Até um certo momento o Uruguai só era mencionado no Brasil
por duas coisas: ricos iam se divorciar e/ou casar e ter lua-de-mel em Punta
del Este e pela derrota no fatídico dia 16 de julho de 1950 para a seleção
Uruguaia no Maracanã, de virada, na Copa do Mundo feita para o Brasil ser
campeão. Alguns haviam passado por Montevidéu e diziam que ficava a meio
caminho entre Porto Alegre e Buenos Aires.
“Nós uruguaios temos certa tendência a crer que nosso país
existe, embora o mundo não o perceba”, diz Galeano. “Os grandes meios de
comunicação, aqueles que têm influência universal, jamais mencionam esta nação
pequenina e perdida ao sul do mapa.”
Um país de poucos milhões de habitantes que, como diz ele,
tem população similar a alguns bairros das grandes cidades do mundo, mas que
provocaria algumas surpresas para quem se arriscasse a chegar por ali.
Um país que aboliu os castigos corporais nas escolas 120
anos antes da Grã-Bretanha. O Uruguai adotou a jornada de trabalho de oito
horas um ano antes dos Estados Unidos e quatro anos antes da França. Teve lei
do divórcio setenta anos antes da Espanha e voto feminino quatorze anos antes
da França.
O Uruguai teve proporcionalmente o maior exílio durante a
ditadura militar, em comparação com sua população. Assim, tem cinco vezes mais
terra do que a Holanda e cinco vezes menos habitantes. Tem mais terra
cultivável que o Japão e uma população quarenta vezes menor.
O país ficou relegado a uma população escassa e envelhecida.
Tristemente Galeano diz que “poucas crianças nascem, nas ruas vêem-se mais
cadeiras de rodas do que carrinhos de nenês”.
Ainda assim, Galeano consigna bons motivos para gostar do
seu país: “Durante a ditadura militar, não houve no Uruguai nem um só intelectual
importante, nem um só cientista relevante, nem um só artista representativo,
único que fosse, disposto a aplaudir os mandões. E nos tempos que correm, já na
democracia, o Uruguai foi o único país do mundo que derrotou as privatizações
em consulta popular: no plebiscito de fins de 92, 72% dos uruguaios decidiram
que os serviços essenciais continuaram sendo públicos. A notícia não mereceu
sequer uma linha na imprensa mundial, embora se constituísse numa insólita
prova de senso comum.” Talvez por esses “maus exemplos” tentam desconhecer o
Uruguai, apesar da insistência dos uruguaios de afirmar que seu país existe.
Por tudo isso, Galeno se orgulha do seu “paisito”, “este
paradoxal país onde nasci e tornaria a nascer”.
No Blog do Emir Via Com Texto Livre
* Eduardo Hughes Galeano (Montevidéu, 3 de setembro de 1940) é
um jornalista e escritor uruguaio. É autor de mais de quarenta livros, que já
foram traduzidos em diversos idiomas. Suas obras transcendem gêneros ortodoxos,
combinando ficção, jornalismo, análise política e História. (Wikipédia)
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