Ras Geraldinho condenado – a lei é ruim, o judiciário pior.
Ontem saiu a sentença de Ras Geraldinho, que estava sendo
acusado de tráfico em Americana, interior de São Paulo. Ontem, o juiz o
condenou a 14 anos e 2 meses de prisão, além de confiscar o imóvel em que
vivia. Tráfico e formação de quadrilha, com aumento de pena por envolver adolescente
com “diminuída capacidade de entendimento”.
Um absurdo completo.
Geraldinho ficou famoso por fundar a Primeira Niubingui
Etíope Copta de Sião do Brasil, uma igreja rastafari, religião que pratica o
uso ritual da maconha. Era um caso inédito no Brasil de uso religioso da erva,
algo previsto e permitido pela lei – o uso ritual da ayauhasca em rituais do
Santo Daime, por exemplo, é considerado legítimo. Ele plantava Cannabis no
terreno e diversas pessoas apareciam em sua casa para fumar com ele. Para a promotoria,
ele não passava de um traficante.
Nossa lei de drogas é ruim, com certeza. Mas nossos juízes
são piores ainda, ao interpretá-la sem o menor bom senso.
Suponhamos que Ras Geraldinho realmente não tinha uma
igreja. E que sua “religião” fosse apenas uma desculpa para fumar maconha
mesmo. Suponhamos que algumas das pessoas que iam a seu “templo” de fato
ganhassem alguma “presença” – uma pequana quantidade da maconha que ele
plantava no jardim. E suponhamos que algum adolescente usuário de maconha tenha
entrado lá para fumar com ele.
Neste caso, quando se leva a lei ao pé da letra, ele estava
traficando, porque lá diz que plantar droga proscrita sem autorização é
tráfico. E formava quadrilha porque, em vez de fumar sozinho, reunia outras
pessoas em torno da sua religião.
Agora, que sentido faz condenar uma pessoa a 14 anos em
regime fechado uma pessoa que não cometeu nenhum tipo de crime violento? Que
sentido faz chamar de quadrilha uma pessoa que, fora reunir amigos para fumar
maconha, não tinha nenhum outro tipo de associação criminosa?
Não foi comprovada, nem levantada qualquer suspeita, nenhuma
relação de Geraldinho com organizações criminosas de fato, com nenhuma facção
ou coisa do tipo. É claro: Geraldinho plantava, justamente para não sustentar o
tráfico.
Geraldinho era réu primário e não tinha armas. Na lei, isso
é justificativa para reduzir a pena de um condenado por tráfico. Essa parte da
lei o juiz preferiu não levar ao pé da letra.
E lá vamos nós pagar 14 de anos de cadeia para um cidadão
pacato que não feriu nem roubou ninguém. É uma pena maior que a de homicídio,
por exemplo. Lá vamos nós gastar mais de mil reais por mês, que é quanto custa,
por baixo, um preso no Brasil, para nos protegermos dele. Vale a pena? Serve
para alguma coisa? Alguma pessoa vai deixar de fumar maconha porque ele está
preso? Duvido.
A história não acabou aqui, certamente. A igreja de
Geraldinho teve bastante repercussão na imprensa, e provalvemente isso vai
virar uma grande novela até chegar à segunda instância. Até lá, Geraldinho vai
ser uma espécie de mártir para quem luta por uma lei de drogas mais justa e
racional, que produza resultados positivos para a sociedade, em vez de
factoides midiáticos e causas eleitoreiras.
Vamos torcer que o juiz de segunda instância tenha mais bom
senso.
E enquanto isso, vamos assimilando o prejuízo de pagar
prisão, polícia, promotoria pública e sistema judiciário para resolver
“problemas” como esse. Certamente, em Americana há problemas mais importantes
para a polícia e as autoridades cuidarem.
Vi no face do Pós-quim Uébi Zine - Via Almanaque das drogas http://almanaquedasdrogas.com/2013/05/14/ras-geraldinho-condenado-a-lei-e-ruim-o-judiciario-pior-o-que-voce-acha/
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