Símbolo dos ataques à educação no Paraná, massacre de 29 de
abril completa três anos.
Ação policial deixou mais de 200 feridos em Curitiba.
Ninguém foi responsabilizado / Joka Madruga.
Daniel Giovanaz
Brasil de Fato
Gás lacrimogêneo, bombas de efeito moral, balas de borracha.
Três anos atrás, a Polícia Militar (PM) do Paraná realizava uma das operações
mais violentas da história em Curitiba. Mais de 200 pessoas ficaram feridas
durante um protesto contra mudanças no regime previdenciário de professores e
funcionários de escolas. Nenhum agente do Estado foi responsabilizado pelo
episódio, conhecido como Massacre de 29 de abril ou Batalha do Centro Cívico.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação
Pública do Paraná (APP-Sindicato), Hermes Leão, conta que as cenas de violência
daquele dia não saem da cabeça dos servidores estaduais: “O 29 de abril
continua uma marca de feridas ainda abertas. Seja porque o próprio governo
desencadeou um conjunto de outras violências, a partir daquele período, seja
pela impunidade, que é comum aqui no estado do Paraná”.
Entre os responsáveis pelo massacre, Hermes Leão cita o
ex-governador Beto Richa (PSDB), que sancionou a lei que retirou direitos dos
professores, o então secretário de segurança pública estadual Fernando
Francischini (PSL), que coordenou a ação policial.
“Eles estão sendo gradativamente inocentados. E, ainda pior,
a Justiça está insinuando a responsabilidade da manifestação”, lamenta o
sindicalista. No dia 14 de agosto de 2017, a juíza Patricia de Almeida Gomes
Bergonse, rejeitou uma ação civil pública movida pelo Ministério Público (MP)
do Paraná contra Richa, Francischini e quatro comandantes da PM, por considerar
que o comportamento dos manifestantes incitou a violência policial.
Memória
Se o episódio não deixou mortos, foi por detalhe. Educadores
como Claudemir Esquerdo Corral, do município de Pitanga, levaram tiros no rosto
e por pouco não perderam a visão. “A gente foi no intuito de fazer manifestação
pacífica, um protesto contra as medidas que o governo tinha tomado na época”
explica o servidor. “A hora que eu vi o policial manobrando, deu tempo só de
virar o rosto rapidamente. Se não, teria acertado no meu olho”, finaliza.
Valci Maria Mattos, professora aposentada em Cascavel,
também foi atingida por uma bala de borracha, mas não se arrepende de ter
participado do protesto: “Quando retiram direitos, é como se arrancassem um
pedaço de você”, compara. “Eu estava lá, conversei com policiais antes do
massacre, porque achava que a gente, falando, conseguiria evitar [uma ação
violenta da polícia]”.
O que estava em jogo
A Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) aprovou naquele 29
de abril um projeto de lei que mudou a forma de funcionamento e gestão da
ParanaPrevidência, o regime próprio da Previdência Social dos servidores
estaduais.
A Paranáprevidência inclui o Fundo Financeiro, bancado pelo
governo estadual, e o Fundo Previdenciário, que reúne as contribuições dos
servidores. A proposta aprovada pela Alep no dia do massacre transferiu 33.556
beneficiários com mais de 73 anos para o Fundo Previdenciário, para aliviar as
contas públicas.
A APP-Sindicato entende que a mudança comprometeu a saúde
financeira da Paranáprevidência e a aposentadoria dos trabalhadores da
educação. Uma ação direta de inconstitucionalidade tramita desde então no
Supremo Tribunal Federal (STF) e propõe anular as mudanças, mas ainda não foi
julgada.
Ferida aberta
Nos últimos três anos, Hermes Leão interpreta que houve
“pouco ou nenhum diálogo” por parte do governo Richa. Todas as políticas
públicas para o setor de educação, como a mudança no número de horas-atividade
semanais dos professores, foram no sentido de restringir, e nunca de ampliar ou
efetivar direitos.
“Nesta terça-feira [24], houve uma reunião extraordinária do
Conselho de Administração [do Paranaprevidência], em que os representantes dos
servidores públicos votaram contrários à aprovação das contas da previdência
estadual de 2017”, explica o presidente da APP-Sindicato. “Exatamente porque,
de 2015 em diante, o governo Beto Richa não cumpriu o recolhimento da parte da patronal
do governo do estado. Então, continuam as ilegalidades”.
Cobrança
Richa deixou o cargo de governador em abril para concorrer
ao Senado. Hermes Leão reconhece que a sucessora (PP) representa uma
continuidade, mas tenta aproveitar a oportunidade para retomar o diálogo: “A
governo Cida Borghetti assumiu o compromisso de trazer respostas a itens
centrais, como por exemplo, o ajuste salarial. É uma pauta que envolve todos os
servidores, que está em debate, e nós vamos continuar cobrando intensamente”.
Mario Sergio Ferreira de Souza, secretário de assuntos
jurídicos da APP-Sindicato, afirma que cerca de 150 ações individuais foram
impetradas contra o Estado do Paraná para exigir indenização por danos morais e
materiais. Ao menos dez ações tiveram Sentença Transitada em Julgado, com
condenação ao Estado.
Em novembro de 2017, a juíza da 4ª Vara da Fazenda Pública
de Curitiba, Leticia Marina Conte, condenou em sentença única o Estado a
indenizar 19 pessoas, com valores que variam entre R$ 15 mil e R$ 40 mil reais.
Os demais processos estão em julgamento.
Quem é quem
O deputado federal Fernando Francischini (PSL), que
coordenou o massacre, é o principal cabo eleitoral do pré-candidato da
extrema-direita Jair Bolsonaro (PSL) no Paraná.
A juíza Patricia Bergonse, que inocentou Richa e
Francischini, é a mesma que determinou a reintegração de posse de 25 escolas
ocupadas pelos estudantes no Paraná em 2016.
Edição: Ednubia Ghisi
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