“O meu pai, Emar do Prado Torres foi o engenheiro civil
responsável pela abertura de estrada na região de Canudos, entre 1930 e 1932.
Como a região estava infestada por cangaceiros, e era muito perigoso o
trabalho, meu pai precisou prevenir-se... Dos cento e vinte trabalhadores
contratados, vinte eram para proteção... Eram jagunços, que se revesavam em
dois turnos, dia e noite, dez a dez... Às vezes com alguns a mais...
Por Rubens Antonio
Depoimento de Edmar Rocha Torres:
Depoimento de Edmar Rocha Torres:
Edmar Rocha Torres
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Outro que lutou em Canudos, como líder, mas não apareceu nos
relatos, foi Canário... Este também, com Pedrão, coordenava os jagunços.
Acima, o chefe da obra, engenheiro Emar do Prado Torres,
então com cerca de 25 anos de idade, aparatado para eventual defesa da obra.
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O Pedrão usava dois punhais... Um era aquele grande,
atravessado na cinta... Outro era o pequeno, muito afiado também, que ele
mantinha preso aqui, na coluna, abaixo do pescoço, nas costas, porque
dificilmente alguém revistaria ali... Ele prendia com uma espécie de
emplastro... É este punhal aqui...
Se mandassem levantar as maos, ele, com as mãos na nuca,
estava com elas pertinho da arma...
Ele tinha um auxiliar terrível, famoso entre os outros
jagunços... Era o “Gato”... Ele chegou até o meu pai indicado por Manoel
Novaes. Tina um cabelo alourado longo, olhos muito azuis.
Ele disse:
- O seu Manoel Novaes pediu para eu proteger o senhor.
Ele tinha ido para lá também porque onde ele estava antes
fora jurado de morte.
Era muito brabo... Ele sabia das coisas... porque também era
de Serra Talhada, em Pernambuco... E todo mundo sabia dele e se pelava de medo
e respeito... E ele era mesmo terrível... Só colocavam ele para missões de
muita violência... Isto a tal ponto que ele não confiava em ninguém... Tanto
fazia que sabia que estava marcado para morrer... Então, quando dava a janta,
ele mesmo preparava as coisas dele, com todo cuidado, e comia... Pegava uma
rede e sumia... Somente aparecia na manhã...
Na escuridão, caminhava, conforme ele disse depois ao meu
pai, por cerca de dois quilômetros, em uma direção qualquer, escolhida para
aquela noite... e que jamais repetia no todo... Então, por uns quinhentos
metros, procurava uma situação em que ele pudesse pendurar a rede e ficar o
mais escondido possível...
De pé, na frente, o jagunço apelidado Gato, tido como dos
mais sagazes e violentos do grupo. Na mesma foto, à direita, um oficial do
exército, enviado para dar instrução de uso das armas, mas que percebeu ser tal
completamente desnecessária, em função do conhecimento dos jagunços.
Era ele o responsável pela segurança do meu pai, quando ele
ia buscar o dinheiro para pagar as despesas da empresa, os funcionários e os
jagunços...
Quando a obra acabou, meu pai pediu ao oficial responsável
que as armas ficassem com os sertanejos. Colocou que eles poderiam ser alvo de
vingança, por suas participações naquela defesa da estrada. Como não eram fuzis
tombados, mas os tomados de São Paulo, o militar concordou, pegou os recibos de
empréstimo e rasgou na frente do meu pai.
Quando tudo acabou, o Gato sabia que estava marcado e que se
ficasse ali morreria... Aí, o meu pai trouxe o Gato para Salvador, e deu ele
começou a trabalhar como um pacato jardineiro na casa da minha tia... Quem
visse nem acreditaria quem ele era e do que era capaz...
Finalmente... um irmão dele que trabalhava em Santos, com um
negócio daqueles transportes antigos... lotação... para empresas... chamou Gato
e ele foi... Nunca mais se soube dele...
Nem mesmo o nome real do Gato eu sei... O mais terrível dos
jagunços na imposição do regime de defesa contra os cangaceiros na empresa, sob
a liderança do Pedrão...
Deste jeito... que bando de cangaceiros atacaria, ali, e
quando? Nunca...
O meu pai, deitado na rede, aproveitando a presença desse
cabra de Conselheiro, ia lendo a história do livro “Os sertões”, e ele, o
Pedrão, sentado no chão, perto, ia dizendo se estava certo ou errado... Meu pai
achou que ele era fidedigno, pois teve ocasiões que Euclydes creditou vitória
aos jagunços e ele desmentia dizendo que tinham perdido tal e tal confronto...
Ninguém mente contra si mesmo...
Finalmente, o Pedrão foi esmirrando... Veio a Salvador
tratar de um câncer na faringe... e o meu pai que o apresentou aos médicos que
poderiam ajudá-lo... Finalmente, voltou para morrer na terra dele... Acabou tão
mal... Carregado numa gamela...
Pedrão, já idoso, com Manuel Ciríaco, dois guerrilheiros em
Canudos.
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