Por Mariana Serafini, no site da UJS:
Dificilmente alguém chega à presidência de um país sendo um idiota ou afrontando desnecessariamente quem não compartilha das mesmas crenças e opiniões. Dito isso, fica bastante óbvio que Evo Morales não presenteou o Papa com um crucifixo em formato de foice e martelo por afronta ou ingenuidade.
É comum a sociedade usar uma crença para justificar preconceitos, ódio de classe ou opinião extremista. Não faz muito, vimos evangélicos jurando gays de morte porque uma transsexual fez uma performance de A Paixão de Cristo. Como se a cruz fosse sagrada, e não o objeto fim, que condena à morte. Agora a nova efervescência religiosa é por conta do Cristo crucificado em uma foice e um martelo.
Quando Evo Morales entregou o presente ao Papa Francisco – que vem se mostrando muito simpático às causas dos mais pobres e oprimidos – imediatamente explicou: se trata de uma reprodução fiel ao desenho feito pelo padre jesuíta boliviano Luis Espinal que, por defender os mais pobres e lutar pela terra (assim como o Papa), foi barbaramente torturado e assassinado durante a ditadura de Luis García Meza, nos anos 80, na Bolívia. Sendo assim, não restou espaço para tentar interpretar de outra forma o adorno, porém, a imprensa hegemônica consegue sempre fazer por onde e os fiéis fanáticos também.
Mas, por que uma foice e um martelo ainda incomodam tanto? Trata-se do símbolo que representa a luta dos povos do mundo, a resistência no campo e na cidade, a defesa da terra para os camponeses e dos meios de produção para os trabalhadores. Ou seja, um símbolo de justiça social, em seu mais puro sentido. Esse símbolo incomoda tanto porque, ao contrário do que insistem em dizer aqueles, do lado de lá, o comunismo não acabou junto com a União Soviética e não foi enterrado com os escombros do Muro de Berlim.
O comunismo prevalece, se trata de uma luta dos povos contra um sistema explorador que mostra sua incapacidade de atender às demandas mais básicas da vida humana diariamente. A União Soviética foi apenas uma das tantas experiências que a humanidade teve, e vem tendo, de resistir ao capitalismo. Não, essa luta não é um assunto anacrônico, está mais presente do que parece, ou foi à toa que o presente escolhido por um presidente para o Papa foi uma foice e um martelo?
A foice e o martelo nos tempos de hoje representam a nova ordem, a insubordinação ao imperialismo e aos grandes grupos econômicos. A América Latina se levantou, há quase 20 anos, com a eleição de Hugo Chávez na Venezuela, e desde então o cenário político mudou no mundo e cada vez menos os países imperialistas conseguem interferir em suas “neocolônias”. O continente sul-americano não é mais o quintal dos Estados Unidos e sim, isso incomoda.
Quando um presidente tem a ousadia de presentear o mais alto cargo religioso do mundo com uma foice e um martelo, significa que os povos oprimidos têm mais voz do que os exploradores imaginavam. A resistência no campo e nas cidades pela divisão dos meios de produção cresce a passos largos porque está posto que o capitalismo vai acentuar cada vez mais a distância entre as classes. Um crucifixo em formato do símbolo da luta dos trabalhadores do mundo vem para dar apenas um recado: os dias de fartura dos que exploram estão contados.
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