Amaro Lins faz uma análise do crescimento das universidades
nos últimos anos e dos cortes anunciados pelo MEC.
Amaro Lins foi reitor da Universidade Federal de Pernambuco
e secretário de educação superior do Ministério da Educação / Foto: UFPE
|
Por Daniel Lamir
Amaro Lins foi reitor da Universidade Federal de Pernambuco
de 2003 a 2011, secretário de educação superior do Ministério da Educação nos
anos de 2011 e 2012 e hoje é professor do Departamento de Engenharia Civil da
UFPE. Em entrevista ao Brasil de Fato, o professor fez uma análise das mudanças
feitas pelo Ministério da Educação na gestão do ministro Abraham Weintraub e do
presidente Jair Bolsonaro.
Brasil de Fato: O ministro Abraham Weintraub justificou os
cortes na educação superior pública afirmando que o que é feito nas
universidades brasileiras é balbúrdia. Nesse sentido, o que o professor entende
como balbúrdia?
Amaro Lins: É interessante que essa mesma pergunta foi feita
ao ministro da educação. E para ele, balbúrdia é a universidade promover o
debate, a integração, a busca da compreensão da diversidade que nós temos na
sociedade brasileira. Ele considera balbúrdia a universidade discutir política.
O que nós, povo brasileiro, percebemos, é que balbúrdia é essa transformação
que estão fazendo para voltar à idade média, à irracionalidade. A universidade
é o lugar por excelência da diversidade. Se o ministério chama isso de
balbúrdia, é porque acho que chegamos no fundo do poço. As universidades e a
educação básica precisam estar à serviço do desenvolvimento nacional, que é
econômico, mas com forte impacto no social.
Como analisar esses cortes propostos pelo MEC?
Era preciso dar continuidade a esse período fértil que vinha
passando a educação brasileira, especialmente nos últimos 15 anos. Nós
estávamos passando por um processo de transformação na educação. Esse corte
agora é um suicídio e todo nós sabemos e o governo também sabe. O governo disse
que investiria e melhoraria a educação básica, e, olhando para a tabela de
cortes, a educação básica teve um corte de 39% a 68% do total de investimentos.
Onde são esses cortes? na construção de novas creches, na melhoria das salas de
aula, na formação de professores. Isso tem um impacto tremendo. Os Institutos
Federais com corte de 35% e a as universidades de 30%. Isso vai paralisar as
universidades. Nós vamos voltar a uma época que não vai ter nem giz.
Quais podem ser os impactos para o funcionamento das
universidades, especialmente em relação à infraestrutura e o desenvolvimento de
projetos?
Esse corte vai afetar fortemente a estrutura das
universidades. Ele vai interromper os projetos de extensão, que são voltados
para a sociedade e será um corte importante nas pesquisas que estão em
andamento. Se você para uma pesquisa por um ano ela não retorna do ponto onde
parou. O mesmo acontece se reduzem os investimentos nos alunos de baixa renda,
eles não tem mais como frequentar a universidade porque não tem condições
subsistir. Os programas de bolsas de manutenção vão parar. Algumas áreas são
mais críticas, como as licenciaturas. Você precisa formar bons professores, que
é onde tudo começa. Aí o governo “Ah, vamos investir na educação básica” mas a
educação básica começa na formação de professores, e é a universidade que faz
isso. No geral, esse desinvestimento na universidade resulta num crescimento e
desenvolvimento menor, no agravamento da situação social. Foi um esforço enorme
para que a educação chegasse aos jovens e aos adultos e isto está sendo jogado
no lixo. Isso é motivo suficiente para as pessoas saírem para as ruas. O nosso
futuro está correndo um grave risco. Cabe a cada um de nós se posicionar para
que esse sucateamento não seja efetivado e que possamos retomar aquele
crescimento virtuoso com o avanço da educação, ciência e tecnologia.
Ultimamente, Bolsonaro vem questionando a relevância das
ciências humanas. Como podemos analisar essa movimentação?
A universidade deve representar o conjunto de áreas do
conhecimento para formar cidadãos e cidadãs conscientes do seu papel na
sociedade e com capacidade de intervir na realidade do seu país. Para isso é
preciso que exista uma harmonia na formação de diversas áreas. A tecnologia,
por exemplo, tem feito coisas assombrosas, até o aumento da expectativa de
vida, mas essa tecnologia precisa de direcionamento, ser aplicada de maneira
adequada. Mas como isso vai acontecer se as pessoas não tem uma formação
humanística, em sociologia e filosofia? Se não houver essa capacidade de
educação, vira um caos. Paulo Freire sempre ressaltou o papel da educação para
a autonomia e a cidadania, é pra isso que serve a educação. Quando se retiram
os recursos da área de humanas, isso gera conflitos, porque estará sendo feita
uma formação defeituosa. Essa ideologização absurda na universidade não existe.
Essas pessoas provavelmente não tiveram uma formação humanística. Elas vivem
numa bolha, e numa bolha inclusive de grande perversidade.
Edição: Monyse Ravenna
Nenhum comentário:
Postar um comentário