Um Parque Mesolítico cheio de mamutes, resgatados da extinção? O sonho louco de alguns cientistas parece estar mais perto.
AFP e PÚBLICO
Cientistas russos anunciaram esta quarta-feira ter
descoberto sangue na carcaça de um mamute-lanudo, que ficou preservada no solo
congelado numa ilha do Árctico – o que aumenta as hipóteses de vir a clonar este
animal extinto há cerca de dez mil anos, no período Mesolítico.
Investigador junto à carcaça do mamute
descoberta na ilha de
Mali Liakhovski, no Árctico
SEMION GRIGORIEV/AFP
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Levada a cabo no início deste mês de Maio, uma expedição de
especialistas da Sociedade de Geografia russa e da Universidade Federal do
Nordeste, em Iakoutsk, na Sibéria, foi examinar a carcaça bem conservada de uma
fêmea de mamute-lanudo. Tinha sido localizada em Agosto de 2012 no solo
permanentemente congelado, ou permafrost, na ilha de Mali Liakhovski, no oceano
Árctico russo.
O animal teria cerca de 60 anos de idade quando morreu e
estaria morto entre há 10.000 a 15.000 anos, indicou à agência AFP o chefe da
expedição, Semion Grigoriev, que qualificou a descoberta de excepcional.
“Todos os anos têm sido descobertos mamutes [na Rússia]. Mas
esta expedição permitiu encontrar pela primeira vez uma fêmea em muito bom
estado de conservação”, referiu o cientista russo, numa entrevista telefónica.
A observação da carcaça congelada permitiu fazer uma
descoberta ainda mais excepcional: continha tecidos dos músculos e sangue
preservados.
“Quando perfurámos o gelo no seu ventre, o sangue escorreu,
muito escuro. É o caso mais espantoso que vi em toda a minha vida”, declarou
Semion Grigoriev.
O cientista russo atribui esta descoberta às condições
excepcionais em que a fêmea de mamute esteve conservada durante milhares de
anos. “Ela caiu num buraco com água ou num pântano, que lhe dava provavelmente
até a meia altura do corpo. A parte de baixo do corpo congelou na água”, contou
Semion Grigoriev, acrescentando que a parte de cima do mamute terá sido devorada
em parcialmente por predadores.
A carcaça foi entretanto removida do local onde ficou
milhares de anos e transferida para um sítio apropriado à sua conservação,
genericamente uma gruta aberta no permafrost.
“Esta descoberta dá-nos hipóteses reais de encontrar células
vivas que permitam realizar o projecto de clonagem de um mamute”, referiu ainda
o cientista russo. Para isso, a universidade de Iakoutsk já tinha até assinado
um acordo no ano passado com o investigador sul-coreano Hwang Woo-Suk, o mesmo
que clonou o primeiro cão, em 2005, o Snuppy, mas que também esteve envolvido
numa fraude científica com células estaminais humanas. Alegava em 2004 – mas
depois admitiu que os dados eram falsos – ter criado os primeiros clones
humanos e que desses embriões tinha conseguido retirar células estaminais, para
serem usadas com fins terapêuticos, à medida de cada doente. Nada disto era
verdade e Hwang Woo-Suk pediu desculpa em público, embora dissesse que não foi
ele, mas outro membro da equipa, quem falsificou os dados.
Se se conseguirem obter células do mamute-lanudo (Mammuthus
primigenius), o seu núcleo, onde está a esmagadora maioria do ADN, será
transferido para ovócitos de elefante, esvaziadas antes do seu núcleo. O
objectivo é produzir embriões com o ADN de mamute que seriam, em seguida,
colocados no útero de uma fêmea de elefante asiático (Elephas maximus).
Mamutes, elefantes asiáticos e elefantes africanos
(Loxodonta africana) tiveram um antepassado comum há cerca de seis milhões de
anos. Aproximadamente há cerca de 1,6 milhões de anos, apareceram os mamutes.
Viveram em África, Europa, Ásia e América do Norte, até se mudarem mais para
norte, à procura de regiões mais frias, desaparecendo de vez há dez mil anos. Foram
perseguidos pelos humanos, o que, além das mudanças climáticas, é apontado como
uma causa para a sua extinção.
Estará agora o mamute-lanudo prestes a regressar à vida, num
Parque Mesolítico? Aconteça o que acontecer, o mamute promete suscitar um debate
sobre a ciência e a sua ética.
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