Levante em país da América Central foi um dos mais
importantes do Século XX e teve forte oposição estadunidense.
A organização dos “Muchachos”, como o grupo revolucionário
ficou conhecido, começou por volta de 1960 / Foto: Manoocher Degathi/AFP
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Brasil de Fato | São Paulo (SP)
Em 19 de julho de 1979, guerrilheiros da Frente Sandinista
de Libertação Nacional (FSLN) tomaram as ruas de Manágua, capital da Nicarágua,
para dar início a uma das mais importante revoluções do Século XX. O levante,
que colocou fim à ditadura dos Somoza – família que comandou o país com mãos de
ferro por mais de quatro décadas –, completou 40 anos na sexta-feira (19).
A organização dos “Muchachos”, como o grupo revolucionário ficou
conhecido, começou por volta de 1960. Dois eventos impulsionaram os
guerrilheiros. O primeiro em 1956, quando o poeta Rigoberto López Pérez se
infiltrou numa festa da alta sociedade nicaraguense e assassinou o ditador
Anastasio Somoza Garcia.
A morte do primeiro governante da dinastia, que chefiou o
país ininterruptamente a partir de 1937, foi o começo de uma sucessão de
acontecimentos que não tiraram a família Somoza no poder, mas impôs
dificuldades. Após o assassinato, seu filho, Luis Somoza, assumiu o poder.
O segundo evento aconteceu em 1959 na vizinhança do país
centro-americano, quando um grupo de jovens combatentes, liderados por Fidel
Castro e Che Guevara, destituiu Fulgêncio Batista, tomando o controle de Cuba.
A Revolução Cubana reverberou por toda a América Latina e a
Nicarágua não foi exceção. Um contingente do que viria a se tornar a FSLN
chegou a receber treinamento militar do próprio Che.
O período, então marcado por mobilizações estudantis,
rapidamente levou à criação de forças armadas militantes. Um desses grupos, o
Movimento Nova Nicarágua, fundado em 1961, tornou-se no ano seguinte a Frente
de Libertação Nacional.
Em 1963, a Frente acrescentou “Sandinista” ao seu nome, em
referência a Augusto César Sandino, revolucionário responsável por liderar, a
partir de 1927, uma rebelião contra a presença dos Estados Unidos na Nicarágua.
Sandino obteve sucesso em 1933, expulsando o contingente estadunidense, mas foi
assassinado um ano depois por Somoza, então chefe da Guarda Nacional.
Entre os fundadores da FSLN estão Carlos Fonseca Amador,
Tomás Borge Martínez e Sílvio Mayorga. Apenas Borge sobreviveu para ver o
triunfo da revolução em 1979.
Aumento das mobilizações e adesão de parte da burguesia
Embora Sandino tenha expulsado os norte-americanos na década
de 30, a influência dos EUA seguiu forte. O império, responsável por fornecer
treinamento militar à Guarda Nacional da Nicarágua, conquistou importantes
concessões para que suas companhias explorassem ouro, madeira e borracha.
Ao mesmo tempo, a família Somoza concentrava a maior parte
das terras da Nicarágua, tendo em sua posse plantações de café, destilarias de
rum, usinas de açúcar e criação de gado. Estima-se que os Somoza eram donos de
cerca de 20% de toda a terra rentável da Nicarágua.
O enriquecimento da família que dirigia o país, somados à
histórica influência dos EUA na região e o aumento da pobreza nas cidades e no
campo gestou insatisfações em camadas da população que iam além dos grupos de
esquerda organizados.
Após o terremoto que devastou Manágua em 1972, os Somoza
abocanharam a maior parte da ajuda humanitária internacional enviada para
reconstruir o país. O ato foi a gota d'água, levando Somoza a perder o amparo
inclusive de uma parcela da burguesia.
Enquanto isso, a FSLN seguiu ganhando cada vez mais adeptos
e o próprio grupo foi se reorganizando. Os guerrilheiros, que eram fragmentados
em três tendências, se juntaram no início de 1979, o que garantiu a conquista
de cidades importantes e o triunfo da revolução.
Sandinistas no poder
Após tomarem importantes regiões do país, os sandinistas
marchavam rumo à Manágua. Em 17 de julho de 1979, o então ditador Anastasio
Somoza Debayle, que substituiu seu pai em 1968, fugiu para Miami. A revolução
triunfou dois dias depois, tomando o controle da capital e instaurando a Junta
de Governo, que passaria a administrar o período de transição.
A junta era composta por pessoas que tiveram papel de
destaque dentro da FSLN e também por membros da burguesia que passaram a apoiar
a Revolução nos anos anteriores. Entre eles, destaca-se a participação de
Violeta Chamorro e o industrial Alfonso Robelo, além de Daniel Ortega e Sérgio
Ramirez, importantes quadros da FSLN.
Entre as primeiras ações do novo governo estava a
desapropriação de terras de Somoza e seus aliados, onde foram estabelecidas as
Áreas de Propriedade do Povo, compostas por cerca de 1500 fazendas que
empregavam aproximadamente 50 mil nicaraguenses. Importantes setores também
foram nacionalizados, dando aos sandinistas o inteiro controle da economia.
Entre as políticas de maior destaque está a Cruzada Nacional
de Alfabetização, que usou o método Paulo Freire e alistou alunos do ensino
secundário, universitários e professoras para atuarem como voluntários. O
resultado teve impacto imediato, reduzindo a taxa de analfabetismo de 50,3%
para 12,9% em cinco meses. A medida
levou a Nicarágua a ganhar sucessivos prêmios da UNESCO no correr dos anos 80.
Contras e o começo do fim
Desde o início, os sandinistas tiveram de enfrentar
contra-insurgentes treinados e armados pelos EUA.
Os “contras”, como ficaram conhecidos, minaram pouco a pouco
as iniciativas revolucionárias. Grande parte do dinheiro da Nicarágua passou a
ser utilizado para a própria defesa.
Mesmo durante o período de guerra civil, os sandinistas
conquistaram uma sobrevida em 1985, quando Daniel Ortega venceu as eleições
presidenciais.
A intensificação das hostilidades financiadas pelos EUA, no
entanto, destruiu o país, que registrou taxas de inflação de até 33.000%. O
salário real em 1988 tinham apenas 30% do poder aquisitivo registrado em 1980.
Em 1989, caiu para 10%.
A número de mortos durante o conflito também não parou de
aumentar, e se Ortega conquistou adesão social em 1985, isso seria revertido em
1990, quando disputou o pleito contra Violeta Chamorro, que abandonou a
Revolução para apoiar os contra.
Era a burguesia, que momentaneamente aceitou perder seu
poder político – embora tenha mantido suas propriedades mesmo durante o governo
sandinista –, decidindo que deveria voltar a governar.
A campanha de Chamorro pela União Nacional de Oposição (UNO)
foi financiada pelos EUA com cerca de 9 milhões de dólares. Prometia encerrar a
guerra que já durava uma década.
Chamorro venceu a eleição de 1990 com 55% dos votos, contra
41% de Ortega, resultado que encerrou 11 anos de poder sandinista. A UNO
conquistaria ainda 51 cadeiras no Congresso, contra 39 da FSLN.
Edição: João Paulo Soares
Via - Brasil de Fato
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