O 'padrinho' Queiroz, os negócios com Roma e um juiz contra a IVG
Existe uma multiplicidade de profissões entre os membros e cooperadores que integram as fileiras do Opus Dei. Desde a seleção nacional até ao Tribunal Constitucional, passando por professores universitários e empresários de sucesso, são vários os sectores que contam (ou contaram) com membros da organização. Todos rejeitam a ideia de uma entidade elitista, defendendo que há na prelatura gente de todas as classes sociais.
Durante os treinos do Sporting, Carlos Queiroz, então treinador dos leões, percebeu que o defesa Nélson não andava bem. No final de um treino chamou o jogador e, depois de ouvir as inquietações de Nélson Vieira Alves, apresentou-o a um amigo e membro do Opus Dei: António Montiel. A conversa do psicólogo (que confirmou esta história ao DN) foi um alívio para o jogador, que começou a aproximar-se do Opus Dei. Estávamos em 1995 e Nélson começava a receber ajuda espiritual da obra. Hoje, com 41 anos, é cooperador, frequentando os centros da cidade onde vive: o Porto. A maioria dos membros do Opus Dei em Portugal - e no resto do mundo - são cidadãos comuns. Mas Nélson, jogador da geração de ouro que se sagrou campeã mundial de sub-20, é um exemplo da diversidade de profissões das gentes do Opus Dei. Futebolistas, empresários, advogados, cientistas e professores universitários juntam--se a políticos e banqueiros.
Afonso Braga da Cruz é a prova de que não é incompatível devotar a vida à obra e ser um "homem de negócios". Um dos históricos do Opus Dei em Portugal (numerário desde 1955) foi durante muitos anos presidente e sócio da Sopragol, uma empresa de transformação de tomate. Já abandonou a sociedade, comprada em 2001 pela Cirio Finanziaria, Spa, que adquiriu 96,949% do capital. Esta financeira italiana era então presidida por Sergio Cragnotti, presidente da Lázio, clube do qual a Cirio também era um dos maiores acionistas. A Cirio chegou a ter igualmente nos seus quadros o italiano Gianmario Roveraro (assassinado em 2006), um conhecido membro do Opus Dei. Hoje, porém, a Cirio - entretanto falida - já nada tem que ver com a Sopragol (foi vendida ao grupo espanhol Conesa).
Mas haverá profissões incompatíveis com o Opus Dei? De acordo com os seus membros, não. Mas a Associação Sindical de Juízes Portugueses defende que a condição de membro da maçonaria ou do Opus Dei é incompatível com a condição de juiz. Porém, o juiz jubilado do Tribunal Constitucional (TC) e supranumerário do Opus Dei, Messias Bento, discorda "completamente" e diz que só pode defender esta posição "quem tiver um desconhecimento absoluto do que é o Opus Dei". Em declarações ao DN, Messias Bento diz que ser do Opus Dei até o ajudou enquanto juiz, pois os princípios da obra são a "santificação do trabalho, a competência e a honestidade". Membro da prelatura desde os 40 anos (tem hoje 72), Messias Bento nunca pediu escusa de um processo por pertencer à prelatura e garante nunca ter sido influenciado pela obra. Recorda ainda a vez em que teve de tomar posição num acórdão relacionado com a interrupção voluntária da gravidez no TC em que votou "de vencido por entender que estava em causa o direito à vida". Mas acrescenta prontamente: "Não votei dessa forma por ser do Opus Dei."
A ciência e a fé nem sempre estão de costas voltadas. Ricardo Mendes Ribeiro é físico e diretor da Licenciatura em Física da Universidade do Minho e chegou a admitir, numa entrevista reproduzida no site do Opus Dei, que "não existe qualquer contraposição entre a ciência e a fé [Católica]", considerando que estas são "complementares".
No rol dos professores universitários que pertencem ao Opus Dei está também Diogo Costa Gonçalves, docente da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, que pediu a admissão à obra em 1998. Diogo Gonçalves diz não se sentir "melhor ou pior católico por pertencer ao Opus Dei". E explica porque quis aderir: para "levar a vida de cristão mais a sério". Sobre o alegado elitismo do Opus Dei, o supranumerário diz que na obra "há pessoas de todas as classes e de todo o tipo de profissões". Recusa-se a especificar o tipo de mortificações corporais que faz ("só Deus precisa de saber"), mas admite fazer donativos à obra. Diogo Gonçalves refere ainda que o Opus Dei nunca procurou influenciá-lo em nenhuma decisão e que se algum dia a organização se intrometesse na sua vida profissional "era o primeiro a ir embora".
José Luís Simões, diretor executivo da transportadora Luís Simões, é cooperador e diz igualmente que a única influência que o Opus Dei tem no seu trabalho é ajudá-lo "a focalizar e a fazer as coisas bem feitas". Afirma que só não é membro por falta de disponibilidade, mas que "um dia mais tarde, quando tiver outro enquadramento, possivelmente passarei a essa condição". Apesar disso cumpre um plano de vida (conjunto de obrigações espirituais) tal como os membros da obra. É, porém, menos exaustivo. Admite que dá donativos pessoais ao Opus Dei, mas faz sempre questão que estes não sejam públicos. "Sou de uma aldeia onde a chave fica na porta para que o vizinho possa ajudar. Estou habituado a ajudar e não preciso que os outros saibam", ilustra.
Em matéria de cooperadores a diversidade também é grande. Desde um diretor de multimedia do Benfica (Tiago Silvério Marques) até um diretor de uma agência de viagens virada para o Turismo católico (João Paulo Reis), passando por um professor de Marketing da Lusófona (Jorge Bruno Ventura), uma farmacêutica (Filipa Cruz) ou um antigo diretor da revista Magazine - Grande Informação e atual general manager da empresa Limits (Otto Czernin). A lista é infindável. Apesar do sucesso profissional das pessoas aqui referidas, o líder do Opus Dei em Portugal garante que há pessoas na obra de todas as profissões e de todos os estratos sociais. José Rafael Espírito Santo diz mesmo que não existe distinções entre membros: "Não interessa a profissão. O importante é que procure fazer bem o seu trabalho."
Rui Pedro AntunesNo Diário de Notícias via Com Texto Livre
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