Mais de 20 anos após o seu fim, a ditadura chilena segue surpreendendo negativamente. Nesta quinta-feira (22), a ex-diretora do Instituto de Saúde Pública (ISP) Ingrid Heitmann revelou que o ex-ditador do país, Augusto Pinochet, tinha à sua disposição armas químicas capazes de eliminar milhões de pessoas, “o equivalente a meia Santiago”.
As toxinas foram levadas do Brasil para o Chile/ Foto: Reuters |
As toxinas botulínicas, provenientes do Instituto Butantã de São Paulo, estiveram em poder do governo Pinochet desde a década de 1980, quando o país enfrentava precárias relações com Argentina, Peru e Bolívia, além de diversos protestos e mobilizações.
As caixas com o material permaneceram em segredo por 27 anos em uma sala subterrânea no ISP, localizado perto do Estádio Nacional, em Santiago, para onde foram levadas diversas vítimas fatais do regime, como o cantor Victor Jara, que foi brutalmente torturado e posteriormente fuzilado em 1973.
O material foi descoberto e incinerado em 2008, sem que o governo da ex-presidenta Michelle Bachelet (2006-2010) ou a Justiça chilena tomassem conhecimento do caso, como admitiu Heitmann, que comandou o ISP entre 2007 e 2010.
"Por que os comandantes não dizem a verdade? Por que seguem armazenando informações? Vão me dizer que o Exército — como tantas vezes nos disseram — não sabia de nada?", questionou o ex-presidente do Chile entre 1994 e 2000, Eduardo Frei Ruiz-Tagle, em declarações à Rádio Cooperativa. Há a suspeita de que seu pai, Eduardo Frei Montalva, presidente do México entre 1964-1970, tenha sido envenenado por armas químicas.
Veneno mortal
Um adulto pesando 70 quilos morre se tiver injetado apenas 0,15 picogramas de toxina em seu corpo — cada picograma equivale a um bilionésimo de um grama —. A toxina pode ser fornecido por via oral.
A botulínica é uma neurotoxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum que causa paralisia muscular progressiva. Como uma arma de destruição em massa foi proibida pelas Convenções de Genebra e Convenção sobre Armas Químicas.
Segredos da ditadura
Bachelet, favorita em todas as pesquisas de opinião para voltar ao Palácio, demonstrou surpresa pelo fato de que as armas químicas de Pinochet tenham permanecido guardadas secretamente no ISP até 2008, quando era presidenta. E ressaltou que “esta pode ser uma evidência para alguns casos em que se especula a utilização de agentes químicos. Se esta informação for confirmada, será muito útil para os juízes”, aludindo às investigações que estão sendo realizadas no país neste sentido.
A ministra Cecilia Pérez afirmou que as provas devem ser levadas à justiça: "O importante é que todas as evidências que alguns dizem ter devem ser disponibilizadas para as instituições correspondentes para que sejam investigadas e, se houver responsáveis, que sejam punidos da maneira mais dramática possível".
Armas químicas
As suspeitas de uso deste tipo de arma contra os militantes de esquerda contrários ao governo de Pinochet são várias. Atualmente, existem diversos julgamentos em andamento no país que recolhem testemunhos e provas de que o equipamento repressivo de Pinochet usou toxina botulínica, gás sarin e tálio.
O caso mais famoso é o do Prêmio Nobel de Literatura Pablo Neruda. Os restos mortais do poeta estão sendo analisados para determinar se ele morreu de câncer, como se pensava anteriormente, ou foi envenenado na clínica Santa Maria.
Outra vítima das armas químicas teria sido o ex-presidente Frei Montalva, que teria sofrido um choque séptico na mesma clínica Clinica Santa Maria depois de ter sido operado por uma equipe de médicos que, na verdade, eram agentes de inteligência. Em seu corpo foram encontrados gás sarin e tálio.
A figura-chave na produção e aplicação desses venenos foi o químico e agente da repressão Eugenio Berrios, retirado do Chile pelos militares em 1991, quando o país recuperou a democracia, mas Pinochet ainda estava no comando do Exército. Berrios, procurado pela justiça chilena, foi encontrado morto no Uruguai em 1995, quando estava sob vigilância e ataque militar, como acreditam os tribunais chilenos.
Da Redação do Vermelho,
Vanessa Silva com informações do jornal El Mundo
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