Nota técnica deixa claro que as mudanças são especialmente
perversas para as trabalhadoras.
Mulheres se mobilizaram neste 8 de março contra o desmonte
da Previdência / Elaine Campos/Divulgação.
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A reforma da Previdência do governo Bolsonaro traz mudanças
"mais amplas, profundas e duras" nas aposentadorias da população que
as propostas tentadas pelo governo Temer. Exceto pelos militares, as novas
regras vão impactar na vida de todos os brasileiros: trabalhadores públicos e
privados, ativos e inativos, quem ainda nem começou a trabalhar e até quem já
está aposentado. Mas quem mais vai sofrer, se as novas regras forem aprovadas,
mais uma vez, serão elas: as mulheres.
Em nota técnica para marcar o Dia Internacional da Mulher
celebrado nesta sexta-feira (8) – intitulada PEC 06/2019: as mulheres, outra
vez, na mira da reforma da Previdência –, o Dieese avalia o prejuízo para as
mulheres. Nas cidades, a proposta aumenta de 60 para 62 anos a idade mínima
para que as mulheres alcancem a aposentadoria. No campo, a mudança é ainda
pior: hoje aposentadas aos 55, vão ter que trabalhar cinco anos mais, até os
60. Para os homens, em comparação, as idades mínimas continuam as mesmas (65
nas cidades e 60 no campo).
O tempo mínimo de contribuição, que passaria de 15 para 20
anos, sem distinção entre os sexos, também penaliza mais as mulheres, pois
desconsidera o maior tempo gasto por elas no trabalho doméstico não remunerado,
a chamada dupla jornada. O Dieese cita dados da Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios (Pnad) Contínua do IBGE, referente em 2017, mostrando que
"as mulheres ocupadas dedicavam, em média, 17,3 horas semanais à
realização de afazeres domésticos, contra apenas 8,5 horas semanais por parte
dos homens. Se considerada a soma entre as horas de trabalho produtivo e
reprodutivo - a chamada dupla jornada -, as mulheres passam semanalmente 54,2
horas trabalhando, enquanto os homens trabalham 49,9 horas semanais."
"A grande maioria das mulheres já se aposenta hoje por
idade. A hora que se associa uma elevação da idade mínima, somado ao aumento do
tempo de contribuição, vai acabar impedindo que uma parte significativa das
mulheres se aposentem", analisa a economista Patrícia Pelatieri,
coordenadora de pesquisas do Dieese. Ela diz que todos os elementos da proposta
de reforma da Previdência do governo Bolsonaro prejudicam os trabalhadores, de
maneira geral, "mas, no caso das mulheres, tem um elemento a mais no grau de
perversidade".
A economista afirma que essa vilania específica com as
mulheres serve de estímulo para que elas se retirem do mercado de trabalho, e
se relaciona com o conservadorismo expresso por membros da equipe do governo.
Damares Alves, ainda antes de ocupar o cargo de ministra dos Direitos Humanos,
da Igualdade Racial e das Mulheres no governo Bolsonaro, afirmou que as
mulheres nascem para serem mães, e que, num modelo ideal de sociedade, elas
viveriam apenas em casa, sustentada pelos maridos.
"E isso não é tudo. Além das mudanças previstas na
aposentadoria, a PEC 06/2019 (da dita "reforma") também propõe
restringir os valores e as atuais regras de acesso às pensões por morte, ao
acúmulo de benefícios e ao BPC. Em todas essas situações, as mulheres são o público
majoritário e serão, por isso, mais atingidas do que os homens". Hoje, o
Benefício de Prestação Continuada (BPC) garante um salário mínimo, a partir dos
65 anos, para homens e mulheres com renda per capita inferior a um quarto do
salário mínimo, sem tempo mínimo de contribuição. Com as novas regras, o
governo pretende pagar, dos 60 aos 70 anos, benefício no valor de R$ 400. O
salário mínimo só seria garantido a idosos a partir dos 70 anos.
Mais dramática será a implementação do chamado regime de capitalização,
que prevê a contribuição do trabalhador em contas individuais, numa espécie de
poupança. "Esse sistema é uma ameaça à luta das mulheres brasileiras por
equidade de gênero e, em face das experiências internacionais, amplia as
diferenças existentes entre os sexos nas condições de acesso aos benefícios
previdenciários", diz a nota.
As mulheres também são maioria (83,7%) entre as pensionistas
e, por isso, as mais prejudicas com as novas regras. Hoje, o valor da pensão
por morte é igual a 100% do benefício do segurado que falece. Pela proposta de
Bolsonaro, seria pago uma cota de 60% do valor do benefício do morto, mais 10%
para cada filho dependente. O governo também quer desvincular as pensões do
valor do salário mínimo. Todas essas mudanças são "instrumentos de
exclusão das trabalhadoras, sobretudo as mais pobres, da proteção da
previdência pública", segundo o Dieese.
Inserção desigual
Segundo o Dieese, as mudanças pretendidas na Previdência
prejudicam mais as mulheres devido a sua inserção mais precária no mundo do
trabalho. A taxa de participação delas no mercado (52,7%) é menor em relação
aos homens (71,5%), estão em ocupações menos valorizadas socialmente, e eles
tem rendimentos 28,8% maiores que elas em média.
Elas também são mais atingidas pelo desemprego. Em 2018, a
taxa de desocupação entre os homens era de 10,1%, enquanto que para as
mulheres, chegava a 13,5%. Das mulheres que estavam no mercado, quase metade
(47%), não tinham registro em carteira, trabalhando por conta própria ou em postos
informais. Uma em cada três ganhava até um salário mínimo. Nesta parcela mais
vulnerável, 64% não contribuíam para a Previdência.
Edição: Brasil de Fato
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