A maioridade penal foi fixada em 18 anos no Brasil em 1927, quando um crime brutal chocou o país e levou as pessoas a questionarem a violência contra as crianças. Desde então, esta é a primeira vez que existe uma proposta de redução.
A história ficou conhecida como “O menino Bernardino”. A
criança, de apenas 12 anos, era engraxate, ao terminar um serviço o cliente
saiu sem pagar. A reação de Bernardino foi jogar tinta no senhor que
prontamente acionou a polícia. Quando os policiais chegaram o pequeno não soube
explicar o que aconteceu e foi preso numa cela com 20 adultos.
Mesmo inocente, Bernardino permaneceu na prisão e foi
estuprado e espancado pelos detentos adultos. De lá, jogado na rua. Ao ser
resgatado e levado ao hospital, os médicos ficaram horrorizados com a história
e a imprensa da época deu um grande destaque ao caso, que chocou a população.
Apesar de haver uma violência generalizada contra as crianças pobres, além de
uma exploração exacerbada do trabalho infantil, a população questionou os
cuidados com a infância e exigiu medidas de proteção.
Pressionado pela opinião pública, um ano mais tarde o
presidente Washington Luiz assinou o Código de Menores, um sistema de proteção
à criança que fixava em 18 anos a idade para os adolescentes serem punidos como
adultos. Este Código também protegia os menores de 14 anos abandonados, que não
receberiam nenhum tipo de punição e a partir desta idade poderiam ser
submetidos a medidas socioeducativas.
Para a professora de História da Educação da Uerj, Sônia
Câmara, o Código dividiu as crianças “em dois grandes setores, o setor das
crianças de elite, brancas e ricas e a grande maioria das crianças brasileiras:
pobres, negras, abandonadas e delinquentes, que recebem o nome pejorativo de ‘menor’”.
Mas ainda assim, ela vê com bons olhos esta que foi a primeira tentativa
efetiva de regular e proteger a infância.
Mas havia uma “divisão social” que independia da idade
porque eram considerados “menores”, as crianças abandonadas e que estavam sob a
tutela do Código, ou seja, os “vadios”, ou “delinquentes”. Normalmente as
crianças com estrutura familiar não se encaixavam nos pré-requisitos do Código.
A partir disso surge o SAM “Serviço de Assistência ao
Menor”, que seria uma primeira tentativa do que conhecemos hoje como Fundação
Casa. Porém, o aparelho funcionava, de acordo com a professora de História da
USP, Maria Luiza Marcilio, como uma ferramenta de tortura e violência contra as
crianças, e não como um mecanismo educativo.
Depois do fracasso da ditadura militar com a Funabem (que
daria origem à Febem), em 1990 surge o Estatuto da Criança e do Adolescente,
considerado até hoje avançado. O ECA prevê a proteção à criança e ao
adolescente baseado em leis internacionais e estabelece punições socioeducativas
aos menores de 18 anos responsabilizados por crimes.
Um crime que chocou a sociedade brasileira em 1927, ou seja,
quase 90 anos atrás, pode se tornar realidade novamente, caso as crianças e
adolescentes sejam expostas à punição com adultos. É isso que propõe a PEC da
redução, aprovada pela Câmara dos Deputados.
A história de Bernardino faz parte de uma série de arquivos
resgatados pelo Senado Federal no Arquivo S.
Via Portal Vermelho
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