquida.
Ela foi 15,77% em 2017, caiu para aproximadamente 14% em 2018 e agora, no
orçamento de 2019, era 13,8%”, afirmou o economista Francisco Funcia, assessor
técnico do Conselho Nacional de Sáude para orçamento do SUS, em entrevista à
repórter Beatriz Mota, numa publicação da Fiocruz.
Ele explica ainda que esse parco recurso sofreu um corte de
3% pelo governo Bolsonaro. “O que é grave para estados e, principalmente,
municípios. Um estudo que a gente fez mostra que os municípios aumentaram até
2,5 vezes a participação no financiamento da saúde no Brasil, entre os anos de
1991 e 2017. Eles participavam com 12% no total (1991) e passaram a participar
com 31% (2017). E a contribuição da União, neste tempo, caiu de 72% para 43%.
Com qualquer queda do gasto federal, os municípios não têm mais condições
materiais e objetivas de compensar”.
Em números absolutos, o Ministério da Saúde teve o
congelamento de R$ 599 milhões, 3% do que foi orçado para 2019. “Considerando
que o SUS tem enfrentado processo de subfinanciamento crônico desde a sua
constituição, que se agravou fortemente a partir da EC 95, em 2017 – com um
processo que a gente tem denominado hoje como ‘desfinanciamento’ –, tirar
qualquer recurso previsto significa um grave problema. Não há como manter um
sistema único de saúde como o nosso, retirando a cada ano mais recurso. Se nada
for feito, o SUS vai morrer por asfixia financeira”, assinala Funcia.
Por isso, acentua Elgiane, “defender o SUS é a prioridade
das prioridades”. Para a sindicalista gaúcha, “o congelamento dos investimentos
públicos em todas as áreas afeta sobremaneira a saúde porque deteriora as
condições de vida das pessoas, provocando número maior de adoecimentos. Tanto
que estamos vendo a volta de doenças já dadas como extintas, principalmente
relacionadas às condições de salubridade”.
Artigo publicado no periódico BMC Medicine mostra que os
cortes de gastos federais para o programa Estratégia da Saúde da Família por
causa da EC 95 podem levar a 27,6 mil mortes evitáveis até 2030. A quase
extinção do programa Mais Médicos acarreta um possível aumento de 8,6% na
mortalidade, o que representa cerca de 48,5 mil óbitos evitáveis em decorrência
do abandono de políticas públicas fundamentais para a maioria da população sem
acesso ao atendimento privado na saúde.
Os especialistas realçam a necessidade de políticas públicas
de saúde para valorização da medicina preventiva. Daí o fundamento do Outubro
Rosa. “É neste mês que as mulheres podem valorizar sua saúde, exigindo seus
direitos”, acentua Celina Arêas, secretária da Mulher Trabalhadora da CTB. É
sabido que as mulheres sofrem mais as consequências da precariedade na saúde.
“São as mulheres que, em geral, têm sobre os seus ombros a responsabilidade de
cuidar da saúde da família, sobrando pouco tempo para si mesma”, garante.
Prevenção ao câncer da mama
“A prevenção ao câncer de mama é essencial para mostrar à
mulher a necessidade de ela se cuidar e se respeitar para ser respeitada em sua
vida como qualquer pessoa”, diz Ivânia Pereira, vice-presidenta da CTB. Segundo
ela, a mamografia anual para mulheres acima dos 40 anos é fundamental para a
prevenção dessa doença. “Os cortes efetuados em diversas áreas e o congelamento
de investimentos no setor público causam transtornos à vida de todo mundo.”
Não por acaso, a Sociedade Brasileira de Mastologia, o
Colégio Brasileiro de Radiologia e a Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia divulgaram um comunicado conjunto em defesa da
mamografia anual. “As principais sociedades médicas do mundo são unânimes em
recomendar o rastreamento mamográfico com uma periodicidade anual ou bienal, a
depender do país. No Brasil, as sociedades médicas recomendam o rastreamento
mamográfico anual para as mulheres entre 40 a 75 anos”, explica o comunicado à
sociedade.
“A deposição da presidenta Dilma em 2016 trouxe
consequências drásticas para o País. As pessoas estão mais doentes porque estão
trabalhando em condições cada vez mais precárias e sem descanso adequado. A
saúde pública está retrocedendo décadas por falta de atendimento adequado”,
explica Ivânia.
“Cortar investimentos em áreas fundamentais para a melhoria
da vida da população – como saúde, educação, transportes, habitação e
saneamento básico –, aliados à liberação de agrotóxicos na agricultura e corte
de bolsas de estudos, afeta pesquisas em saúde, em prejuízo para a população
mais necessitada”, diz Elgiane. “Acabar com o SUS é outro fator que provoca
aumento da incidência da doença, porque ainda existe tratamento para câncer de
mama proporcionado pelo SUS.”
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