Para Dieese, relatório da reforma da Previdência necessita
de mais revisão para assegurar cumprimento dos direitos previstos na
Constituição de 1988.
Via - Rede Brasil Atual
São Paulo – Em nota técnica sobre o relatório que alterou
pontos do Projeto de Emenda Constitucional da reforma da Previdência, a PEC
6/2019, o Dieese alerta: trabalhadores com baixa renda terão perda substancial
quando se aposentarem, caso não sejam feitas mais mudanças na proposta
apresentada pelo governo Bolsonaro.
“As regras de transição estão longe de reconhecer o tempo
acumulado em contribuições para a maioria dos trabalhadores, o que é ainda mais
nítido nas regras de cálculo de valores”, explica.
O estudo aponta que o substitutivo mantém e aprofunda a
desconstitucionalização, pois remete para leis específicas dos entes públicos a
definição dos parâmetros de concessão de benefícios e valores dos RPPSs (a
Previdência dos servidos públicos). “A desconstitucionalização de regras
previdenciárias, um dos pontos mais controversos da proposta de reforma
encaminhada pelo governo, foi mantida em grande parte no substitutivo do
relator”, avaliam os técnicos do Dieese.
E delega a leis ordinárias a fixação, em caráter permanente,
de alguns parâmetros do RGPS, com destaque para o tempo mínimo de contribuição
para a aposentadoria, aumentando a incerteza dos segurados em relação aos
benefícios que obterão futuramente.
“Nesse sentido, a proposta do relator aprofunda a
insegurança, dado que mudanças na legislação infraconstitucional são aprovadas
com muito mais facilidade e estão sujeitas ao sabor de conjunturas políticas de
curto prazo”, critica o documento, destacando que no caso dos servidores, além
dessa incerteza, soma-se a probabilidade de que as leis estaduais e municipais
estabeleçam parâmetros diferenciados entre si, criando disparidades de
condições na mesma carreira.
Privatização da Previdência
O Dieese avalia que, apesar de o texto do relatório do
deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) não utilizar a expressão “segregação” – como
consta da proposta do governo Jair Bolsonaro –, está mantida a intenção de
separar as fontes de alterar a forma como está organizado o sistema de proteção
social na Constituição.
Uma novidade no relatório, destaca o Dieese, é a permissão
para que a administração da previdência complementar dos servidores seja feita
por entidade aberta, sem exigência de licitação, o que favorece a expansão do
mercado privado de previdência. “Atualmente, a Constituição Federal determina
que o fundo de pensão que administra o RPC tenha “natureza pública”, o que não
será mais exigido após a aprovação da PEC.”
Aposentados ganharão menos
O substitutivo do relator, afirma o estudo, manteve a regra
de cálculo do valor dos benefícios proposta pelo governo: para a aposentadoria dita
“integral” – com valor equivalente a 100% da média dos salários de contribuição
– serão necessários 40 anos de contribuição.
“Esse dispositivo terá o efeito prático de reduzir o valor
dos benefícios em relação às regras atuais, pois no RGPS (a aposentadoria pelo
INSS), o benefício equivalente a100% da média é concedido mediante 30 anos de
contribuição, se mulher; e 35 anos, se homem, condicionado ao fator
previdenciário e à regra 85-95 progressiva.”
O relator acolheu, ainda, a regra de cálculo dos benefícios
proposta pelo governo, correspondente a 60% da média dos salários de
contribuição mais 2% para cada ano de contribuição que exceder a 20 anos.
A nova fórmula do cálculo, explica a nota do Dieese, reduz o
valor inicial do benefício, por dois motivos: a média considerada será
“rebaixada” em relação à atual, pois incluirá todos os salários de contribuição
desde 1994 ou do início do período contributivo, sem mais desprezar os 20%
menores valores como atualmente; e a regra atualmente em vigor garante ao
segurado 100% da média (exceção para o caso da aposentadoria por tempo de
contribuição, quando é utilizado o fator previdenciário).
“A nova regra geral, além de utilizar a ‘média rebaixada’,
não assegura os 100% dessa média, exceto aos que atingirem o período
contributivo de 40 anos. Ao considerar a média de todas as contribuições, a
fórmula de cálculo do benefício da PEC original causa distorção em certos
casos, pois pode gerar maior valor para aposentadorias com menor período de
contribuição.”
O Dieese aponta ainda que, o relator introduziu uma pequena
mudança na aplicação da regra geral de cálculo, permitindo desprezar parte do
período de contribuição, se isso resultar em benefício de maior valor. Por
exemplo: serão considerados apenas 60% da média sobre 20 anos de contribuição,
caso seja mais vantajoso do que a inclusão de todo o tempo de contribuição e
dos 2% adicionais a cada ano.
“O mencionado ajuste do substitutivo, contudo, não assegura,
necessariamente, que o cumprimento de maior período contributivo – além do
tempo mínimo requerido – terá reflexo positivo no valor do benefício.”
Tem de mudar mais
O Dieese avalia que o relatório, que está sendo debatido em
comissão especial da Câmara dos Deputados, retirou do texto original algumas
medidas que colocavam em risco a preservação do sistema público de previdência
de caráter solidário. E menciona a supressão da criação da previdência por
capitalização individual; a manutenção do tempo de contribuição mínimo de 15
anos para a mulher; a forma de contribuição dos trabalhadores rurais da
agricultura familiar; as regras para concessão do Benefício de Prestação
Continuada, além de medidas que atenuam as alterações originalmente no abono
salarial, no auxílio-reclusão e no valor das pensões.
Afirma, ainda que o relator criou alternativas de regra de
transição, tanto para o RGPS quanto para os RPPSs, que ampliam, ainda que não
satisfatoriamente, seu alcance.
“Porém, muitas das determinações da PEC 6/2019 foram
mantidas e são motivo de preocupação e insegurança para os trabalhadores”,
ressalta o estudo. “A desconstitucionalização de regras previdenciárias, em
especial para servidores de estados e municípios, gera incertezas sobre o
futuro e, possivelmente, resultará em diferenciações que não contribuem para a
equidade no país”, avalia.
“A reforma proposta não considera que o tempo de
contribuição tenderá a se tornar um obstáculo cada vez mais difícil de ser
superado por trabalhadores expostos a um contexto tecnológico e social
desfavorável ao emprego de longa duração e formalizado”, critica.
“Portanto, embora se deva reconhecer avanços no relatório
ora apresentado, quando comparado à PEC original, continua necessária a revisão
de vários pontos do projeto, para que se assegure o cumprimento efetivo dos
direitos sociais inscritos na Constituição de 1988.”
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