Não há o que criticar na seleção do Tite, embora, para muita
gente, a cada nova convocação mais transparece a mediocridade reinante no
futebol brasileiro. Uma opinião injusta, porque nosso futebol não está tão
medíocre assim e porque cada nova geração de jogadores é comparada com as
gerações dos anos de glória, e fatalmente perde no confronto.
Mas comparar eras só serve para destruir fantasias do tipo
“seleção brasileira de todos os tempos”, em que Zizinho troca passes com Falcão
e Garrincha cruza para Leônidas cabecear. Não dá para comparar. Grandes
estilistas do meio-campo não jogariam hoje da mesma maneira que jogam na nossa
memória com um adversário super treinado chutando seu calcanhar e bufando no
seu ouvido. Mas tem o outro lado: algum craque de hoje se destacaria no futebol
do passado, tendo que competir não no fôlego e no tranco, mas no puro brilho?
Talvez sim, mas ninguém se lembraria deles hoje.
Eras e estilos não são comparáveis em nenhum tipo de arte.
Quem foi o maior pintor de todos os tempos? Não vejo como o título poderia
fugir da Espanha. Velázquez, Goya ou Picasso — este atuando em várias posições
— mereceriam a escolha mais do que, por exemplo, Michelangelo Buonarroti. Mas o
time italiano é forte: Rafael e Tiziano na zaga, Botticelli e Tintoretto no
meio, Leonardo na lateral e os holandeses Rembrandt e Hals (comprados pelo Milan)
na frente, além de Michelangelo. E onde colocar o Giotto? Na história da arte,
os murais de Giotto significam mais do que o teto da Capela Sistina. Giotto foi
uma ruptura radical com o passado; Michelangelo não.
Picasso merece entrar na disputa? Teve a vantagem sobre
Velázquez, Michelangelo e os outros de viver numa era em que a canibalização
cultural, o pastiche e a irreverência se tornaram artisticamente respeitáveis e
pôde usar todos os estilos e materiais, do clássico ao primitivo, do plástico
ao miolo de pão — e a obra de Velázquez e de Michelangelo também — na sua arte.
Foi, talvez, o último pintor a dominar tanto o rigorismo formal que lhe
permitiria sobreviver, e brilhar, com a inventividade e a audácia que o
mantiveram atual até a morte. Picasso foi como Pelé, um craque para qualquer
era.
HOJE
(Da série “Poesia numa hora dessas?!”)
Ele: “Eu já quis mudar o mundo e entender a vida. Hoje só
quero que nenhum dos dois revida”.
Ela: “Eu já quis o êxtase, mas mudei de tom.
Hoje, em vez de uma visão, quero um vison.”
Ele: “Eu já acreditei em tudo, tinha a alma escancarada.
Hoje só acredito em nada”.
Ela: “Eu já fiz inglês, cerâmica e balê. Hoje durmo até
tarde e vejo tevê.”
Os dois: “O que nos fez ficar assim? Não olhe pra mim!”
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